Nem frio nem sintético travaram as quinas. Três dias depois da goleada sobre Andorra, Portugal chegou às Ilhas Feroé e repetiu a dose: seis golos sem resposta e um jogo de sentido único. Se em Aveiro a noite fora de Ronaldo, no Tórsvøllur os louros estavam reservados para outro avançado, mais jovem, mas igualmente eficaz.

Para relvados artificiais, um goleador natural

Fernando Santos promoveu três alterações em relação a sexta-feira. Uma delas já era previsível, tendo em conta os problemas de Raphaël Guerreiro na coxa esquerda. O lateral do Borussia Dortmund não entrou na ficha de jogo e fez Antunes saltar para o quarteto defensivo. No meio-campo, William Carvalho e João Mário renderam João Moutinho e Bernardo Silva, para contrariar o jogo mais direto e físico dos nórdicos.

Mudaram nomes, mas Portugal continuou fiel ao 4-4-2 que tantas alegrias deu no último verão. À frente, tudo na mesma: Ronaldo e André Silva, numa dupla com golo, dinâmica e um futuro risonho para abraçar. Já Lars Olsen foi mais comedido. Trocou apenas de lateral direito, voltou a desenhar o 4-5-1 e entregou as lides atacantes ao combativo Edmundsson.

Portugal entrou a controlar a bola, mas quase nunca teve espaço para progredir. Os feroeses, animados pelo melhor arranque de sempre numa fase de apuramento para um Europeu ou Mundial, forçavam o erro, com iniciativas de pressão alta e marcações apertadas. Como se não bastasse, acrescentavam-se as já esperadas dificuldades de adaptação ao sintético de Tórshavn.

Contudo, a balança não demorou a desequilibrar. Aos 12’, João Mário foi da esquerda para o meio e tentou rasgar a defesa contrária para servir Ronaldo. A bola não chegou ao destino, mas a presença do avançado madrileno atrapalhou Ragnar Nattestad. Aproveitou o ressalto André Silva, qual instinto oportunista, que colocou a bola pelo meio das pernas de Nielsen, até então imbatível no apuramento. A partir daqui tudo se tornou mais acessível, com João Mário a pautar ritmos dentro do bloco adversário, sempre bem auxiliado por André Gomes.

Dez minutos depois, novo piscar no marcador. Outra direção do médio milanês, outra conclusão do dianteiro portista. Agora de cabeça, depois de um cruzamento tenso de Quaresma, que colocou Nielsen e Gregersen aos papéis. Bastaram dois golpes para Portugal levar o adversário ao tapete. É que, tal como em Aveiro, no Tórsvøllur as duas primeiras oportunidades portuguesas também resultaram em golo.

Antes do intervalo, mais um tiro sem misericórdia, cortesia de André Silva. Cancelo rematou forte, o guarda-redes afastou como pôde e o gondomarense não perdoou. O dianteiro portista não ficou saciado com o seu primeiro golo internacional e fez história na capital feroesa: na última década, só Cristiano Ronaldo tinha marcado um hat-trick com a camisola de Portugal.

Dois jogos a titular e quatro golos pelas quinas. Aos 20 anos, faz por estar no sítio certo, à hora mais conveniente. Com meia parte ainda por jogar, poucas dúvidas restavam. André Silva, a figura maior do encontro, já podia levar a bola para casa. Mas Portugal não ficou por aqui.

Gerir para a estocada final

A conjuntura convidava os portugueses a gerir o esforço no segundo tempo. Ritmo desacelerado e muitas interrupções. Pelo meio, umá notícia para novembro: Pepe viu amarelo e fica afastado do compromisso com a Letónia. Mesmo assim, as Ilhas Feroé nunca chegaram a reentrar no encontro. Prova disso é que remataram três vezes nos 90 minutos e continuaram a deixar a baliza à mercê da eficácia lusa.

Dentro da última meia hora, Cristiano Ronaldo quis comparecer à festa. O avançado já tinha ameaçado aos 48’, mas foi com João Mário que preparou o ataque mortífero. Uma série de tabelinhas, seguida de bomba com o pé esquerdo. O jogador do Real Madrid tornou-se no português com mais golos em fases de qualificação para Mundiais, superando os 19 golos de Pauleta. Por outro lado, é o melhor marcador desta zona europeia de qualificação, com cinco tentos apontados.

A resistência feroesa foi quebrada com facilidades inesperadas. As sucessivas entradas de Gelson, Éder e João Moutinho vieram confirmar esta ideia. André Silva e Pepe estiveram perto de assinar o quinto, que viria na entrada para a compensação. Moutinho puxou do pé direito um arco indefensável para Nielsen. Logo a seguir, no último suspiro, Cancelo atravessou uma autoestrada. O lateral do Valencia agradeceu e fez o terceiro golo em três jogos pelas quinas, igualando um feito que datava de 1936. Duas jogadas projetadas por um denominador comum: Gelson Martins.

