Jordi Salvadó, estudante de advocacia, diz que infelizmente por esta altura o execional tende a tornar-se normal na Catalunha. “Em todas as ações que organizámos na Universidade Autónoma de Barcelona (UAB) fomos sempre agredidos e pressionados por coletivos radicais independentistas”, afirma em entrevista ao JPN.

No mês passado, a banca informativa que montaram para divulgação da ‘S’ha Acabat!‘, associação que defende a manutenção da atual constituição espanhola contra o projeto independentista posto em marcha em 2015 na Catalunha, foi rodeada por uma contra-manifestação da Plataforma Anti-fascista da UAB.

Seguiram-se insultos e ameaças, até que um outro grupo, de encapuçados munidos de paus, investiu sobre os elementos da organização. Os agentes convocados pela Universidade para assegurar as condições de segurança intervieram e o confronto tornou-se inevitável.

⚫ Ayer un grupo de encapuchados camparon a sus anchas por el campus de la UAB. Agredieron a miembros de S'ha Acabat! y a personal de seguridad⚠️ Hoy la Universitat Autònoma de Barcelona sigue callada. EXIGIMOS una condena de los hechos y que el Rectorado deje de ponerse del lado de los violentos.

Publicado por S'HA ACABAT em Quinta-feira, 12 de dezembro de 2019

A reitoria da UAB, debaixo de fortes críticas dos movimentos constitucionalistas, acabou por emitir um comunicado dois dias depois dos acontecimentos, em que se solidariza com os agentes de segurança.

Dias depois, o grupo decidiu apresentar uma denúncia à Fiscalia (que corresponde ao Ministério Público em Portugal) contra a UAB e os Mossos de Esquadra (a polícia regional catalã).

Apesar de não terem resultado quaisquer feridos dos confrontos, Jordi Salvadó não tem dúvidas de que o que se passa nas universidades da Catalunha é representativo da “deteriorização da democracia” que atinge a sociedade catalã no seu conjunto, pondo em causa a normal convivência entre todos os cidadãos.

“As universidades têm que ser espaços de diálogo e de crítica, em que todos possam exprimir-se em total liberdade, sem medo de ser perseguidos ou ameaçados por pensar diferente”, afirma.

O dirigente do ‘S’ha Acabat!‘ sublinha que a organização está devidamente registada na Universidade e que a ação que estavam a promover foi autorizada.

Queriam amedrontar-nos e instigar-nos medo para que saíssemos dali e não voltássemos. Não conseguiram, mas nada disto é novo”, acrescenta.

Dois pesos e duas medidas

No início de novembro, as universidades aprovaram um regime de avaliação excecional para permitir que os estudantes pudessem participar livremente nas atividades de protesto que estão a ser organizadas pelos movimentos independentistas.

Os estudantes que o solicitem ficam desobrigados de assistir às aulas e podem realizar a sua avaliação por exame final.

O ‘S’ha Acabat!‘ discorda frontalmente desta decisão. Ao aprovar este novo regime de avaliação, explica Jordi, as universidades estão a “proteger uma ideologia“, tornando-se partidaristas e desrespeitando o princípio da pluralidade de pensamento que deve reger as instituições públicas.

Para além do mais, insiste, estão a ceder perante uma “chantagem“, porque os estudantes independentistas conseguiram que essa alteração fosse aprovada entricheirando-se nas faculdades e impedindo que os outros estudantes e funcionários pudessem aceder às instalações.

Isto dá o sinal errado para o futuro: “Cada vez que queiram conseguir algo, os estudantes só têm que recorrer à violência, ao caos e à intimidação“.

Três alunos e um professor interpuseram um recurso administrativo com o objetivo de travar este novo regime avaliativo, esperando-se agora uma decisão sobre o processo.

S’ha Acabat!‘: um dever moral e cívico

Jordi explica que o ‘S’ha Acabat!‘ é uma organização de jovens nascida há dois anos. Tem cerca de 150 associados, a maioria dos quais estudantes universitários.

Consideram-se independentes, pois não recebem subvenções, seja do governo espanhol, da Generalitat catalã ou de quaisquer partidos políticos.

Fazer parte do movimento constitucionalista é, segundo ele, uma “obrigação moral e cívica”. Em causa está a vulneração de direitos fundamentais na Catalunha, como a liberdade de expressão e a pluralidade ideológica: “os atuais líderes políticos tratam o povo catalão como um todo, um conjunto único de independentistas, mas isso é mentira”.

A Catalunha, acrescenta Jordi, é como o resto da Espanha: “existem múltiplas ideologias, formas diversas de entender o nosso país, a nossa terra, a nossa cultura”.

A situação “louca” da Catalunha

Jordi diz ao JPN que não gosta de fazer previsões para o futuro, mesmo que seja para apenas as semanas seguintes. “Da manhã para a noite tudo muda“, refere. É uma situação “louca”.

As suas palavras foram premonitórias. Nas horas posteriores à conversa com o JPN, o Tribunal de Justiça da União Europeia confirmava a legitimidade de Puigdemont, Junqueras e Comin assumirem o lugar de eurodeputados para o qual foram eleitos a 26 de maio (e beneficiarem da respetiva imunidade parlamentar); uma ação do Tsunami Demcràtic durante a partida Barcelona-Real Madrid foi um fiasco; a violência voltou às ruas da capital da Catalunha; e Quim Torra, Presidente da Generalitat catalã, foi inabilitado pelo Tribunal Superior de Justiça da Catalunha para o exercício de cargos políticos durante ano e meio.

Entretanto, por estes dias prosseguem as negociações entre a Esquerda Republicana da Catalunha (independentista), e o Partido Socialista Operário Espanhol (PSOE) para viabilizar a formação do novo governo. Pedro Sanchez tem sido alvo de críticas dos partidos da direita pelas cedências que tem feito à formação independentista (libertação de Oriol Junqueras, presidente da ERC, e promessa de submeter a consulta popular quaisquer futuros acordos relativos ao estatuto político catalão). Mas os efeitos de um possível acordo fazem sentir-se também no movimento independentista com os vários partidos regionais a mostraram-se mais divididos que nunca.

O conflito catalão está longe de ter uma solução à vista.

Artigo editado por Filipa Silva