Os candidatos ao cargo de secretário-geral da Organização das Nações Unidas iniciam esta terça-feira um conjunto de entrevistas perante os 193 países da organização. O JPN foi descobrir quem são os candidatos.

Trygve Lie, primeiro secretário-geral da Organização das Nações Unidas (ONU), considerava o cargo como “o emprego mais impossível do mundo”. A assembleia-geral da ONU inicia esta terça-feira, em Nova Iorque, uma série de entrevistas com os candidatos à sucessão de Ban Ki-moon, atual secretário-geral. António Guterres é o único português na corrida, sendo um dos oito candidatos já oficiais.

Pela primeira vez, os candidatos vão ser submetidos a uma sessão de perguntas e entrevistas transmitidas em direto pela Internet, perante os 193 países que integram a organização. A ONU propôs esta medida com o objetivo de ter um “mecanismo mais transparente de seleção e nomeação”, ou seja, para que o público possa conhecer melhor os candidatos.

Mogens Lykketoft, presidente da assembleia-geral da ONU, explicou num comunicado que os candidatos vão ter de entregar documentos “sobre os desafios e as oportunidades que [na sua opinião] serão enfrentados pela Organização das Nações Unidas e pelo próximo Secretário-geral”, com um máximo de duas mil palavras, tendo dez minutos para defender as suas posições. Ao longo de duas horas, os candidatos vão responder a perguntas dos membros da ONU, bem como do público, sendo que cada diálogo vai ser transmitido em direto, “até que o Conselho de Segurança formule a sua recomendação”.

As apresentações vão decorrer entre esta terça e quinta-feira.

Como é que decorre o processo eleitoral

Os candidatos propostos ao cargo de secretário-geral são sugeridos pelos Governos de cada Estado-membros da ONU. A título de exemplo, Portugal sugeriu António Guterres. Após a proposta de cada país, o Conselho de Segurança da ONU, numa reunião privada, sugere um nome desses candidatos, aos cinco membros permanentes do Conselho de Segurança (Estados Unidos, Reino Unido, Rússia, China e França).

Caso seja aprovado por estes cinco membros, o escolhido vai a votação na assembleia-geral, onde tem que reunir, pelo menos, 66% dos votos. O secretário-geral é eleito por um período de cinco anos, não havendo nenhum limite de mandatos.

 

Quem são os candidatos?

Terça-feira

Igor Lukšić foi primeiro-ministro do Montenegro entre dezembro de 2010 e dezembro de 2012. Na altura, com 34 anos, foi o mais jovem primeiro-ministro do mundo. Igor foi também ministro das Finanças durante dois mandatos, entre 2004 e 2010. Hoje, é ministro dos Negócios Estrangeiros do país balcânico. Adepto da escrita, tem publicados três livros de poesia e prosa.

Irina Bokova é diretora-geral da UNESCO. Irina foi nomeada vice-ministra dos Negócios Estrangeiros para coordenar as relações da Bulgária com a União Europeia, entre 1995 e 1997. Desempenhou também o cargo de embaixadora em França e no Mónaco.

A atual diretora-geral da UNESCO mostra-se bastante confiante na vitória, provavelmente devido aos rumores que apontam a Rússia como apoiante da candidata búlgara. “Sei que vou ganhar a votação na ONU”, afirmou à estação televisiva Nova. Bokova é vista como uma forte oponente ao racismo e ao terrorismo.

António Guterres é um dos oito candidatos já declarados. Concorre ao cargo, depois de dez anos de liderança do Alto Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados (ACNUR). Antes da ONU, foi primeiro-ministro de Portugal, entre 1995 e 2002.

A sua candidatura foi formalizada pelo Governo português a 29 de fevereiro, sendo sublinhado o “amplo consenso interno” em torno da candidatura do antigo alto-comissário da ONU para os refugiados. O jornal “The Guardian” considera que Guterres tem “o perfil mais elevado”, devido à sua alta experiência e pelo facto de ser “um orador apaixonado”.

O antigo primeiro-ministro referiu a importância de “perceber as tendências”, uma vez que a globalização potenciou o crescimento económico, diminuindo a pobreza, mas levando a grandes desigualdades socioeconómicas.

Guterres defende que é essencial preservar a paz mundial, dando prioridade “aos mais vulneráveis, como as mulheres e as crianças”, e que é necessário haver “um dever moral de agir coletivamente para pôr fim ao terrorismo”. A inclusão não é esquecida, já que é fundamental promover uma maior coesão entre sociedades distintas, para acabar com “o racismo, a xenofobia, a islamofobia e o antissemitismo”.

Quarta-feira 

Danilo Turk é ex-presidente da Eslovénia, tendo cumprido o mandato entre 2007 e 2012. Teve uma carreira de destaque como professor, tendo sido docente de Direito Internacional entre 1983 e 1992. Já na altura, Turk tinha como objetivos não só ensinar e investigar, como lutar pela defesa dos Direitos Humanos.

O professor foi o primeiro esloveno no Conselho de Segurança da ONU, e foi eleito secretário-geral assistente para as questões políticas da organização antes de assumir a chefia do Governo da Eslovénia.

