Um smartphone e uma conta de instagram foram o suficiente para David Guttenfelder registar as particularidades de dois países muito distintos: a Coreia do Norte e os Estados Unidos da América. A exposição do primeiro fotojornalista ocidental a ter acesso regular à Coreia do Norte “Coming Home” passou por Viana do Castelo e está agora na galeria Manifesto, em Matosinhos, até 30 de março.

David Guttenfelder trabalhava na Associated Press em 2011 quando a agência noticiosa decidiu abrir uma filial em Pyongyang, tornando-se a primeira agência ocidental a estabelecer-se no país. O fotojornalista começou a passar longas temporadas em reportagem na Coreia do Norte e, assim que o país abriu a rede de telemóvel com acesso a 3G, decidiu abrir uma conta no instagram e mostrar ao mundo um lado do país pouco visível.

“Através de uma conta digital tivemos acesso a uma visão muito íntima do que é o quotidiano na Coreia do Norte. Quem vai à Coreia do Norte enquanto turista está completamente blindado e vê o que lhe deixam ver. Este tipo de imagens normalmente não saem de dentro da Coreia”, diz ao JPN o curador da galeria Manifesto, Tiago Costa.

Foto de casamento na Coreia do Norte em frente a estátuas dos antigos líderes Kim Jong Il e Kim Il Sung, em Pyongyang. Foto: David Guttenfelder

Depois de passar vinte anos fora do país onde nasceu, os Estados Unidos da América, Guttenfelder decidiu voltar a casa para trabalhar na National Geographic. Foi assim que surgiu a exposição “Coming Home”, produzida pelo Festival Visa Pour L’image com a curadoria de Olivier Laurent, onde a realidade estadunidense e a intimidade norte coreana são postas lado a lado.

“A exposição tenta fazer duas coisas: por um lado, dar-nos uma visão mais de quotidiano da Coreia do Norte, longe dos holofotes das notícias do dia, e, por outro lado convidar a uma reflexão entre o que é o dia a dia na Coreia do Norte e o quotidiano nos Estados Unidos”, adianta Tiago Costa.

O curador da galeria considera que, apesar de a exposição retratar dois países muito diferentes a nível político, cultural e social, existem, ainda assim, alguns pontos de contacto entre as duas realidades.

“Quando se tem uma boa história e quando se sabe trabalhar uma boa história a probabilidade de ela atingir o público aumenta”

“Há aqui uma sequência de fotografias muito interessantes em que no centro há uma caixa de fósforos e ao lado tem uma bonequinha que são os polícias sinaleiros de Pyongyang. Aquilo é claramente propaganda. Depois, se olharmos para o outro espectro [o lado dos EUA] vemos um cartaz de uma estrada nos Estados Unidos que pergunta “Onde está Jesus?”. Será que isto não é também propaganda, mas de duas coisas totalmente diferentes?”, questiona.

As fotografias de Guttenfelder chegaram a todo o mundo através da rede social instagram, o que constitui, na visão de Tiago Costa, a prova de que, apesar da dificuldade em aferir se as informações divulgadas na internet são verdadeiras, produzir informação e conteúdo é cada vez mais acessível ao cidadão comum.

“Somos constantemente ameaçados pelas notícias falsas e pela quantidade de informação gerada, mas, por outro lado, vivemos uma altura em que produzir conteúdo e distribuir conteúdo nunca foi tão fácil e tão democrático. Quando se tem uma boa história e quando se sabe trabalhar uma boa história a probabilidade de ela atingir o público aumenta”, remata.