“A valorização e a dignificação dos enfermeiros” são as razões que levaram à greve destes profissionais, que começou às 08h00 desta quinta-feira e que se vai prolongar até às 24hoo de sexta.

O descongelamento das progressões na carreia, a contratação imediata de 500 profissionais e de mais 1000 entre abril e maio, a “ocupação integral dos 774 postos de trabalho colocados a concurso” para as Administrações Regionais da Saúde (ARS) e o pagamento das horas em dívida são algumas das 15 exigências que motivaram a greve, segundo o Sindicado dos Enfermeiros Portugueses (SEP).

Numa nota enviada às redações na manhã do primeiro dia de greve, o Ministério da Saúde diz estar em negociações com “as diversas estruturas sindicais representativas dos enfermeiros” ao longo dos últimos meses, numa tentativa de “dar acolhimento às legítimas expectativas dos profissionais de enfermagem”.

Os compromissos do Governo quanto às alterações na lei que permitam o pagamento diferenciado aos enfermeiros especialistas e a assinatura de um protocolo para a negociação das carreiras não foram suficientes para impedir que a adesão à greve fosse entre 60% e 80% no país, segundo dados do presidente do SEP, José Carlos Martins. O primeiro balanço da paralisação foi feito às 11h30, em Lisboa.

Apenas uma das 12 salas de operações programadas do Hospital São João em funcionamento

A adesão à greve pelos enfermeiros no Hospital São João, durante a manhã, foi na ordem dos 72%, de acordo com informações avançadas por Fátima Monteiro, coordenadora da direção regional do Porto do SEP. “Não queremos lesar os utentes, mas quem empurra os enfermeiros para a greve é o ministério”, referiu ao JPN a sindicalista.

Às 10h00, não havia enfermeiros na unidade de consulta externa do São João e “apenas uma das 12 salas de operações no hospital” estava ativa, porque “dos 50 profissionais escalados para o serviço de cirurgia programada, 45 estão em greve”, garantiu Fátima Monteiro.

Sobre o protocolo para reposição das horas de qualidade dos enfermeiros e para estabelecer a diferenciação remuneratória, assinado em outubro de 2017 e em vigor a partir de 1 de janeiro deste ano, a coordenadora regional do SEP referiu que “estamos em março e ainda nada se concretizou”.

“As equipas de enfermagem estão bastante cansadas e há falta de enfermeiros, o que faz com que tenhamos de trabalhar horas a mais”.

A falta de autorizações para contratar e substituir profissionais de saúde é outra das lacunas apontadas ao Ministério da Saúde. “O Governo reúne, assume os compromissos, mas não os efetiva”, explicou Fátima Monteiro, acrescentando que “para que os enfermeiros façam efetivamente as 35 horas é preciso contratar mais profissionais”.

Nádia Rio esperava para ser atendida no serviço de consulta externa e disse “simpatizar com as reivindicações dos enfermeiros, porque têm de demonstrar o descontentamento [para com o Ministério da Saúde]”, mas admitiu que a greve “prejudica os utentes”.

Contrariando o serviço de consultas externas, no Serviço de Gastrenterologia os efeitos da greve não se faziam sentir. Mónica Almeida não fez greve e contou que não havia quaisquer “alterações no serviço, em relação a qualquer outro dia”, mas a greve é de dois dias e “sexta-feira poderá ser diferente”.

A enfermeira não aderiu por “escolha”. Concorda, contudo, com as reivindicações feitas pelos pares: “As equipas de enfermagem estão bastante cansadas e há falta de enfermeiros, o que faz com que tenhamos de trabalhar horas a mais”.

André Henriques, enfermeiro na unidade Medicina B interna para homens, aderiu à greve, mas esteve no hospital para apenas prestar os serviços mínimos aos pacientes, obrigatórios pela lei portuguesa. “Dos quatro enfermeiros do turno da manhã, apenas um não aderiu”, contou o enfermeiro.

Centros de saúde com funcionamento regular

No Centro de Saúde da Carvalhosa não se fizeram sentir os efeitos da greve: todos os dez enfermeiros daquela unidade de saúde apresentaram-se ao serviço, pelo menos durante a manhã, conferiu no local o JPN.

O mesmo aconteceu na Unidade de Saúde Familiar Bom Porto, também em Cedofeita, onde nenhum dos seis enfermeiros fez greve.

Já umas portas ao lado, na Unidade de Saúde Familiar Aníbal Cunha, a greve dos enfermeiros foi de 100%. Apesar da totalidade dos profissionais de saúde (seis naquela unidade) terem aderido à greve, ao JPN foi dito que a reduzida afluência de utentes não obrigou a reencaminhamentos para outras unidades de saúde. Sem situações urgentes, o atendimento foi remarcado para outras datas.

Os sete enfermeiros da Unidade de Saúde Familiar Arca D’Água não aderiram à greve. Sandra Oliveira foi trabalhar e considera que a “situação é mais preocupante” com os colegas que trabalham em hospitais.

A enfermeira da USF de Arca D’Água ainda não ponderou fazer greve na sexta-feira, mas explica que escolher não ir trabalhar “pode ser um rombo” no ordenado. Apesar de considerar válidas as reivindicações dos enfermeiros, “começam a ser algumas greves repetidas e acabamos por não fazer aquele ‘clique’”.

Catarina Martins pede “intervenção do primeiro-ministro”

À porta do Hospital de São José, em Lisboa, Catarina Martins, coordenadora do Bloco de Esquerda (BE), disse apoiar os enfermeiros. A deputada falava aos jornalistas depois do presidente do Sindicato de Enfermeiros Portugueses, José Carlos Martins, ter afirmado que a adesão à greve no país estaria entre os 60% e 80%.

Para Catarina Martins, é essencial “contratar 1.500 enfermeiros” no imediato. A deputada do BE referiu ser preciso resolver ainda o problema da “diferenciação dos enfermeiros especialistas” e da disparidade salarial entre “enfermeiros com as mesmas responsabilidades e competências”.

Quando questionada sobre se o ministro da Saúde, Adalberto Campos Fernandes, se deveria demitir ou ser demitido, a coordenadora do Bloco apenas afirmou que “o problema [dos enfermeiros] deve ser resolvido”, pedindo a intervenção do primeiro-ministro, António Costa.

Artigo editado por Filipa Silva