O corte de 5% das vagas oferecidas pelas instituições públicas de Ensino Superior do Porto e de Lisboa vai ter mais impacto nas famílias do que nas instituições. A opinião é de Olímpio Castilho, presidente do Instituto Superior de Contabilidade e Administração do Porto (ISCAP), uma das instituições visadas pela medida governamental.

O despacho do ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior, Manuel Heitor,  cujo conteúdo foi adiantado esta terça-feira pelo “Público”, e a que o JPN entretanto teve acesso, vem confirmar a intenção já anunciada em fevereiro pelo Governo de cortar vagas em universidades, politécnicos e escolas de enfermagem de Lisboa e do Porto tendo em vista uma “distribuição de vagas mais equitativa pelas diversas regiões do país”.

“Se isto é para beneficiar as regiões do interior como aparentemente parece ser, acho pouco”, declarou ao JPN Olímpio Castilho.

O responsável do ISCAP – uma das oito escolas do Instituto Politécnico do Porto – considera que esta é uma “medida isolada“, que devia estar enquadrada por uma política mais geral.

O problema da falta de procura das instituições do Interior, refere, justifica-se mais, na sua opinião, pela falta de perspetivas oferecidas nestas regiões aos jovens: “Um estudante, no momento em que entra no Ensino Superior, já perspetiva o futuro. Se não vir futuro nas regiões onde está, naturalmente vem para o Litoral. As pessoas vêm para o Litoral à procura de postos de trabalho, de empresas, de organizações… Se queremos fixar pessoas no Interior, temos de lhes dar condições de vida”, conclui.

O Governo, no preâmbulo do despacho que regula o estabelecimento das vagas para o próximo ano, argumenta com um conjunto de estatísticas que demonstram um aumento muito acentuado de vagas e inscritos no Grande Porto e na Grande Lisboa, por comparação com outras zonas do país.

Refere, por exemplo, que:

  • De 2001 a 2017, o número de vagas iniciais das instituições de Lisboa e do Porto aumentou em 31% (mais 5.266 vagas) ao passo que esse aumento foi de 9% nas restantes instituições do país (mais 2.657 vagas);
  • o ritmo de aumento de vagas no ensino superior público de Lisboa e do Porto é desproporcionado – por ser muito superior – face ao ritmo de crescimento da população;
  • a concentração de estudantes nestas duas cidades é superior à verificada nas duas maiores áreas urbanas de países como Espanha, Itália, França ou Áustria;

Olímpio Castilho aceita o argumento mas considera que os números são o reflexo de “uma oferta e uma procura muito influenciadas pela envolvente“. O aumento de vagas e cursos no Litoral respondeu ao aumento da sua procura.

Com o corte em linha de vista, o responsável do ISCAP entende que o ensino privado será o maior beneficiado o que não critica, “mas derrota o propósito do Governo”.

“Quem mais pode vir a beneficiar desta medida são as instituições de ensino superior privadas que estão no Litoral. Porque as famílias fazem contas e verificam que, entre mandar um estudante para o Interior e mantê-lo na sua residência, às tantas, fica próxima uma coisa da outra”, refere.

Manuel Heitor garantiu esta manhã, em declarações à TSF, que o Governo manterá o orçamento destas instituições, que deverão perder alguns alunos – cerca de 1100 vagas distribuídas por nove instituições de ensino.

Esse compromisso fortalece a ideia de Olímpio Castilho de que as famílias são, potencialmente, as grandes prejudicadas: “o impacto vai ser mais para as famílias do que para as instituições”.

“Se o ministro diz: nós não vamos cortar no financiamento, as instituições por aí até ficam beneficiadas, porque ficam com menos alunos e o mesmo financiamento”, reflete.

Mas não recebem menos dinheiro de propinas? Sim, mas o responsável máximo pelo ISCAP estima o saldo fique ainda assim positivo para as instituições.

“As contas não estão feitas, mas não estou muito preocupado até porque são 5%. O que estou preocupado é pela forma como isto é colocado em cima da mesa, como medida isolada, aparentemente bem intencionada, mas sem consequências nenhumas”, concluiu Olímpio Castilho.

Universidade do Porto, Universidade de Lisboa, Nova de Lisboa, ISCTE-Instituto Universitário de Lisboa, Politécnico do Porto, Politécnico de Lisboa, Escola Superior de Hotelaria e Turismo do Estoril e as escolas de Enfermagem do Porto e de Lisboa são as instituições que deverão cortar em 5% o número de vagas a oferecer no próximo ano letivo.

Deste grupo, ficam de fora os cursos de Medicina, cursos preparatórios de Medicina, cursos de Física e de Tecnologias da Informação e Comunicação Eletrónica nuclear (que incluem informática, ciências informáticas, eletricidade e energia, eletrónica e automação.