Se antes não era possível aumentar o ciclo de vida útil de um produto, atualmente, o foco é direcionado para a sua reutilização, reparação, renovação e reciclagem. O final de vida de um produto poderá ditar o início de outro. São estes os princípios que norteiam a economia circular, que esteve em debate na Faculdade de Engenharia da Universidade do Porto (FEUP), na última terça-feira.

Gary Crawford

Gary Crawford Foto: Ana Guedes

Gary Crawford, em representação da Veolia – empresa que desenvolve soluções nas áreas da energia, água e resíduos -, expôs exemplos de como a economia circular é aplicada a diferentes setores de atividade, nomeadamente na indústria.

O primeiro caso apresentado foi o alemão. Constitui um sucesso devido ao processo “bottle-to-bottle” no qual a empresa Rostock recicla cerca de um bilião de garrafas por ano para garantir a rentabilidade do recurso usado. Outro exemplo abordado por Crawford foi o da Castorama, em França, que produz cerca de mil toneladas de matéria-prima secundária por ano. Essa matéria-prima secundária obtém-se a partir do desperdício de madeira das suas lojas. A parceria com a Veolia resultou na produção de um balcão de cozinha feito com 35% de madeira e 65% de plástico reciclado.

O representante da Veolia explicou que o grande objetivo de acelerar a aplicação da economia circular nos mais diversos setores industriais é o de libertar os aterros e vender composto feito a partir desses resíduos. Ilustrou com o caso dos Países Baixos que aplicam produtos com um longo ciclo de vida na horticultura, infraestruturas, eletrónica e automação.

O modelo circular foi apresentado como uma enorme oportunidade para diminuir a utilização de matérias-primas, por forma a não esgotar os recursos. Representa um estímulo à criatividade na redução de custos e fomenta a criação de emprego. Crawford salientou a importância de estreitar a cooperação entre o ensino e os tecidos industriais, uma vez que, na sua opinião, a economia circular deve estar nas competências que levamos para o mercado.

Economia circular pode gerar 600 mil milhões em 2050

Esta foi a segunda conferência no âmbito do ciclo “A Voz da Indústria”, mediada por Maria de Lurdes Lopes, professora catedrática da FEUP e membro da Direção do Cluster Smart Waste Portugal. Após a intervenção de Gary Crawford sobre o modelo de economia circular, seguiu-se um debate entre os três oradores convidados com direito a intervenção do público.

Mafalda Evangelista foi a primeira oradora do painel, começando por defender o novo modelo económico como uma “ferramenta para uma economia autossustentável – ‘green economy’ -, que promove o bem-estar e reduz os impactos ambientais”. A coordenadora de projetos do BCSD Portugal – Conselho Empresarial para o Desenvolvimento Sustentável apelou à importância do desenvolvimento de “green skills”, isto é, competências ambientalmente responsáveis.

A oradora sublinhou o papel crucial das escolas na reeducação para uma economia circular de modo a fomentar a consciencialização dos alunos para a preservação de recursos. Mafalda Evangelista defende que a implementação deste tipo de economia promove a criação de empregos, novos produtos e serviços e uma economia competitiva. Informa ainda que no ano de 2050, prevê-se que a economia circular proporcione às empresas da União Europeia uma poupança líquida de 600  mil milhões de euros por ano.

Jorge Portugal prosseguiu com o debate, informando que, embora Portugal esteja acima da média no que concerne à evolução deste tipo de economia autossustentável, “Holanda, França, Alemanha e alguns recantos nórdicos são exemplos” que também poderão servir de modelo a outros países. De facto, a Lipor é pioneira da economia circular.

A implementação destes princípios requer investidores, políticas estáveis e tecnologia eficaz para que as infraestruturas possam ser inovadas. O diretor-geral da COTEC refere que a economia circular não é um assunto recente: “Há 40 anos já se falava da economia circular, mas só agora, devido à tecnologia, existência de novos materiais, algoritmos e ao conhecimento da ‘máquina’, é possível implementá-la.” Ainda assim, “com os preços das matérias-primas abaixo do custo marginal dos materiais reciclados, os compradores não os compram”, alerta.

Apesar dos desafios que a economia circular tem pela frente, Jorge Portugal invoca a necessidade de criação de novas marcas que vendam estes produtos autossustentáveis, porque, caso contrário, ter-se-ão de exportar. “Não podemos parar”, concluiu.

Artigo editado por Filipa Silva