A aventura do português teve início no ano de 2011, quando se juntou aos fundadores do projeto “Cinéma du Désert”, Davide Bortot e Francesca Truzzi, que já andavam na estrada desde 2009. O que o moveu foi a vontade incontrolável de visitar África: “Queria experienciar o que era a África Subsariana, queria ver a pobreza de que toda a gente falava. E isto surgiu”.

Trocando por miúdos, o “Cinéma du Désert” é um cinema móvel, alimentado a energia solar, que tem viajado pelo mundo num antigo camião de bombeiros, para projetar filmes gratuitamente em aldeias esquecidas. O projeto está ao abrigo da organização não-governamental “Bambini nel Deserto” e move-se pela crença de que o acesso gratuito à cultura cria bases para um melhor amanhã.

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Mas a iniciativa não se fica pelo cinema: “Da primeira vez que fui a África levámos uma estrutura de metal que pesava 400 quilos. Esta estrutura de metal foi instalada num oásis em Marrocos para receber painéis solares, que iriam dar energia a uma bomba de água. Não é só cinema que nós fazemos, o cinema é uma vertente. Com o cinema tentámos abrir as portas da comunicação com os locais, entender quais os problemas, trabalhar em projetos sustentáveis e procurar financiamento da Europa para os levar a cabo”, explica João Meirinhos.

Campos de refugiados: “É a melhor receção de sempre”

Neste ano, o grupo de voluntários de oito pessoas (de nacionalidades italiana e inglesa, para além do português) já passaram pelos campos de refugiados de Eko e Idomeni, este último já extinto. Neste momento, encontram-se nos campos em volta de Tessalonica. “Esta é uma expedição pequena, vão ser só duas, três semanas. É uma coisa curta, os fundos são muito poucos”, afirma João.

Apesar de ficarem por pouco tempo, o impacto da chegada não foi menor: “É a melhor receção de sempre. Nós pensamos que era impossível haver uma receção mais intensa que a dos africanos, porque encontrámos populações que ou não conheciam o cinema ou nunca tinham visto televisão. Mas aqui ainda é mais intenso. Porque as pessoas estão presas, sem objetivos, estão à espera de alguma decisão burocrática, à espera de saber para onde serão enviadas… Todos os dias fazemos cinema, aqui. E isso não acontece em lado nenhum. Todos os dias o pessoal vem ter connosco e pede ‘outra vez’. Precisam de qualquer coisa que os distraia, precisam de esperança, entretenimento”, explica.

Relativamente ao tipo de filmes que são projetados, o português alerta para o facto de grande parte dos refugiados serem menores: “Há crianças por todo o lado”. Por essa razão, e devido às evidentes barreiras linguísticas, o grupo elege um género muito específico de filmes: “O que exibimos são curtas de animação, documentários sobre a natureza, educativos, e Charlie Chaplin, uma data de Charlie Chaplin”. João conta ainda que ali “não há Hollywood”, tudo o que passam tem como objetivo sensibilizar a audiência para problemáticas como a ecologia e a globalização, porque “toda a gente deve ter noção do mundo em que vive”.

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A chegada, o impacto e a festa

Quando questionado sobre a importância de levar este tipo de arte aos locais visitados, João explica: “Toda a gente já foi marcada por um filme. Nós damos acesso a quem não veria um tal espetáculo a chegar a sua casa, porque vamos a aldeias, literalmente, remotas. E as pessoas ficam extremamente surpreendidas”.

De todas as visitas que já fez, o português recorda-se de uma em especial: “Eu gostei particularmente de uma aldeia na Georgia, no ano passado, porque foi daquelas em que escolhemos ao acaso: o sol estava pôr-se e o nome da aldeia tinha piada… Vimos uns miúdos a jogar basquetebol e, apesar de não falarem inglês, tentei explicar-lhes que tínhamos um cinema e perguntei se eles estariam interessados. E ao entenderem que era mesmo de um cinema de que estávamos a falar, um espetáculo numa aldeia minúscula, deu para ver aqueles olhos a brilhar, de satisfação genuína, de surpresa! E depois as pessoas recebem-te muito bem! Há comida, bebida… Aquilo transforma-se numa festa!”.

Apoios procuram-se

Segundo João Meirinhos, o plano para 2017 é voltar à África Ocidental. No entanto, o projeto está dependente do financiamento público: “Estamos à procura de apoios, porque acreditamos mesmo que isto vale a pena. Especialmente quem nos encontra no campo entende que vale a pena, porque, de certa forma, a saúde de uma pessoa também passa pelo seu estado mental e o entretenimento, nesse sentido, certamente que ajuda.”

Artigo editado por Filipa Silva