A Cáritas, serviço oficial da Conferência Episcopal Portuguesa, divulgou na quinta-feira, um relatório que denuncia os problemas mais preocupantes em Portugal, no que toca à pobreza. No mesmo documento encontram-se também recomendações dirigidas aos decisores políticos, com o objetivo de acabar com a exclusão social.

Os números alertam para o problema, que é crescente, e que, recentemente, se tornou comum, independentemente das habilitações e idades. Portugal conhece também agora novas formas de pobreza que afetam antigas famílias de classe média e de classe baixa.

Novas formas de pobreza

As novas formas de pobreza são a primeira preocupação do relatório da Cáritas. “Estas novas formas de pobreza estão relacionadas com o desemprego, cortes nos salários (sobretudo no setor público), aumento de impostos e perda de um ‘segundo’ rendimento devido ao desemprego” de um dos membros do agregado familiar, justifica o relatório.

De acordo com o Instituto Nacional de Estatística (INE), 42,2% dos desempregados não conseguiram pagar as despesas básicas e a maioria das famílias portuguesas foi confrontada, pelo menos uma vez, com esta realidade. Em alguns casos levou a situações extremas, nas quais as famílias ficaram privadas de elementos necessários à sobrevivência, como alimentação, água, luz, ou gás.

Por outro lado, a acumulação de despesas tem se traduzido em “elevados níveis de sobreendividamento”, conduzindo ao declínio de famílias de classe média, que, até então, tinham vidas estáveis e que se viram agora obrigadas a pedir ajuda para pagar as contas ou comprar alimentos.

Trabalhadores pobres

A pobreza entre os trabalhadores é um fator preocupante no país, uma vez que afeta a maioria dos empregados em idade ativa. Num período de três anos (entre 2010 e 2013), o número de trabalhadores pobres em Portugal aumentou 0,8 pontos percentuais (de 9,7% para 10,5%). “Os trabalhadores são mal remunerados e os contratos de trabalho temporários têm aumentado, especialmente dentro das grandes empresas”, facto que se verifica mais entre trabalhadores precoces, incitados pelo abandono escolar e com baixos níveis de educação.

A população com baixo nível de educação enfrenta também maior probabilidade de “más condições de trabalho, trabalhos temporários e baixos salários.” O problema apresentado é também transposto para as crianças, ainda que de forma indireta, pois são afetadas pelos baixos rendimentos dos seus pais e/ou familiares.

Quanto às pessoas com elevados níveis de educação, “veem-se forçadas a aceitar baixos salários que não correspondem ao seu nível de educação”, especialmente os jovens em início de carreira.

A pobreza no trabalho afeta vários níveis: muitos dos trabalhadores não estão abrangidos pelas redes normais de segurança social e, por consequência, não têm cobertura de proteção social ou benefícios na saúde.

Pobreza rural

As zonas rurais são uma das preocupações apresentadas no relatório: “As pessoas que vivem em zonas rurais são ainda mais afetadas por situações de pobreza e de exclusão social, muito devido ao êxodo rural nalgumas regiões do interior do país”.

A Cáritas justifica este fator com a rara existência de empresas nas zonas interiores do país, referindo também o desemprego jovem como fator condutor ao alcoolismo e ao abuso de drogas, o que, segundo o relatório, são “problemas mais frequentes” entre os desempregados.

E ainda: os jovens

Os jovens entre os 18 e os 25 anos, que ainda se encontram a estudar, constituem também um dos grupos de risco, desta vez devido à ação política em Portugal.

Os cortes nas bolsas não têm ajudado: segundo a Cáritas, os estudantes “não têm conseguido suportar os custos das propinas, refeições e/ou alojamento” e a instituição tem assistido a um aumento do número de jovens que pede ajuda financeira.

Este problema leva, por sua vez, à emigração: “Muitos estudantes têm deixado Portugal para estudarem no estrangeiro devido à atribuição de bolsas de estudo para pagamento de propinas nas universidades estrangeiras”. A emigração é agora vista como forma de melhorar a educação e como uma oportunidade de adquirir melhores condições de vida.

No mesmo grupo que os jovens encontram-se também as crianças, os desempregados de longa duração, pessoas com incapacidades físicas e intelectuais e as pessoas com maiores necessidades de cuidados.

Recomendações aos dirigentes políticos

Apoio aos rendimentos, um mercado de trabalho inclusivo e acesso a serviços de qualidade são algumas das sugestões que a Cáritas deixa aos dirigentes políticos.

No relatório, a instituição aproveita para abordar os bons resultados obtidos pelo Complemento de Solidariedade para Idosos (CSI) que obteve “um grande impacto na redução da pobreza entre os idosos”, o que se concretiza numa redução de 14,3 pontos percentuais da taxa de risco de pobreza para pessoas com mais de 65 anos: a taxa foi 15,9% em 2013 e de 30,2% em 2005, data da entrada política do CSI.

A Cáritas aconselha também à criação de subsídios de desemprego mais elevados para famílias com filhos e à criação um mercado de trabalho inclusivo. A instituição alerta ainda para o facto de que muitas das medidas de emprego criadas pelo Governo “ignoraram a questão da qualidade dos empregos”, resultando no aumento “do emprego temporário e o trabalho precário”.

No que toca aos acessos a serviços de qualidade, a Cáritas considera que há novas barreiras a impedir o acesso aos serviços de saúde. Exemplos disso são as “longas listas de espera para cirurgias e o aumento dos tempos de espera nas emergências”, bem como “o aumento das taxas moderadoras” e a “redução do estado na comparticipação dos medicamentos”.

A instituição ressalva, no entanto, a ajuda que o Programa de Emergência Social (PES) tem dado no aumento do número de utilizadores dos serviços sociais.

 

Artigo editado por Sara Gerivaz