O “Feminismos Sobre Rodas” é um projeto recente criado por mulheres ativistas de todo o país. A luta feminista é o que as une, mas chegou a altura de ouvirem outras mulheres. Do litoral ao interior, este grupo encontra-se a percorrer algumas cidades do país.

O percurso começou a 8 de novembro, em Lousada, e vai terminar a 13 de dezembro, com o Encontro Feminista Internacional, no Porto.

“Começámos a preparar as atividades e depois escolhemos as datas, com o Encontro Internacional Feminista em mente. O objetivo é construir redes para o dia 8 de março [Dia Internacional da Mulher], tendo em vista a greve feminista”, explica ao JPN Sofia Brito, membro do grupo.

O projeto é itinerante porque quer descentralizar o feminismo e dar voz a quem não a tem. A jovem de 24 anos diz que há uma concentração de movimentos, feministas ou não, no litoral e que há falta de contacto com as periferias e as zonas rurais. “Falta ir buscar as pessoas que ficam para trás e nós queremos construir um movimento que represente a maioria das mulheres. Vamos ouvir as vozes que vivem noutras realidades.”

A intenção da realização deste percurso é “sair de Lisboa e do Porto e chegar às mulheres que não são tão representadas, não são ouvidas ou não participam no movimento feminista, porque não têm atividades a ocorrer no local onde moram”. Pretendem criar uma “rede” que lhes permita conhecer e dar a conhecer “as mulheres locais” e as suas necessidades.

Ao longo do percurso, a ideia é realizar diferentes atividades nos diferentes pontos de paragem. Apesar de algumas atividades serem comuns a todos os locais, a bolseira de investigação em Psicologia explica que cada lugar requer atividades adaptadas ao meio. “Temos algumas ideias base que vamos tentando adaptar conforme o local”, explica.

Desde sessões em escolas a performances na rua, todas as atividades têm o mesmo fim: passar a mensagem, para que esta chegue ao maior número de pessoas. “Costumamos pendurar t-shirts, com diferentes ditados adaptados na perspetiva feminista e colocamos num estendal. Aproveitamos essa provocação para recolher testemunhos das pessoas, sobretudo das mulheres que passam, que param e que querem comentar.”

Uma das atividades promovidas por este projeto é a “Roda do Tricô”, que consiste em sessões de debate e rodas de conversa sobre diferentes temas. “Este nome surgiu para brincar com a ideia das mulheres sentadas em roda a fazer tricô, que é um estereótipo. O objetivo é quebrar essa ideia.”

Para além das atividades, as dinamizadoras do evento recolhem registos fotográficos e testemunhos de mulheres. A ideia é inspirada no projeto da escritora, jornalista e ativista portuguesa, Maria Lamas, “As Mulheres Do Meu País” (1947-1950), “que teve a intenção de recolher registos fotográficos de mulheres de diversas realidades de Portugal”. Sofia Brito confessa que o desejo é criar uma nova recolha e refazer a ideia de Maria Lamas, “porque nós não vamos aos locais só para levar coisas, vamos para trazer, também”, afirma.

De Lousada ao Porto, com passagem em Trás-os-Montes

Depois de Lousada, Barcelos e Amarante, este fim de semana o projeto chega a Ovar. Depois virá Viana do Castelo e Ponte de Lima (22 a 25 de novembro), Viseu, Lamego e Resende (29 de novembro a 1 de dezembro), e um fim de semana em Trás-os-Montes, nos concelhos de Miranda do Douro e Vimioso (6 a 8 de dezembro).

Por onde passaram, “correu muito bem”, avalia Sofia Brito. “Fizemos uma grande partilha. O que foi mais saliente, para mim foi o facto de as mulheres estarem dispostas a partilhar e reconhecerem as desigualdades. É preciso igualdade, embora ainda haja quem o questione”, reflete. A ativista conta que, nos destinos onde já estiveram ouvem-se testemunhos de mulheres “dos 16 aos 80 anos” que afirmam que “ainda não somos iguais” e que “há um longo caminho a percorrer”.

A viagem termina no Porto, no dia 13 de dezembro, para um Encontro Feminista Internacional. É na partilha de vivências deste encontro, que o “caminho coletivo” para o dia 8 de março de 2020 [da Greve Feminista Internacional] vai começar a ser preparado. “Esta é a nossa intenção: fazer este caminho coletivo e trazer um bocadinho de todas as vozes a que conseguimos chegar.”

A Greve Feminista Internacional vai acontecer dia 8 de março, do próximo ano. O “Feminismos sobre Rodas” quer marcar presença e elevar a voz de tantas mulheres, dispersas por um Portugal de contrastes.

O ideal, para as organizadoras do evento final no Porto é a adesão de pessoas com ideias diferentes. “Pretendemos que, tendo feito todo este percurso, seja sentido este convite de partilha, que permita às mulheres sentirem-se convidadas a estar neste, ou noutro momento do coletivo”.

As expetativas para o futuro do “Feminismo sobre Rodas” são elevadas. Com a realização do encontro final no Porto, a intenção é tornar o evento internacional, objetivo que, segundo Sofia, se vai realizar. “Nós vamos trazer diferentes mulheres com experiências noutros movimentos feministas, noutros países e isso vai enriquecer o debate. Vamos ter questões culturais e outras perspetivas, afirma.

Este é um projeto recente, mas em crescimento, com adesão e que tem gerado interesse, junto das pessoas. “Mulheres diferentes, por todo o país disseram: ‘Que bom! Finalmente faz-se alguma coisa, aqui’ ou ‘Isto era necessário’ para agitar um bocadinho as coisas.”

Sofia entende ainda, tendo por base a experiência neste projeto, que “não existe o conceito de ser feminista em Portugal”, mas sim “ser feminista em diversos ‘Portugais’”. “Existem realidades muito diferentes e a forma como aplicamos o feminismo nessas realidades é, também diferente”, explica.

Apesar da luta diária por um Portugal com mais igualdade entre homens e mulheres, a ativista considera que o país é “um espaço de uma enorme riqueza”: “enquanto mulher, tenho encontrado um lugar para a minha voz e para a minha luta. É um lugar onde encontro mulheres fascinantes, que me enriquecem e acreditam em mim.”

Em nome do projeto, deixa o repto: “Queremos ser mais, em todo o país, a sair à rua no dia 8 de março de 2020 na Greve Feminista Internacional. A revolução será feminista ou não será”, afirma.

Artigo editado por Filipa Silva