O novo Cinema Batalha quer “olhar a cidade e ser visto por ela”, mas isso só vai acontecer, na melhor das hipóteses, dentro de dois anos. O espaço, que é “uma obra de arte absoluta” nas palavras de Alexandre Alves Costa, já tem um projeto fechado, pelo menos do ponto de vista funcional, um calendário, um orçamento e uma ideia do que quer ser no contexto cultural da cidade.

O Cinema Batalha foi inaugurado em 1947.

O Cinema Batalha foi inaugurado em 1947. Foto: CM Porto

A Câmara Municipal do Porto desenhou um caderno de encargos para o futuro espaço. Aos arquitetos Alexandre Alves Costa e Sérgio Fernandez coube aplicá-lo ao projeto de arquitetura. Na apresentação da primeira versão desse trabalho, que decorreu esta quinta-feira no palco da sala principal do cinema, Alexandre Alves Costa enumerou as dificuldades encontradas. Os arquitetos tentaram viabilizar as ideias da autarquia mas tiveram de se sujeitar “à autoridade maior do edifício existente”.

Mas as dificuldades não ficaram por aí: uma estrutura velha – com 70 anos feitos há poucos dias – e em estado de degradação avançado, sem soluções para pessoas com mobilidade reduzida – “há degraus por todo o lado!” -, sem condições modernas de insonorização, segurança, iluminação ou conforto térmico foram alguns dos aspetos que vão ter de ser resolvidos.

Trata-se, de cordo com os autores, de um “projeto de arquitetura que configura um verdadeiro ato de cidadania”.

O que é que vai mudar?

Na cave, desaparece a Sala Bebé, considerada pelo arquiteto “um projeto infeliz”. Ali se vai instalar uma sala polivalente. Além de integrar um salão de chá – a sua vocação original – também se vão poder lá organizar eventos como workshops, debates ou exposições, que podem ser autónomos em termos programáticos.

Sem Sala Bebé, os arquitetos tiveram de encontrar espaço para construir uma nova sala estúdio para exibições com menor público. A solução foi desenhada a partir da sala principal, que tem três níveis: plateia, tribuna e segundo balcão. Por considerarem que, no seu todo, a sala “tem uma dimensão excessiva para os tempos atuais”, com um total de 950 lugares, os arquitetos decidiram construir a nova sala estúdio a partir do segundo balcão. Assim, no que toca à sala principal, esse nível passa a ter apenas três filas de público. Nas costas dele estará uma caixa, fechada. O novo cinema estúdio.

A sala principal tem plateia, tribuna e 2º Balcão. É lá que vai nascer a nova sala-estúdio.

A sala principal tem plateia, tribuna e 2º Balcão. É lá que vai nascer a nova sala-estúdio. Foto: CM Porto

A pensar no público com mobilidade reduzida, vai ser instalado um elevador que vai ligar verticalmente todo o edifício. Desde a cave, onde vai ficar a sala polivalente, até ao terraço, situado na cobertura do edifício. Também neste espaço, mais escondido do público, se pretende inovar: vai ser lá ser instalada uma esplanada para “usufruir da belíssima paisagem urbana” que ali se avista.

No foyer lateral da tribuna, vai ser instalada uma área de leitura, com uma pequena biblioteca, totalmente aberta.

Quando arrancam as obras?

De acordo com o calendário apresentado pelo presidente da Câmara do Porto, está previsto que o licenciamento fique concluído até agosto, devendo o plano de execução estar pronto até ao final do ano.

Segue-se a abertura de um concurso público. A obra não deve começar antes do verão do próximo ano. O prazo estimado da obra é de um ano e seis meses. Pelo que correndo tudo conforme previsto, o novo Cinema Batalha só abre as portas no verão de 2019, dentro de dois anos, portanto. A programação deve começar a ser desenhada um ano antes.

E qual é o investimento?

A obra tem um custo estimado em 2 milhões de euros. A este valor somam-se cerca de meio milhão para equipamento logístico, técnico e tecnológico.

A programação deve custar 250 mil euros/ano, ao passo que os custos de funcionamento, manutenção e recursos humanos devem chegar aos 550 mil euros/ano.

O espaço terá uma equipa de 18 elementos, alguns dos quais em partilha com outros equipamentos culturais da cidade.

Que tipo de programação vai ter o Batalha?

De acordo com Rui Moreira, isso vai depender do tipo de apoios que a autarquia consiga reunir, nacionais e internacionais, sendo certo que a ideia é apostar em cinematografia contemporânea, em cruzamento com cinematografia de arquivo, nacional e internacional.

Neste ponto, o autarca revelou que a autarquia não conseguiu chegar a acordo com a Cinemateca Nacional para a exibição de cinema de arquivo internacional. Depois de uma reunião ocorrida há cerca de três meses, contou o autarca, com o secretário de Estado da Cultura e a direção da Cinemateca ficou “claro que não há qualquer tipo de abertura da parte da cinemateca para que possamos exibir – dizem eles em condições de segurança, mas essa nós assegurávamos – cinema internacional no Porto”.

“Argumentaram na reunião que isso, em segurança, só podia ser feito em Lisboa. Compreendemos a posição da Cinemateca, mas felizmente quem manda no arquivo nacional não é a direção da Cinemateca e estamos seguros que quando chegar o momento próprio, o senhor ministro e o senhor secretário de Estado apoiarão a exibição de cinema internacional no Porto desde que salvaguardadas as questões de conservação e segurança”, conclui ainda Rui Moreira.

E os painéis de Júlio Pomar?

O Cinema Batalha não faz parte só da história cultural da cidade. É também um testemunho do contexto político em que surgiu. Durante o Estado Novo, o Batalha foi alvo de várias ações das autoridades. Uma das mais emblemáticas terá sido o apagamento de dois painéis desenhados por Júlio Pomar. O pintor, agora com 91 anos, acedeu ao convite da Câmara para os recuperar e terá na parte artística a ajuda do designer Henrique Cayatte.

Um dos painéis de Pomar mandados tapar pela PIDE.

Um dos painéis de Pomar mandados tapar pela PIDE. Foto: CM Porto

Mas antes do trabalho avançar, anunciou Rui Moreira, é preciso “investigar” para ver que memória guardam as paredes dos painéis originais. “Estão adjudicadas duas sondagens técnicas finais para assegurar de forma definitiva que as obras que existiram já não existem ou não podem ser recuperadas”, contou. O estudo vai ficar a cargo de José Pessoa, do Instituto Português dos Museus e de Carlos Mota, do Museu do Douro.

Inaugurado em 1947, monumento classificado desde 2012, o Cinema Batalha enfrentava há o cenário do encerramento definitivo. Este ano, a autarquia anunciou ter chegado a acordo com os proprietários do edifício para poder “devolver” o monumento à cidade. O Batalha vai ser alugado pela autarquia do Porto, por um período de 25 anos, a troco de uma mensalidade de 10 mil euros, ficando a reabilitação e a gestão a cargo do município.