Em 1987, propôs a criação um conselho para a proteção dos Direitos Humanos e liberdades fundamentais da Eslovénia, até aqui inexistente. Um ano depois, o conselho surgiu e em 1991 escreveu o capítulo dos Direitos Humanos para a então independente República da Eslovénia.

Danilo Turk foi embaixador da ONU em Nova Iorque, desenvolvendo um conjunto de atividades com a assembleia-geral, com particular destaque em assuntos políticos, procurando a defesa dos Direitos Humanos, bem como questões de segurança e assistência humanitária. A 3 de fevereiro apresentou a candidatura a secretário-geral da ONU.

Vesna Pusic é uma socióloga e política croata. Pusic foi vice-primeira-ministra e ministra dos negócios estrangeiros.

Como trunfo, usa a sua experiência como cidadã de um país em guerra. Recorde-se que a Croácia, um país da ex-Jugoslávia lutou pela independência entre 1991 e 1995. “Talvez seja demasiado pensar que um secretário-geral pode mudar o mundo. Mas ajuda muito se essa pessoa conhecer a realidade do que é um país antes ou durante um conflito”, disse, em declarações ao “The Independent”.

É tida em conta como uma candidata liberal e é uma ávida defensora da igualdade de género e direitos LGBT.

Nos últimos três anos, Natalia Gherman foi vice primeira-ministra da Moldávia, bem como ministra dos Negócios Estrangeiros e da Integração Europeia. Entre junho e julho de 2015 assumiu o cargo de primeira-ministra.

Natalia iniciou a carreira política em 1991 como Secretária para o Departamento das Organizações Internacionais do Ministério dos Negócios Estrangeiros. A participação na ONU veio em 1994, quando serviu como representante permanente na agência de Viena. Simultaneamente, esteve presente na agência da OCDE na cidade austríaca.

A embaixadora teve um papel crucial na adaptação da política migratória na Moldávia, estabelecendo uma parceria com a União Europeia para garantir as bases para um desenvolvimento sustentável do país. De 2009 para a frente, coordenou uma série de projetos da ONU na Moldávia, como a reforma da administração pública e o aumento da representatividade feminina nos poderes de decisão. Em 2014 foi considerada para o “The Guardian” uma das “sete mulheres a observar na política global que estão a promover a mudança por todo o mundo”.

Natalia Gherman apresentou a candidatura a 19 de fevereiro.

Quinta-feira

Srgjan Kerim tem já uma grande carreira no que diz respeito à diplomacia. Ao longo do seu percurso, trabalhou como embaixador, ministro dos Negócios Estrangeiros da Macedónia e foi presidente da 62ª assembleia-geral das Nações Unidas.

Caso vença as eleições, as prioridades do macedónio são a reforma das Nações Unidas, a segurança, o desenvolvimento sustentável, a igualdade de género, a educação e as questões relacionadas com os migrantes.

Apesar da agenda apertada, Kerim aproveita os tempos livres para escrever e fotografar. Kerim publicou já onze livros, ligados a áreas tão variadas como a política internacional ou a poesia.

Helen Clark é, atualmente, a diretora do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD), função que começou a desempenhar em 2009. Antes, cumpriu três mandatos como primeira-ministra da Nova Zelândia, entre 1999 e 2008.

“Estou a candidatar-me com base na minha comprovada experiência em liderança durante quase três décadas, tanto no meu país como, aqui, nas Nações Unidas” disse Helen Clark à agência AFP.

Considerada uma forte candidata ao cargo de secretária-geral da ONU, Helen Clark diz ter a “experiência” e os “atributos necessários para o trabalho”.

Para Helen Clark, “o posto de secretário-geral significa dar voz a sete mil milhões de pessoas que procuram esperança e apoio na ONU”.

Que hipóteses tem Guterres?

A participação portuguesa na ONU tem atingido objetivos interessantes, como obter um dos dez lugares rotativos do Conselho de Segurança, ou a eleição para o Conselho Económico e Social das Nações Unidas.

António Guterres admitiu dificuldades na sua candidatura, dado que, segundo uma norma não oficial, o cargo de secretário-geral da ONU deve rodar entre diversas regiões do mundo, sendo que, teoricamente, este ano deveria corresponder a um candidato da Europa de Leste.

Para além deste facto, o antigo primeiro-ministro considera que “parte em desvantagem” por este ano haver pressão para que uma mulher assuma o cargo, ideia que em fevereiro foi reforçada por Edward C. Luck, analista da ONU: “Muitos membros expressaram a determinação de encontrar uma mulher altamente qualificada para o cargo, algo que seria inédito. Várias mulheres promissoras declararam a sua intenção ou aguardam nos bastidores”. Das 166 pessoas que em 2015 trabalhavam no secretariado, com cargos de subsecretário ou de secretário-geral adjunto, apenas 37 eram mulheres.

Esta ideia é vista por alguns como uma oportunidade de reforçar a igualdade de direitos das mulheres no mundo, principalmente em regiões onde são vítimas de discriminação. Guterres defende que o secretário-geral da ONU deve promover a igualdade de género, reforçando o papel das mulheres no Conselho Executivo da organização.

As audições podem ser acompanhadas por qualquer pessoas, no “site” da ONU, a partir das 20h00 de Lisboa.

Artigo editado por Sara Gerivaz