Jorge Andrade é co-fundador e diretor artístico da companhia de teatro Mala Voadora, cuja sede se levanta discretamente na Rua do Almada, no Porto. Foi lá que o autor do “Melhor Espetáculo” de 2016, segundo a Sociedade Portuguesa de Autores, falou com o JPN sobre “Moçambique”.

A obra premiada é uma autobiografia hipotética, que Jorge Andrade constrói partindo do pressuposto que tinha ficado a viver em Moçambique, país onde nasceu, mas de onde saiu com apenas quatro anos.

“Os meus pais foram muito novos para Moçambique, onde me tiveram a mim e ao meu irmão. Mas depois do 25 de abril, regressamos a Portugal. De toda a minha família, só ficou lá a viver a minha tia Eulália, que tinha dois filhos. Entretanto, ambos os seus filhos morreram e ela veio a Portugal. E eu lembro-me de ouvir a minha mãe a conversar com a tia Eulália na cozinha e da tia perguntar se a minha mãe não lhe podia dar um dos seus filhos. Tenho memória da minha mãe ter dito que me dava a mim, mas que não conseguia viver sem mim. Então, o espetáculo sou eu a imaginar como teria sido a minha vida hoje, se a minha mãe me tivesse dado aos meus tios em 1974”, conta o autor.

Na peça, Jorge Andrade toma conta do negócio dos tios: produção de tomate e venda do concentrado. A narrativa que começa por ser pessoal, ganha amplitude nacional e depois global, ao pôr em palco pedacinhos da História moçambicana e mundial: “Aquilo que eu faço é contar numa hora e dez [minutos] a História de um país, o que não é fácil. E como se condensa muito, ela acaba por parecer quase fantástica e irreal. Mas é verídica, por mais absurdo que possa parecer”, explica.

Para a conceção da obra, o diretor artístico teve um período de residência de dois meses em Moçambique, só a fazer investigação. O resultado final é um espetáculo onde cabe texto, dança, música, canto, vídeo e até imagens de arquivo cedidas pelo Instituto Nacional de Audiovisual e Cinema moçambicano.

“Temos tido sempre as salas cheias”

Fundada por Jorge Andrade e José Capela, a companhia de teatro Mala Voadora apresentou o primeiro espetáculo há nove anos.

No Porto, a companhia reside na Rua do Almada, num edifício de três andares da autoria de Júlio José de Brito, o mesmo arquiteto do Teatro Rivoli. No seu interior, para além do escritório principal, alberga uma pequena sala de espetáculos com lotação de 50 lugares, sala de espera para o público e diversos estúdios para artistas que necessitem de lá ficar a dormir.

Jorge Andrade só tem boas coisas a dizer acerca do público portuense: “Os nossos espetáculos são, várias vezes, apresentados no Rivoli e temos tido sempre as salas cheias, o que é bastante bom. Mas penso que a Mala Voadora não é uma exceção neste panorama. O Porto vive, nestes dois últimos anos, um novo folgo cultural e acho que isso tem movimentado as pessoas.”

Na agenda da companhia, o espetáculo “Triple Threat”, de Lucy McCormick,  foi apresentado este domingo (19 de março). A 1 e 2 de abril a Mala Voadora propõe um conceito inovador de espetáculo, –“SPA” de David Cabecinha — que será transmitido em streaming, podendo ser visto por qualquer pessoa no conforto do lar.

Artigo editado por Rita Neves Costa

Artigo atualizado com o nome do espetáculo de 1 e 2 de abril.