A sirene dispara e o som torna-se ensurdecedor, como o medo que invade os homens, os soldados. Somos transportados para o ambiente da Guerra Colonial Portuguesa em África (1961/ 1974). Lá e cá, os traumas são uma constante, “um sonho mau”, como se ouve durante a trama. “Um Plano do Labirinto” entra em cena na próxima quinta-feira (09) e propõe-se a interrogar o público sobre a verdade e a mentira das histórias do Ultramar.

A peça de teatro desenrola-se à volta de três personagens que “são várias personagens”, explica João Lagarto, um dos atores, à margem do ensaio de imprensa que decorreu esta terça-feira. “Um Plano do Labirinto” abre alas à interpretação de cada um. “É um texto dinâmico”, que “não é muito uniforme, aponta para vários sítios, diz várias coisas, passa por várias coisas, propõe vários personagens”, acrescenta.

O palco, pouco iluminado como que a criar um ambiente sombrio ou obscuro, é envolto numa aura selvagem, florestal. Tanto à direita como à esquerda do palco, vemos alusões a árvores e animais. Há, ainda, espaço para um sofá já velho, roto e desgastado, como o povo exausto ali retratado. Povo esse que chega a sentar-se numa cadeira de rodas como forma de auxílio.

Duas realidades que se cruzam

A azáfama e alvoroço muito presentes em palco contrastam com alguns momentos de silêncio, de melancolia do homem branco. Além do tema principal que é a Guerra Colonial há, também, espaço para uma história de amor falhada entre um escritor em crise e uma mulher africana.

História essa que o encenador, João Garcia Miguel, compara com a história entre Portugal e África. “É, ao mesmo tempo, uma tentativa de Portugal e estes países africanos [Angola, Moçambique, Guiné-Bissau] se reviverem, voltarem a olhar uns para os outros e perceberem que além da guerra também houve uma relação de amor e de grande entendimento entre nós e os africanos. Não foi só guerra, houve muito mais do que isso”, remata.

“Um Plano de Labirinto” ergue-se à volta daquilo que o Ultramar significou para um povo que ficou marcado por esta memória, não tão distante. Na peça, são contados alguns episódios de guerra, como é exemplo o momento em que uma manada de antílopes investe sobre as tropas portuguesas, munidas de metralhadoras, e quem acaba por morrer são os soldados.

Um homem e um povo em crise

A trama mostra, assim, as marcas que a guerra deixou num povo. “O que te falta? Falta-lhe a luz”, ouve-se algures durante a representação, mostrando o desalento a que portugueses e africanos foram votados.

“A peça fala sobre um escritor em crise, profissional, mas também pessoal, existencial e emocional que é sinónimo de uma época em crise, uma época que colocou as pessoas num estado de dificuldade de continuidade das suas vidas. Tudo aquilo que, anteriormente, já era frágil se acentuou”, afirma João Garcia Miguel.

Quanto ao escritor falhado, Sara Ribeiro, personagem feminina, refere que este “era uma espécie de potência infinita que, ao longo dos anos, acaba por se entregar à inércia e à falta de esperança. É uma história triste, é como se ele perdesse a capacidade de lidar com o mundo e com ele próprio”.

 “Um Plano de Labirinto” vai estar em cena no Teatro Carlos Alberto, no Porto, de 09 a 19 de janeiro. O público pode assistir às sessões às 19h00, nas quartas-feiras e sábados, às 21h00, nas quintas e sextas-feiras, e às 16h00, nos domingos. A peça tem a duração de uma hora e 20 minutos e no dia 17 está prevista uma conversa pós-espetáculo. O elenco é constituído por João Lagarto, Sara Ribeiro e Paulo Mota e os bilhetes têm um preço de 10 euros.

“Um Plano do Labirinto” conta com o texto de Francisco Luís Parreira e é uma produção coprodução da Companhia João Garcia Miguel, São Luiz Teatro Municipal, Teatro Ibérico, Sanpapié, TNSJ.

Artigo editado por Filipa Silva