“Dar o clique” é, para muitos jovens,  o momento em que se apercebem de que estão apaixonados. Mas a nova campanha da APAV vem explicar que “dar o clique” pode passar por dar o passo em frente e rejeitar a violência.

A violência no namoro foi alvo de estudo por parte da UMAR – União de Mulheres Alternativa e Resposta. Os inquéritos realizados pela associação revelam que cerca de 70% dos jovens consideram naturais os comportamentos agressivos numa relação e 56% já foram vítimas de intimidação.

Dos inquiridos 18% revelaram ser vítimas de violência psicológica, 16% denunciaram perseguições e 7% sofrem ou já sofreram situações de violência sexual, números que Ana Teresa Dias, colaboradora da UMAR, considera alarmantes.

“Este ano há 7% de jovens que dizem já ter sofrido algum tipo de violência sexual”

“Relativamente ao ano passado, houve um ligeiro aumento da legitimação. 68,5% dos jovens legitimam pelo menos uma forma de violência, mas a conclusão mais preocupante é que, destes jovens, os que mais legitimam comportamentos agressivos são os que sofreram anteriormente algum tipo de violência noutra relação”, clarificou a especialista.

Ana Teresa Dias realçou também os perigos de viver uma relação sexualmente abusiva e sublinhou as estatísticas: “Há dados alarmantes relativos à violência sexual. Este ano há 7% de jovens que dizem já ter sofrido algum tipo de violência sexual. Nos nossos questionários, incluímos, como exemplos de violência sexual, sujeitar o parceiro a beijar em frente aos amigos e forçá-lo a ter relações sexuais”.

“Um dado igualmente preocupante é o da legitimação, ou seja, assumir que a violência física é natural numa relação”, continuou a especialista.

“Muitos jovens ainda não pediram ajuda, e a ajuda tem de ser especializada, para ultrapassar esta situação”

A violência no namoro pode ser de natureza física, verbal, psicológica e sexual. Nuno Catarino, da Unidade de Comunicação e Marketing da APAV – Associação Portuguesa de Apoio à Vítima, reforçou que é necessário relembrar aos jovens que “certos comportamentos não são aceitáveis”. O especialista disse que a violência sexual é muitas vezes desvalorizada ou esquecida: “A violência no namoro também pode ser sexual, através da adoção de práticas não consentidas pelo parceiro”.

A violência no namoro “continua a ser um fenómeno preocupante, ao qual devemos estar atentos”, diz ao JPN Ana Raquel Simão, coordenadora pedagógica do projeto Unissexo da APAV.

A APAV aposta numa “ótica de sensibilização e de educação para a mudança de comportamentos violentos e para a progressão para a intimidade e relações saudáveis”, até porque, de acordo com Ana Raquel Simão, “há um aspeto muito importante a ter em mente: muitos jovens ainda não pediram ajuda, e a ajuda tem de ser especializada, para ultrapassar esta situação”.

Nova campanha “apresenta mensagens e referências ligadas às novas tecnologias”

Por isso, a APAV lança esta quarta-feira, em pleno Dia de São Valentim, a campanha de sensibilização cujo mote é: “Dá o clique”. Ana Raquel Simão explica que a estratégia de comunicação da associação se tenta aproximar do público mais jovem.

“Hoje em dia os jovens têm à sua disposição ferramentas muito evoluídas, como os telemóveis e as redes sociais, e “dar o clique” significa que os próprios jovens tenham a iniciativa de se informarem. E que este clique sirva de ignição para que se sintam motivados a pedir ajuda”, esclarece a coordenadora pedagógica do projeto Unissexo.

Também Nuno Catarino, da Unidade de Comunicação e Marketing da APAV, explicou ao JPN o objetivo principal da ação de sensibilização: “Esta campanha foi desenhada a pensar nos mais jovens e, por isso, apresenta mensagens e referências ligadas às novas tecnologias. O mote é, no fundo: ‘Dá o clique, fala com a APAV'”.

APAV pretende que a comunicação “seja feita de uma forma muito significativa, mas simples”

” O clique” pode ser feito recorrendo “ao site ou ao Facebook” da APAV e “através da linha de apoio à vítima, que é 116 006, de forma confidencial e gratuita, pedindo assistência junto dos técnicos”, lembrou a coordenadora pedagógica do projeto Unissexo da APAV.

A APAV está, desta forma, “a apostar na prevenção, na sensibilização”, segundo Nuno Catarino. Por outro lado, Ana Raquel Simão reforça que a Associação Portuguesa de Apoio à Vítima pode ser uma porta aberta para quem não vê saída.

Ana Raquel Simão diz que a associação pretende que “a comunicação seja feita de uma forma muito significativa, mas simples”, para que as camadas mais jovens “sintam que a APAV pode ser um recurso”.

“O número de pessoas que nos contacta é cada vez maior. Isto não significa que se verifique um aumento da violência no namoro”

De acordo com a especialista, os pedidos de ajuda por parte dos jovens têm vindo a aumentar: “Cada vez mais sentimos que os jovens recorrem a nós no sentido de se aconselharem, para perceberem os contornos da sua relação, porque acreditam que estão a viver uma relação violenta”.

Para Nuno Catarino, o aumento de pedidos de ajuda não significa necessariamente que a violência no namoro tenha também aumentado.

“Tal qual acontecia com a violência doméstica há uns anos – era uma situação socialmente aceite e que muita gente ignorava -, também a violência no namoro começa só agora a receber mais informação, porque as pessoas começam a perceber que há comportamentos inaceitáveis. Aliado a essa maior consciencialização, o número de pessoas que nos contacta é cada vez maior. Isto não significa que se verifique um aumento da violência no namoro”, esclareceu.

“Esta é uma questão que não é possível resolver de um dia para o outro”

Ana Raquel Simão espera que as campanhas de sensibilização de instituições como a APAV possam traçar um futuro de relações  prazerosas e saudáveis na vida dos jovens.

“O que se perspetiva para o futuro, com esta aposta na divulgação e na educação, é que estes jovens comecem a absorver os conhecimentos e a desconstruir os mitos que ainda existem sobre o papel de cada um numa relação. Espero que, no futuro, consigamos assistir a uma mudança de perceção acerca de comportamentos violentos na intimidade”,completou.

Acabar com o “ciclo de violência” não é, contudo, uma tarefa de solução simples. Segundo Nuno Catarino, “esta é uma questão que não é possível resolver de um dia para o outro, é um problema que passa por repensar vários paradigmas na sociedade”, rematou.

Artigo editado por Sara Beatriz Monteiro