“A edição que tem nas mãos é a última desta série em que o Diário Económico é impresso em papel”, pode ler-se no jornal desta sexta-feira.

Depois da demissão da direção editorial e da greve dos trabalhadores, aquilo que a redação do Diário Económico temia veio a concretizar-se. A edição impressa do jornal não vai sair para as bancas, por tempo indefinido. A esperança da administração, segundo a nota que deixa aos leitores, é a de que não passe de uma “suspensão temporária”.

Na prática, a esperança transforma-se em incerteza. “Continuamos na expectativa de que possa haver uma venda. A questão é que para haver uma venda é preciso que haja interessados e que haja propostas. Até agora não temos qualquer tipo de dado que indique que vá haver qualquer modificação rápida nesse sentido”, esclarece o jornalista do Diário Económico, Paulo Pereira ao JPN.

Silvério do Canto fez parte da primeira direção do jornal. Em declarações ao JPN, explica estar afastado daquilo que se tem passado no Diário Económico, mas garante que o fim da edição impressa não foi um “choque”. “Não sou daqueles que acha que se pode prognosticar o fim do papel, mas, em relação ao online, não tenho nenhum problema”, explica.

A perda do jornal impresso pode significar a perda de público: “Eu imagino que haja quem prestasse mais atenção ao jornal do que aos outros meios, mas isso, infelizmente, é uma das questões que não está nas nossas mãos”, refere Paulo Pereira.

O esforço, no entanto, será no sentido de que o órgão de comunicação social possa chegar a quem sempre o seguiu, através dos meios disponíveis. “Nós gostaríamos que as pessoas pudessem ter o maior leque possível de opções, tendo papel, televisão e site. Uma vez que deixou de ser possível ter o jornal, esperamos que as pessoas continuem a acompanhar os outros meios”, apela o jornalista.

A situação do Económico não significa que o jornalismo não possa continuar a viver no papel, na opinião de Paulo Pereira. “O que eu vejo com muita frequência é uma série de pessoas aparentemente muito convencidas do futuro, cheias de certezas. O que nós temos é muitas dúvidas. Se calhar por haver uma série de gente carregada de certezas é que chegamos onde chegamos”, desabafa.

O fecho do jornal impresso é uma grande perda para o Diário Económico. “Tem um significado profundo, violento, contundente”, explica o também membro da Comissão Instaladora da Comissão de Trabalhadores do Económico/ETV.

A situação do Diário Económico teria sido diferente, na opinião de Silvério do Canto, se a decisão tivesse sido natural e não imposta pelas circunstâncias. “Se o jornal tivesse chegado à conclusão de que os leitores estavam no online e, aí, tivesse decidido deixar as ‘fichas’ ali”, nesse caso, “o online teria sido uma excelente opção”, defende.

Não é só o órgão de comunicação que sofre com este fecho. Paulo Pereira defende que “é também uma perda drástica para a sociedade, para o pluralismo e para a democracia”.

O jornalismo económico, por sua vez, “perde uma voz diferente”. Paulo Pereira lembra que “o Diário Económico é o líder no seu segmento de mercado, tanto o jornal como o site, isto além do trabalho que a televisão faz todos os dias ser notável”.

Em 2015, o Diário Económico era o líder de vendas na imprensa económica, com uma tiragem 13.195 unidades, segundo dados da Associação Portuguesa para Controlo de Tiragem e Circulação (APCT). No online, o ranking do Netscope, revela que o jornal teve mais de sete milhões de visitas, em janeiro deste ano.

“Esta situação não tem nada de novo. É cíclico e acompanha muito o ciclo da economia”

Para Silvério do Canto, o destino do Económico já estava traçado quando o jornal foi vendido à Media Capital na década de 90. “Naquela altura, economia era o nosso forte. Depois, as pessoas que compararam [o Diário Económico] quiseram alterar esse perfil. Uma das consequências foi o aumento exponencial dos custos”, afirma.

“Não sei se ganharam leitores. Ganharam muito prestígio. Mas, depois, do ponto de vista da sustentabilidade do projeto, estão muitas coisas em causa, que acabaram por resultar nesta situação”, acrescenta o membro da primeira direção do jornal.

A dependência face à publicidade também agravou a crise do jornal, segundo Silvério do Canto: “A evolução do setor foi no sentido de haver uma dependência inexorável relativamente às receitas de publicidade. O impresso é onde essas receitas mais caem e as situações agravam-se”.

Apesar disso, refere que “esta situação não tem nada de novo. É cíclico e acompanha muito o ciclo da economia”.

A crise do órgão de comunicação social já se havia feito sentir. No passado dia 10 de março, os trabalhadores do Económico/ETV cumpriram uma greve de 24 horas, na sequência dos salários em atraso. Dias antes da paralisação, a direção editorial do diário apresentava a demissão.

A caminho de fazer 27 anos, o Diário Económico, que nasceu em 1989, com direção de Jaime Antunes, Silvério do Canto e Goulart Machado, abandona as bancas.

 

Artigo editado por Filipa Silva