Alberto Amaral foi reitor da Universidade do Porto entre 1985 a 1998 e hoje dirige o Centro de Investigação de Políticas do Ensino Superior (CIPES) e preside a Agência de Avaliação e Acreditação do Ensino Superior (A3ES). É também o coordenador científico do EDULOG, um think tank sobre educação, cuja conferência anual vai acontecer nos dias 25 e 26 de maio na Porto Business School.

O professor descreve o EDULOG como uma tentativa de “influenciar políticas no sentido de resolver os problemas mais prementes do sistema educativo” em Portugal. Como? Através de projetos de investigação e de iniciativas que dinamizem e fundamentem a discussão nacional sobre educação. Com a conferência na linha do horizonte, o JPN entrevistou o especialista sobre o estado da educação no país.

Para Alberto Amaral, o problema começa na discussão, ou na falta dela. “De uma maneira geral, a sociedade civil em Portugal funciona muito mal ou não funciona mesmo. Se for para discutir futebol, há programas aos domingos, segundas, terças, quartas, quintas… Mas o resto… Viu alguma coisa de discussão de educação?”

Para o antigo reitor, Portugal tem há muito tempo um problema “muito complicado” na área da investigação e do ensino. Uma das grandes questões é a competição ao nível global. “Passados todos estes anos [da revolução do 25 de Abril], e apesar de todos os esforços, a posição relativa de Portugal é mais ou menos a mesma, porque se nós progredimos, os outros também”.

“No novo sistema de globalização e de economia, o conhecimento parece ser cada vez mais fundamental. Portugal tem taxas de educação baixas, nomeadamente relativamente à população trabalhadora e isso é um problema em termos de competitividade internacional. Pior ainda, porque as estatísticas mostram que os nossos empresários têm um nível educativo mais baixo que os próprios operários”, reflete.

Em curso, já estão projetos de investigação sobre a gestão das escolas, sobre o impacto do professor na aprendizagem do aluno e a criação de um Observatório da Educação, tido como o primeiro banco de dados sobre o sistema de ensino português.

Países do sul em destaque

A conferência do EDULOG tem trazido diversos temas a debate. Este ano, discute-se o desenvolvimento económico nas regiões do sul da Europa. Alberto Amaral adianta algumas reflexões: “Quando os países com mais dificuldades – Portugal e a Grécia, por exemplo – aderiram à União Europeia, havia a convicção e a esperança que os fundos estruturais nos pusessem todos ricos e que os países mais atrasados conseguissem recuperar em relação à média europeia. Pelo que se verifica, nada disso aconteceu. Nomeadamente agora com a crise da dívida, verificou-se que os países em vez de convergirem, estão a divergir”, diz. A ideia da conferência deste ano é analisar o problema e o que estará na sua base.

“Porque  é que os quatro países – Portugal, Espanha, Grécia e Itália – têm este tipo de problemas. É um defeito dos países? É um defeito das políticas? É um defeito da União Europeia?”. O grande objetivo é, então, “tentar perceber porque é que isso acontece para corrigir, se for possível, esse tipo de trajetória, que está a levar a lado nenhum”.

“Cada ministro quer deixar a sua marca pessoal e entretém-se a mudar os programas de ensino, os livros escolares… E a gente nunca mais sai disto”

A relação com a educação é mais clara do que parece: “Num gráfico em que, por um lado, tem o nível educativo e, por outro, tem o PIB per capita, verifica que as regiões mais ricas são aquelas onde o nível educativo é mais alto”. “O que significa também uma outra coisa: pensar que a educação é uma condição necessária, mas não suficiente, para a melhoria dos países”.

O professor pergunta e responde: “E porquê? Olhe para Portugal e veja o interior do país. Se as câmaras municipais decidissem investir fortemente na educação no interior do país, depois o que acontecia quando as pessoas acabassem a licenciatura? Não têm emprego e portanto voltam outra vez para o litoral”, o que acabava por não melhorar a situação no local do investimento.

Falta continuidade às políticas de educação

Mas afinal qual é o grande problema da educação? Alberto Amaral diz que é “não ter efeitos imediatos”. “Os políticos, usualmente, gostam de investir em coisas que lhes permitam ganhar as eleições seguintes… E isto é um esforço de longo prazo”.

“Há uma coisa que para mim me impressiona particularmente, que é a falta de continuidade nas políticas. Muda o ministro, quer fazer coisas diferentes, destrói o que o anterior fez, nem sequer avalia nem nada, e faz coisas novas. E isto não é sustentável. Eu estudei, por exemplo, o caso da Finlândia, onde houve um consenso nacional sobre o que devia ser feito. E aquilo é feito ano após ano, independentemente do governo que lá está. Os pormenores podem ser mudados, agora não pode mudar completamente as coisas, como infelizmente acontece. Cada ministro quer deixar a sua marca pessoal e entretém-se a mudar os programas de ensino, os livros escolares… E a gente nunca mais sai disto”.

“Portugal tem tido durante muito tempo um problema muito complicado que é a instabilidade total do professor.”

Quando questionado sobre os métodos de avaliação em Portugal, o professor hesita, mas responde: “tudo o que vem da OCDE indica que nós não deveremos ser tão ávidos de andar a fazer exames porque isso pode ser prejudicial. Vamos ver se se atinge um equilíbrio” e volta a referir: “De novo, lá está, precisávamos de uma definição de políticas ao nível nacional e não que cada ministro que vem mudasse o que o anterior esteve a fazer”.

A resposta parece ser difícil de concretizar: “Houve um ministro que tentou fazer isso. O Marçal Grilo foi tentar arranjar um acordo supra-partidário que permitisse estabelecer umas linhas mestras que se mantivessem durante um período. E não conseguiu… Sem isso é muito complicado”.

Nesse caso, por onde começar? Mudar metas curriculares parece não produzir efeito pelas “descontinuidades na formação dos alunos”, mas os professores são uma base importante para a aprendizagem.

“Portugal tem tido durante muito tempo um problema muito complicado que é a instabilidade total do professor. O professor hoje pode ser colocado no Porto, no ano seguinte pode não ter emprego, daí a dois anos pode ir para Vila Real de Santo António…”. Para Alberto Amaral, a “ligação permanente com o professor” é fundamental e não tem sido assegurada. “Acho que é dos grandes problemas que nós temos, assegurar a estabilidade de um número considerável de professores, porque sem isso nada feito”.

A Conferência Internacional EDULOG 2017 conta também com André Rodriguez-Pose, da London School of Economics, John Edwards, da Joint Research Centre, Ugo Fratesi do Politécnico de Milão e Joaquim Oliveira Martins, da Divisão de Política e Desenvolvimento Regional da OCDE para debater a avaliação do sucesso de políticas aplicadas no sul da Europa.

Do programa de apresentações sobre políticas e projetos em curso, destaca-se ainda o “Debate Nacional” com a “Análise Aprofundada do Contexto Socioeconómico Português, Cenários Prospetivos e o Papel do Capital Humano e da Educação” para encerrar a conferência. O debate tem como moderador Pedro Teixeira, da Universidade do Porto e conta com a participação do economista Daniel Bessa, Elisa Ferreira, do Banco de Portugal, José Varejão, da Universidade do Porto e Ester Silva, da CCDRN (Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional do Norte).

Artigo editado por Filipa Silva