Estudo de véspera com noitadas e diretas, muita cafeína e pouca água, falta de exercício físico, constantes snacks ou muitas horas sentados em frente a uma secretária. Estes são alguns comportamentos negativos, comuns entre estudantes do ensino superior, uma vez chegada a época de avaliação por exame. Mas, afinal, o que se deve ou não fazer? O JPN falou com dois especialistas para perceber quais os comportamentos a evitar.

A planificação do estudo é um elemento fulcral para o bom desempenho. Todavia, quando a data de exame se aproxima e o tempo para estudar aperta, esquecem-se alguns conselhos importantes. Para Célia Oliveira, professora na Faculdade de Psicologia, Educação e Desporto da Universidade Lusófona do Porto e responsável pela Linha de Investigação em Aprendizagem, as estratégias de estudo mais populares entre muitos estudantes nem sempre são as mais eficazes.

Segundo a investigadora, a evidência científica aponta para uma realidade em que os estudantes tendem a optar por técnicas de aprendizagem passivas. Ou seja, técnicas como ler ou sublinhar o texto. É certo que depois de ler a matéria repetidas vezes se vai adquirindo algum conhecimento. Porém, como sublinha a mesma fonte, esta estratégia causa uma “falsa perceção do conhecimento, porque há a sensação de familiaridade com a informação lida”, o que “promove um tipo de aprendizagem muito superficial”.

Estudo de véspera não resulta

Nesse sentido, há um contraponto entre o papel da memória na aprendizagem e a ideia de decorar por repetição. Quer isso dizer que se o estudo for prolongado no tempo, os resultados vão ser mais frutíferos e duradouros. “É necessário um período de tempo para que haja consolidação da informação” e se o estudo for feito de uma “forma concentrada” “não vai permitir uma aprendizagem profunda e sólida da informação”, refere a investigadora.

Tome-se o exemplo dado por Célia Oliveira: imagine-se que um estudante dedica 10 horas ao estudo num único dia. Se essas 10 horas forem, antes, distribuídas por uma semana, a apreensão da informação vai ser melhor e mais prolongada no tempo. Portanto, o estudo de véspera não resulta e é uma técnica de estudo mais sujeita ao esquecimento e às conhecidas “brancas”.

Quais as alternativas? Célia Oliveira aponta para a adoção de “estratégias que se baseiam num processamento ativo da informação”. “Ou seja, estratégias que nos põem a pensar em tudo o que estamos a estudar”, explica.

Para a investigadora, funcionam estratégias como as de elaboração, ou seja, “estudar a matéria de uma forma refletida”. Nesse contexto, há que “pensar sobre o que se estuda, atribuir significado, pensar em exemplos concretos da aplicação daquela informação e estabelecer o máximo de relação possível entre os vários conteúdos daquela matéria”, exemplifica. Este exercício vai criar, na memória, pistas a partir das quais o estudante vai conseguir recuperar a informação a elas associadas.

Muitos dos métodos de estudo são focados na repetição ao invés da compreensão.

Não dramatizar

Dormir é um elemento essencial na consolidação da aprendizagem. Assim, as diretas (noites sem dormir) ou noitadas de estudo são um comportamento a evitar. Contudo, é frequente que haja uma maior ansiedade em alturas de avaliação. O que fazer? “Desdramatizar”.

Dominar a matéria ajuda os estudantes a ter confiança e, por isso, menos stresse pré-exames, o que melhora a qualidade do descanso e do sono.

“Às vezes, quando não conseguimos dormir, o nosso pensamento é o de ‘tenho que dormir’ e isso só aumenta a ansiedade, sendo meio caminho andado para não dormir. É preciso relaxar nessas alturas”, remata.

Não ao sedentarismo

De um lado, a imensa pressão a que são submetidos faz com que os estudantes passem horas a fio a estudar. De outro lado, uma rotina constituída por hábitos saudáveis que não se deve descurar.

Para Nuno Borges, professor associado na Faculdade de Ciências da Nutrição e da Alimentação da Universidade do Porto (FCNAUP), a gestão do tempo é crucial.

Além dos fatores mais gritantes na alimentação que mexem diretamente com o bom desempenho do intelecto, o investigador sublinha que “uma alimentação boa para a época de exames é uma alimentação boa para o resto do ano e a roda dos alimentos ainda é um bom guia alimentar”.

Os benefícios da prática da atividade física é consensual para os dois especialistas: “ajuda a melhorar o descanso”, segundo Célia Oliveira, e “facilita e melhora a disposição e, por isso, permite que o cérebro funcione no seu máximo”, segundo Nuno Borges.

A prática desportiva gera consenso relativo à sua importância na qualidade do descanso.

A ingestão de água mostra-se como um elemento primordial no desempenho máximo das capacidades cognitivas. Segundo Nuno Borges, apesar de o nível de hidratação ser variável de pessoa para pessoa, certo é que se houver um défice de ingestão de água no ser humano a sua capacidade de assimilação e compreensão de informação vai diminuir.

Deste modo, como saber se está a consumir a quantidade de água necessária? A urina, o seu cheiro e cor são as respostas. “Se a urina estiver clarinha e sem cheiros, significa que a hidratação é adequada. Se estiver mais escura, é sinal que a hidratação é deficiente e, portanto, deve ser corrigida”, exemplifica.

Café, sim. Em excesso, não

A evidência científica mostra que a cafeína tem uma função estimulante no sistema nervoso central. Significa isso que aumenta a capacidade de concentração. Porém, como diz o ditado “tudo o que é demais, é moléstia”.

A partir do momento em que o consumo de cafeína (seja em café, chá ou bebidas energéticas) afeta a qualidade do sono e do descanso passa a ser prejudicial. O conselho do especialista é que, com salvaguardas individuais, esta substância seja consumida no período da manhã e que, a partir de certa altura, o consumo acabe de forma a conseguir descansar.

O café é o único estimulante de concentração comprovado pela investigação científica.

Por fim, alimentos que, à primeira vista, parecem estimular o cérebro a ter um melhor desempenho, ricos em gorduras, sal e açúcares – comummente chamados de fast food – são desaconselhados. “Refeições muito pesadas, com muita gordura e que ficam muito tempo no estômago têm o efeito negativo imediato de aumentar a sonolência”, explica.

Não aos estimulantes para a memória e concentração

Muitas vezes, os estudantes acabam por recorrer a estimulantes e auxiliares de memória e concentração de natureza medicamentosa. Para o investigador este “é um mercado fértil” do qual muitas empresas se aproveitam para obter rendimento.

Porém, não há dados científicos robustos capazes de comprovar que esses estimulantes ajudam ou melhoram o desempenho escolar.

“Não podemos ter a postura de que ‘se não faz mal, ao menos tenta’, não é responsável. Responsável é dizer que não há nenhuma evidência suficientemente robusta e, portanto, não se aconselha”, remata o investigador. O único estimulante de concentração comprovado é o café, excetuando quando, em excesso, prejudica a qualidade do sono, salienta ainda o investigador.

Artigo editado por Filipa Silva