Após uma longa luta contra a doença de Parkinson, morreu na manhã desta quinta-feira o detentor do Prémio Nobel de Literatura, Imre Kertész.

O novelista húngaro foi laureado em 2002 com um dos mais distintos prémios do mundo, pelas obras que retratavam os campos de concentração nazi como a mais “derradeira verdade” sobre a barbárie humana.

Imre Kertész foi ele próprio um sobrevivente dos campos de Auschwitz e Buchenwald na Alemanha nazi de 1944. A sua triologia “Sorstalanság” traduzida para o português com o título “Sem Destino”, publicada pela primeira vez em 1975, é considerada por muitos como um dos melhores romances escritos sobre o Holocausto. O escritor levou 13 anos para concluir a obra e apesar de não considerá-la uma autobiografia, o enredo terá sido próximo do seu durante a época da Alemanha nazi. Desde a vida judaica em Budapeste, até ser levado para Auschwitz aos 15 anos, onde cerca de um milhão de pessoas foram assassinadas, e depois transferido para Buchenwald, até o seu regresso a uma opressora e estalinista Budapeste.

Numa entrevista ao El País, Kertész declarou que a essência da sua obra, sobre atos tão bárbaros e violentos, é mais espiritual do que moralista. Afirma que o Holocausto não está presente nas consciências dos líderes europeus como deveria. Para o autor, o extermínio de judeus pela Alemanha nazi foi o naufrágio de todos os valores da civilização que não deve permitir que volte a repetir-se. Baseado em “Sem Destino”, o filme húngaro “Son of Saul” –  “O Filho de Saul”- ganhou em 2016 o Óscar de melhor filme estrangeiro.

Imre Kertész nasceu em 1929 em Budapeste no seio de uma família modesta judia. A sua deportação em 1944 para os campos de concentração nazis marcou para sempre Kertész e influenciou profundamente a sua obra. Após o fim da segunda guerra mundial, o escritor trabalhou como jornalista até que o seu jornal adota a linha do Partido Comunista.  Finalmente, nos anos setenta firmou-se como tradutor de obras de autores como Friedrich Nietzsche, Ludwig Wittgenstein, Sigmund Freud, entre outros.

Publica então “Sem Destino” em 1975. A obra não teve impacto imediato. Só alguns anos depois viria a ganhar algum reconhecimento por parte da crítica. Kertész viveu por mais de 35 anos num apartamento com 29 metros quadrados onde passou noites e dias a escrever na mesa da sua cozinha. Aí escreveu algumas obras, inclusive “Sem Destino”. Depois da queda do muro de Berlim tornou-se mais ativo. Entre as obras dessa época que já estão traduzidas para o português estão “Kaddish para uma Criança que não Vai Nascer” e “Um Outro – Crónica de Uma Metamorfose”. No entanto, seguiu pelos anos 90 sem qualquer reconhecimento por parte dos leitores, por parte dos críticos e por parte da Hungria que terá tentado amiúde impedir a sua carreira internacional.

Depois de “Sem Destino”, o novelista não retratou mais o Holocausto, pelo menos não diretamente. Em 2002 chega, finalmente, o reconhecimento. O Prémio Nobel de Literatura. Foi um momento alto para Kertész depois de tantos anos marginalizado.

Em Portugal, a Editorial Presença editou a maior parte da obra do autor. Não são, contudo, conhecidas passagens de Imre Kertész pelo nosso país.

O escritor morreu aos 86 anos em sua casa em Budapeste, vítima de Parkinson.

 

Artigo editado por Filipa Silva