Duas faces futebolísticas da mesma cidade. Normalmente jogam só um par de vezes ao ano. Mas quando se confrontam, especialmente no ambiente efervescente que o Bessa encerra, dá quase sempre faísca. Este sábado não foi diferente. Boavista e FC Porto correram muito, lutaram com forças redobradas e acabaram com semblantes tão distintos quanto as diferenças que os separam.

A pantera bem tentou enervar, mas acabou cuspida pelo fogo do dragão. Saíram três pontos para a freguesia de Campanhã, mediados pelos pés de Aboubakar, Marega e Brahimi. A equipa azul e branca regressou à liderança isolada do campeonato e provou continuar de boa saúde no trilho nacional. Contas feitas, só perdeu dois pontos em 30 possíveis. Mais ainda, há 62 anos que não marcava tanto na primeira dezena de jornadas. Por sinal, nessa época o FC Porto foi campeão.

Um miúdo gambiano a pôr tudo em sentido

O ambiente típico de jogo grande já indiciava o que vinha por aí. Duelos rasgadinhos, adeptos em pulgas e preces por criatividade. Por mais que as alas ficassem libertas para cruzamentos, o FC Porto esbarrou minutos a fio na solidez defensiva boavisteira. Nunca conseguiu obter efeitos práticos e ainda teve de suportar a irreverência do jovem Yusupha Njie.

O avançado gambiano tem 23 anos e só tinha contabilizado 33 minutos oficiais de pantera ao peito. No dérbi portuense surpreendeu em toda a linha. Ganhou a primeira titularidade absoluta com a camisola da pantera e nunca mostrou medo de segurar a bola. Pelo caminho semeou o pânico em duas ocasiões. Numa delas, o calcanhar africano obrigou o guardião portista – de novo, José Sá – a socorrer-se do instinto.

De facto, os contra-ataques dos visitados complicaram a vida ao Porto. Lá atrás, o Boavista foi cumprindo o plano desenhado nas cabines. Com muita agressividade à mistura, Jorge Simão quis estacionar o bloco numa zona média. Perdeu o controlo da bola, mas ganhou a batalha territorial no meio-campo. Anulou todo o perigo até ao intervalo, excetuando um remate desconchavado de Corona dentro da área.

Três jogadas de mestre até ao xeque-mate

Quinze minutos bastaram para inverter a história. Na etapa complementar apareceu um Porto empolgado, que fez cair as peças boavisteiras aos bocados. Não houve muitas oportunidades, mas houve demasiada eficácia. Aos 50’, Corona cruzou largo para a área, Brahimi amorteceu ao segundo poste e Aboubakar empurrou o dragão de Conceição para a liderança do campeonato.

O Boavista ainda foi dando algum ar da sua graça. Fábio Espinho, Mateus e Idris alimentaram o sonho de chegar ao empate. O treinador portista reagiu com a entrada de André André, originado uma nova fórmula no meio-campo.

Do outro lado, Jorge Simão queria mais. Até abdicou de um central para reforçar o poderio no meio-campo ofensivo. Mas o feitiço virou-se contra o criador.

Dez minutos finais de puro descalabro sentenciaram a partida. Vagner só conseguiu parar um remate de Herrera. De resto, mostrou-se impotente para travar a bomba de Marega (80’) e a correria louca de Brahimi (86’). Nos descontos, o maliano ainda esbarrou uma bola no poste. Foi uma diferença pesada, porque o triunfo portista teve algumas pingas de suor que o resultado não deixa transparecer.

Um “passeio” enganador

Uma primeira parte superior para os axadrezados e marcada por “duas oportunidades limpas de golo, pelo Yusupha e pelo Kuka” foi o que levou Jorge Simão a acreditar que a sua equipa deveria ter chegado ao intervalo com um resultado mais favorável.

O segundo golo do FC Porto foi o “momento do jogo”, no ponto de vista do treinador. Na sala de imprensa, Jorge Simão admitiu que na segunda parte arriscou, mas “a coisa não saiu muito bem”.

Quanto ao resultado final, “muito penalizador”, o treinador do Boavista mostrou-se insatisfeito “tremendamente enganador, porque quem não viu o jogo e olha para o resultado, pensa que isto foi um passeio”.

“Grande determinação” na chave do sucesso

Sérgio Conceição viu no Boavista um adversário muito semelhante ao FC Porto no que conta a uma boa agressividade de jogo. “Foi frisado pelo treinador do Boavista na antevisão do jogo que nós éramos uma equipa que fazíamos muitas faltas e não deixávamos o adversário sair, eu penso que nesse capítulo o Boavista até tem mais faltas do que nós”, disse em conferência de imprensa.

Coesão de equipa, uma relva baixa e um relvado regular foi o que ficou a faltar, no ponto de vista do treinador. Condicionantes que acabaram por prejudicar a “construção, ligação, jogo e dinâmica” da equipa portista.

“A forma como nós estávamos a defender condicionou a forma de atacar, não estivemos bem na primeira parte nesse sentido. O Boavista estava melhor no jogo”, admite, mas salienta a grande determinação por parte de toda a equipa de continuar na liderança e chegar à vitória no campeonato.

Com os jogos dos três grandes fechados, o FC Porto continua líder com dois pontos de vantagem sobre o segundo classificado, o Sporting. O Belenenses é o próximo adversário dos dragões para o campeonato. Já o Boavista fica, à condição, na oitava posição da Liga e vai jogar fora de portas na próxima jornada, a Tondela.

Artigo editado por Filipa Silva