Ganham menos, estão mais sujeitas a condições de trabalho precárias e têm um risco de pobreza maior. Apesar dos avanços civilizacionais, as diferenças entre mulheres e homens – sobretudo no que diz respeito ao mercado de trabalho – são evidentes, tanto em Portugal como no resto da União Europeia. A Fundação Francisco Manuel dos Santos apresenta, esta tarde, o estudo “Igualdade de género ao longo da vida” coordenado por Anália Torres.

A investigação compara Portugal com os restantes países da União Europeia, desde o início do século XXI até 2016. O estudo faz ainda uma análise mais aprofundada de oito países europeus: Alemanha, Espanha, França, Polónia, Portugal, Reino Unido, República Checa e Suécia.

A análise das relações de género dividiu-se em três fases da vida: a infância e a juventude (até aos 29 anos), a rush hour of life (dos 30 aos 49 anos) e a fase tardia da vida ativa (dos 50 aos 65 anos).

Fique a conhecer sete das conclusões deste estudo aqui:

1)  Mulheres ganham menos do que os homens nas mesmas profissões

Um dos dados mais alarmantes do estudo prende-se com as diferenças salariais entre homens e mulheres, com o género feminino a ganhar menos, independentemente das categorias profissionais: “com diferenças que ultrapassam os 600 euros brutos mensais no grupo das(os) representantes do poder legislativo e de órgãos executivos, bem como dirigentes e gestoras(es) executivas/os, e os 200 euros no caso de artífices e trabalhadoras(es) qualificados da indústria e da construção”, lê-se no estudo.

Em Portugal, as mulheres jovens têm um salário médio por hora de 5,8 euros enquanto os homens auferem um salário médio/hora de 6,1 euros. Já na rush hour, as mulheres portuguesas recebem em média 10,3 euros por hora, enquanto os homens auferem, em média, 11,6 euros por hora. Finalmente, na fase tardia da vida ativa, as mulheres portuguesas ganham em média 9,9 euros por hora, enquanto os homens recebem, em média, 12,9 euros por hora.

2) Precariedade afeta mais o género feminino

A precariedade é também mais penalizante para as mulheres do que para os homens , em quase todas as idades, com a exceção da fase tardia da vida ativa “o que redunda em trabalhos de menor qualidade e de estatuto inferior, bem como em salários mais baixos”.

3) Taxa de desemprego jovem é superior nas mulheres

Ao contrário do que acontece na União Europeia, em que a taxa de desemprego jovem nas mulheres (15,6%) é inferior à dos homens (16,4%), em Portugal, há mais mulheres (23,7%) do que homens (21,9%) desempregadas.

Ainda assim, nos últimos anos houve uma diminuição da disparidade do emprego entre homens e mulheres em todas as idades. No entanto, este decréscimo não é prova de uma redução da desigualdade de género, porque se deve ao aumento do desemprego masculino: “Não se deve tanto à obtenção de empregos por parte das mulheres, mas antes à perda de empregos por parte dos homens”.

4) Cargos “mais prestigiantes” são ocupados por mulheres

Em Portugal, por exemplo, 58% dos juízes e 54% dos médicos são mulheres. Os cargos “socialmente mais prestigiantes” são ocupados pelo género feminino, refere o trabalho. Além disso, na UE a 27 há mais mulheres do que homens jovens a matricularem-se e a concluírem o ensino superior.

No contexto da União Europeia, verifica-se uma subida da participação feminina no mercado de trabalho, e Portugal destaca-se por apresentar uma taxa de emprego feminino acima da média europeia.

5) Disparidade salarial aumenta com o avançar da idade

As trabalhadoras portuguesas perdem, em média, 0,45 euros por hora quando transitam da rush hour para a fase tardia da idade ativa. Tanto em Portugal como na Europa, à medida que a idade e as carreiras profissionais avançam, a disparidade salarial entre homens e mulheres vai aumentando.

6) Mulheres correm maior risco de pobreza

As mulheres apresentam um risco de pobreza maior do que os homens em todos os países da União Europeia, em todas as idades da vida. Além disso, em Portugal, o risco de pobreza das mulheres em Portugal (26,6%) é superior à média da União Europeia (25,2%).

7) Tarefas domésticas recaem, sobretudo, sobre elas

À exceção da Finlândia, onde os homens jovens gastam tanto tempo como as mulheres jovens em trabalhos domésticos, “as mulheres despendem sempre mais horas por semana a cuidar da casa do que os homens, em qualquer idade da vida, em todos os países europeus”.

Portugal e Espanha são os países europeus onde se verificam maiores discrepâncias entre o tempo gasto por homens e mulheres jovens em tarefas domésticas (sete horas de diferença). Em Portugal, a diferença é maior na fase tardia da vida ativa (16 horas de diferença).

Educação e licenças de parentalidade equivalentes podem ser a solução

Na visão de João Cerejeira, economista e investigador da Universidade do Minho, há várias causas para explicar a disparidade salarial entre homens e mulheres. Por um lado, a escolha, por parte dos homens, de profissões melhor remuneradas.

“Os homens estão, por regra, em áreas ou ocupações que têm salários mais altos do que as mulheres, nomeadamente, as áreas ligadas à engenharia e às tecnologias de informação que têm salários mais elevados e onde a predominância masculina é maior do que a feminina”, começa por dizer.

Licenças de maternidade e de paternidade “deviam ser muito mais equivalentes”

Por outro lado, há uma maior dificuldade em promover mulheres, por causa da perceção de que as mulheres têm um absentismo maior do que os homens: “À mulher está associado um papel de apoio à família muito maior do que aos homens: quando há um problema familiar, de apoio a um filho ou a alguém de família. Essa perceção faz com que o empregador assuma que, à partida, a mulher irá ter descontinuidades maiores na vida profissional e, portanto, acaba por preferir homens na hora de contratar ou promover”.

Para João Cerejeira é fundamental apostar na “educação e na formação” dos mais jovens para alterar os estereótipos de género e desmistificar “a ideia de que há profissões de homens e profissões de mulheres”.

O investigador defende ainda que as licenças de maternidade e de paternidade “deviam ser muito mais equivalentes e deviam existir mecanismos que permitissem, por exemplo, tarefas repartidas de forma mais equitativa entre homens e mulheres”, remata.