“É necessário fazer um inquérito de comportamentos alimentares a nível nacional”. Esta foi, muito provavelmente, a frase mais repetida ao longo das quatro horas em que foi discutido o Inquérito Alimentar Nacional e de Atividade Física (IAN-AF), esta quinta-feira, na Faculdade de Medicina da Universidade do Porto (FMUP).

O evento na FMUP contextualizou o caso português noutros europeus. Presentes estiveram Lene Frost Andersen da Universidade de Oslo e Marga Ocké em representação do Instituto Nacional de Sáude Pública e Ambiente dos Países Baixos. Nestes países nórdicos, os desafios prendem-se em ter uma base de dados que permita métodos comparativos de observação e a continuação de monitorização numa fase futura.

Nestes inquéritos, a Noruega e os Países Baixos insistiam em questões relacionadas com a frequência de ingestão de comida, o tempo passado a praticar atividade física, o peso e a altura e outras variáveis do estilo de vida, como hábitos de uso de tabaco, álcool ou drogas. Acidentes e saúde sexual também entram nas componentes estudadas.

Nestes dois casos, o processo foi apenas aplicado a crianças e adultos. Alguns resultados mostram que os mais velhos são muito mais participativos do que os mais novos, assim como as pessoas com Educação Superior. As mulheres também estão mais disponíveis a tomar parte do inquérito. Nesta intervenção foi ainda salientada a importância deste estudo, uma vez que pode ser usado para vários fins e por várias entidades, tal é o caso de políticos, instituições que concernem à saúde pública, cientistas ou até mesmo jornalistas que procurem dados sobre o assunto para desenvolverem determinada matéria.

A alimentação em Portugal

O caso português difere do anterior. Não é feito um IAN-AF há 26 anos. Para este projeto estão inscritos 5.200 participantes. O estudo está a ser feito desde outubro passado e vai prolongar-se até setembro deste ano. Os investigadores pretendem revelar os resultados no primeiro trimestre de 2017.

Pedro Graça, diretor do Programa Nacional para a Promoção da Alimentação Saudável, da Direção-Geral da Saúde (DGS) reiterou a importância de melhorar o estado nutricional da população. Para tal, é necessária a existência de dados que possam ser comparados ao nível europeu para de lá se retirarem conclusões no sentido de melhorar a “adaptação de alimentos bons e maus na alimentação dos portugueses”.

“Mais do que uma observação pontual feita de cinco em cinco ou de dez em dez anos, é necessário que exista uma capacidade de este modelo de funcionamento poder ir observando o impacto de determinadas situações”, afirmou, ao JPN, Pedro Graça. O nutricionista concluiu, ainda, que uma monitorização dos comportamentos, tal como esta, permite regular o custo de eficácia de várias medidas que podem ser tomadas após conhecerem os resultados do inquérito. O IAN-AF tem, também, a premissa de avaliar o consumo dos portugueses e a composição dos alimentos que estão nesse consumo.

Carla Lopes é a investigadora responsável pelo IAN-AF e confirmou a posição tomada por Pedro Graça. “O principal motivo [para a elaboração do estudo] é termos informação atualizada e para o consumo alimentar e, também, de atividade física em Portugal e podermos, com isso, suportar as políticas de saúde nesta área”, esclareceu ao JPN. “A monitorização e a informação do consumo podem servir políticas não só na área da saúde, como também na agricultura e noutros setores”, rematou a professora da FMUP.

As entrevistas aos participantes vão ser feitas por nutricionistas por meio de um software criado para o efeito. Lá os inquiridos vão poder encontrar questões direcionadas ao consumo alimentar e nutricional, hábitos e comportamentos alimentares, avaliação de consumo do sal, utilização de suplementos alimentares, insegurança alimentar, hábitos e comportamentos de atividade física, caracterização sociodemográfica e antropometria (o ramo da antropologia que estuda as medidas e dimensões das variadas partes do corpo humano).

Com estas entrevistas, o estudo pretende, assim, avaliar o consumo alimentar, incluindo e enfatizando os alimentos, nutrientes, suplementos alimentares e/ou nutricionais, comportamentos alimentares de risco, contaminantes alimentares e riscos biológicos. A investigação incide, ainda, nos níveis de atividade física, não deixando de parte o sedentarismo e as atividades desportivas. Por fim, os investigadores pretendem caracterizar as dimensões alimentares, de atividade física e antropométricas por região, condição socioeconómica e de acordo com outras determinantes relacionadas com a saúde.

A base amostral da análise contempla o Registo Nacional de Utentes do Serviço Nacional de Saúde (SNS), sendo elegíveis pessoas entre os três meses e 84 anos de idade, desde que residentes em território português. O território é estratificado em sete regiões: Norte, Centro, Lisboa, Alentejo, Algarve, Madeira e Açores. A seleção de inquiridos é feita de forma aleatória, de acordo com o sexo e grupos etários.

O Inquérito Nacional Alimentar e de Atividade Física é financiado pelo Programa de Iniciativas em Saúde Pública e conta com o apoio da Direção Geral da Saúde, da Administração Central do Sistema de Saúde e das Administrações Regionais de Saúde.

O projeto resulta de uma parceria entre a FMUP, o Instituto de Saúde Pública da Universidade do Porto (ISPUP), a Faculdade de Ciências da Nutrição e Alimentação da Universidade do Porto (FCNAUP), o Instituto Nacional de Saúde Doutor Ricardo Jorge, a Faculdade de Medicina da Universidade de Lisboa (FMUL), a Faculdade de Desporto da Universidade do Porto (FADEUP), a Faculdade de Motricidade Humana da Universidade de Lisboa (FMH), SilicoLife e a Faculdade de Medicina da Universidade de Oslo, na Noruega (UiO).

Artigo editado por Sara Gerivaz