O peso que a China tem a vindo a assumir no panorama mundial do futebol é inegável. O objetivo, que foi definido pelo presidente Xi Jinping, é de tornar a China numa superpotência do futebol, capaz de conquistar troféus internacionais, e para isso não faltam meios financeiros ao dispor dos clubes.

No último mercado de transferências, segundo dados da BBC citados pelo “Público”, os clubes chineses investiram cerca de 387,2 milhões de euros. A quantia foi superior à que os clubes da Premier League investiram no mesmo período. É também mais do que os gastos dos clubes espanhóis, italianos, franceses e alemães, juntos.

Vários foram os jogadores e clubes que sofreram a tentação das ofertas de clubes chineses. Jogadores como Wayne Rooney (Manchester United), Edison Cavani (Paris Saint-Germain) e, cá em Portugal, jogadores como Kostas Mirtroglou (Benfica) e Bas Dost (Sporting).

A transferência mais cara do mercado de inverno pertence a um clube chinês, o Shangai SIPG, que pagou 60 milhões de euros por Óscar, jogador brasileiro do Chelsea.

Mas não é só na contratação de jogadores de nível mundial que se tem feito sentir a aposta chinesa. No capítulo dos treinadores, destaca-se a estreia de André Villas-Boas pelo Shangai SIPG, que se tornou num dos treinadores mais bem pagos do mundo. Para Paulo Turra, treinador-adjunto de Luiz Felipe Scolari no Guangzhou FC desde novembro de 2015, a razão da aposta prende-se com o facto de “no primeiro momento os [treinadores] chineses quererem aprender muito com os treinadores estrangeiros”, referiu em entrevista ao JPN.

Paulo Turra, treinador-adjunto no Guangzhou FC Foto: Paulo Turra/Facebook

No primeiro escalão chinês está também o treinador campeão pelo Boavista, Jaime Pacheco, no Beijing Goan e o ex-selecionador português Luiz Felipe Scolari no Guangzhou FC. Marcello Lippi, campeão mundial pela Itália em 2006, é o atual selecionador chinês.

Simão Freitas, coordenador da formação do Shandong Luneng

Em relação às principais diferenças entre o trabalho que os dois treinadores realizavam antes de ingressarem nos clubes chineses e o trabalho que realizam atualmente, Paulo Turra e Simão Freitas, coordenador da formação do Shandong Luneng, apontam em direções diferentes.

Turra destaca a menor frequência de treinos pois, segundo o treinador brasileiro, o “biotipo fisico dos jogadores chineses ainda não comporta essa carga de trabalho”. Já Simão Freitas, que chegou à China no verão do ano passado, aponta o dedo à forma como é feito o tratamento do talento, pois na China “a maioria dos treinadores não respeita o talento do jogador prejudicando de forma muito acentuada o seu desenvolvimento”.

“Dinheiro não é sinónimo de qualidade”

A forte aposta que o governo chinês tem realizado no futebol é vista com bons olhos pelos treinadores, embora Simão Freitas tenha algumas críticas a apontar, dizendo que o facto de se “realizarem seis jogos em menos de duas semanas e de se impedir que jogadores mais novos possam jogar num escalão mais velho porque foram registados no início da época no escalão mais novo, são factos completamente injustificáveis e que prejudicam severamente o desenvolvimento dos jovens jogadores.”

Simão Freitas destaca ainda o facto de dinheiro não ser sinónimo de qualidade, pois pode-se ter “o melhor e mais caro material para construir uma casa, mas isso não significa que se construa uma casa de qualidade”, refere o técnico português, também ao JPN. Paulo Turra destaca a vertente educativa do futebol, como um bom meio para as crianças se educarem e não irem por caminhos traiçoeiros.

Questionado sobre o facto de as transferências para clubes chineses serem vistas como “reformas antecipadas” das respetivas seleções, Paulo Turra refere que isso dependerá do nível de profissionalismo dos atletas.  “É lógico que o nível técnico do campeonato chinês ainda não se compara ao brasileiro ou europeu de ponta, mas o Paulinho [atleta brasileiro que já passou pelo futebol europeu, nomeadamente, pelo Tottenham], que está aqui no Guangzhou FC treina e joga com uma intensidade enorme, um grande profissional”, expõe o treinador brasileiro.

O futuro do futebol na China

No que o futuro guarda para o crescimento do futebol naquele país asiático, os dois treinadores concordam que o caminho aponta para um futuro risonho. Simão Freitas alerta que para que exista um crescimento sustentado, é preciso ultrapassar “as barreiras bloqueadoras do desenvolvimento dos jogadores, investindo forte no desenvolvimento coletivo e individual”, referindo ainda que através da utilização de uma metodologia ajustada, a China pode ter um crescimento sustentado nos próximos tempos.

Paulo Turra partilha a mesma opinião, referindo que com a continuação da aposta nesta política, “o futebol chinês evoluirá ano após ano e quem sabe a médio ou longo prazo, possa ser independente e respeitado pelos seus resultados dentro de campo. Torço para que isso aconteça”, conclui.

Artigo editado por Filipa Silva