Portugal desligou o complicador e atendeu às cautelas de Fernando Santos. Saiu um desfecho vitorioso e sem grandes sobressaltos, com subida isolada ao segundo posto do grupo B. Tudo num ambiente onde reina a tranquilidade. Ou não fosse o roubo de uns chinelos na piscina local o último crime gravoso registado em Tórshavn.

“A atitude foi a correta”

O comportamento de Portugal em campo mereceu elogios do selecionador. Em declarações à RTP, Fernando Santos disse que “a equipa cumpriu o plano delineado e teve a atitude correta. Tivemos compromisso em relação ao jogo, tanto nos aspetos ofensivos como defensivos”, sustenta o treinador que fez esta segunda-feira 62 anos.

Sobre as contas do grupo, Santos é conclusivo: “Temos de ganhar todos os jogos e lutar com a Suíça, pois não acredito que as outras seleções cheguem lá. Se vencermos todos os jogos, incluindo a Suíça, acredito que garantimos o primeiro lugar”, rematou.

“Sinceramente só penso em meter a bola no fundo das redes”

André Silva viveu uma noite de sonho e não escondeu o sorriso. Na zona de entrevistas rápidas da RTP, o avançado do FC Porto admitiu estar “sem palavras” com o hat-trick apontado em Tórshavn, naquilo que considerou ser “um sonho concretizado”. Apesar disso, o gondomarense diz que não pensou muito na hora de marcar os três golos: “Sinceramente só penso em meter a bola no fundo das redes e por isso estou feliz”.

João Mário elogiou a exibição da seleção e deu os parabéns a André Silva. O médio do Inter de Milão “não esperava um resultado tão dilatado”, mas continua focado em vencer os jogos todos até final. Já Antunes sublinhou que “é sempre bom voltar à seleção, sabendo que a concorrência é elevada”. À espera de “um jogo difícil”, o lateral do Dynamo Kyiv destacou a forma como os portugueses trouxeram a “lição bem estudada”.

Suíça cumpre serviços mínimos, Hungria estreia-se a vencer

Ao fim de três jornadas, a Suíça é das poucas seleções europeias que conta por vitórias todos os jogos realizados no apuramento para o Mundial 2018. A equipa de Vladimir Petković foi buscar a Andorra mais três pontos e consolidou a liderança. Fabian Schär, de penálti, e Admir Mehmedi construíram o triunfo helvético, descontado por Cristian Martínez.

Em Riga, a Hungria finalmente conheceu o sabor da vitória. Ádám Gyurcsó abriu o marcador na primeira parte, Ádám Szalai dissipou as dúvidas na etapa complementar. O conjunto magiar segue no terceiro lugar com quatro pontos, em igualdade com as Ilhas Feroé. Na próxima ronda, Portugal recebe a Letónia no Algarve. Os feroeses deslocam-se a Luzern para jogar com a Suíça, ao passo que Hungria e Andorra medem força em Budapeste.

Ficha de jogo

Competição: Campeonato do Mundo 2018 – Fase de Qualificação (3ª jornada)
Estádio: Tórsvøllur, Tórshavn
Assistência:  cerca de 6.000 espetadores
Golos: André Silva (12’, 22’ e 37’), Cristiano Ronaldo (65’), João Moutinho (90+1’) e João Cancelo (90+3’)
Cartões Amarelos: José Fonte (39’), Atli Gregersen (59’) e Pepe (60’)

Equipa de Arbitragem
Árbitro: Gediminas Mažeika (Lituânia)
Árbitros Assistentes: Vytautas Šimkus e Vytenis Kazlauskas
Quarto Árbitro: Donatas Rumšas

Ilhas Feroé

Onze inicial: Gunnar Nielsen; Gilli Sørensen, Ragnar Nattestad, Atli Gregersen (C) e Viljormur Davidsen; Brandur Olsen, Fróði Benjaminsen e Hállur Hánsson; Sølvi Vatnhamar, Jóan Edmundsson e René Joensen
Suplentes utilizados:
René Joensen, Jóhan Davidsen e Kaj Bartalsstovu
Treinador: Lars Olsen

Portugal

Onze inicial: Rui Patrício; João Cancelo, Pepe, José Fonte e Antunes; João Mário, André Gomes, William Carvalho e Ricardo Quaresma; André Silva e Cristiano Ronaldo (C)
Suplentes utilizados: Gelson Martins, Éder e João Moutinho
Treinador: Fernando Santos

Artigo revisto por Filipa Silva