Talvez a parte mais difícil de viajar, seja escolher o destino. Natureza ou museus? Sol ou neve? Planear ou não planear? Pesquisar no Google quais as melhores cidades para visitar, quem nunca? Rui Gaiola nunca. O fotógrafo de 32 anos partilhou, na passada quinta-feira (13), a sua maneira peculiar de viajar, na 126ª “Viagem ao Mundo (sem sair do sofá)”, na galeria-bar Espiga, no Porto.

Durante a conversa, Rui Gaiola explica que apenas compra os bilhetes de avião e aluga um carro; não escolhe os mais pequenos mas sim os médio-grandes – apesar de costumar viajar sozinho – para poder ter sempre o equipamento montado e não perder tempo quando vir algo que tenha de fotografar. “O que eu preciso é de liberdade; o carro dá-me a liberdade para eu poder ir onde quero” partilha o fotógrafo português com o JPN.

Viaja com o GPS em modo satélite pois é assim que descobre sítios “incríveis e desconhecidos”. E não marca dormidas em lado nenhum. Gosta de ver as coisas com calma e de ter a possibilidade de, se encontrar um lugar que goste, poder lá passar mais do que umas horas a fotografar, chegando até a marcar dormidas “à porta” dos alojamentos, mesmo antes de entrar.

O único planeamento prévio que faz é um roteiro pelos sítios que quer fotografar. Curiosidade: não é nada que se pareça a um roteiro de dois dias pelo Pico, nos Açores, onde se podem admirar as paisagens em conjunto com toda uma multidão turística e provar os pratos típicos. É, antes, fazer um mapa no Google Maps (em modo satélite, mais uma vez) de sítios que pareçam interessantes e com potencial para fotografar, preferencialmente longe de pessoas. Muito mais trabalhoso do que copiar roteiros da Internet e ficar a conhecer o que já é conhecido por outros.

Sobre a experiência gastronómica, que muita gente considera fundamental para uma viagem completa, Rui Gaiola dispensa-a e afirma que “comida boa é em Portugal”.

Os sítios que eu gosto, geralmente, não têm gente”, diz Rui Gaiola. Prefere montanhas, onde há “poucas habitações, portanto não há muita gente”. Apesar disso, prefere viajar acompanhado e esclarece que faz muitas viagens sozinho pois “é difícil encontrar pessoas que tenham a mesma disponibilidade e que gostem do mesmo tipo de destinos”. O fotógrafo opta por montanhas, (quase) nenhum sol, natureza e muita liberdade.

Rui Gaiola acredita, por isso, que “o ser humano não sabe viver em comunidade” e estar no meio do nada, não se sujeitando à maneira que as outras pessoas gostam de viajar, é algo que apenas acontece se estiver sozinho.

O início do gosto pela fotografia

Formado em Design Gráfico, descobriu durante o estágio que não queria passar o dia sentado em frente a um computador, sem horas para entrar mas também sem horas para sair. A fotografia surge num contexto de busca por realização pessoal. “Gosto de coisas visuais”, conta Rui Gaiola. A fotografia “é daquelas coisas que tu vais percebendo que tens gosto e vais explorando”, acrescenta.

Com dois filhos, o fotógrafo não se dedica apenas à fotografia de viagens e trabalha também na Golden Days Wedding Photography – empresa dedicada à fotografia de casamentos -, apesar de fotografar pessoas e sítios ser muito diferente. Rui Gaiola admite conseguir conciliar o trabalho com as viagens e a família, com alguma gestão. “Adoro fotografar casamentos tanto quanto de fotografar viagens e natureza”, sustenta.

No entanto, a natureza é um dos elementos chave do tipo de fotografia que pratica. “Mesmo na fotografia de casamentos eu tenho muita natureza” partilha, “sempre que puder pôr terra, árvores, verde nas fotografias de casamento, eu ponho”.

O fotógrafo, natural do Sabugal (Guarda) e residente em Lisboa, cresceu entre duas serras – Serra da Estrela e Serra da Malcata – e admite que isso afeta o que gosta de fotografar. “Crescer ali influenciou aquilo que eu sou”, conta Rui Gaiola.

À altura da mudança para a capital, teve uma fase em que apenas queria fotografar cidades. Daí resultou a famosa fotogaleria do P3 “A melhor vista que Lisboa pode ter”, referente ao edifício panorâmico de Monsanto. Durante esta etapa no percurso fotográfico, Rui Gaiola visitou os Estados Unidos e trouxe de lá (sem intenção) as fotografias da exposição “NY SF LA” para Portugal, primeira vez que partilhou mais publicamente o seu trabalho.

No entanto, acabou por voltar às origens e a natureza apropriou-se das suas fotografias. Algumas fotografias que tirou da Serra da Estrela, uma das serras protagonistas da infância de Rui Gaiola, já apareceu na National Geographic Portugal. Também o sonho de ir aos Açores resultou num trabalho publicado.

Persistência é algo bem notável no fotógrafo. Durante a conversa, Rui Gaiola partilhou algumas histórias engraçadas sobre as fotografias que mostrou. Como quando quase ficou sem um drone porque precisava de uma fotografia do Corvo, nos Açores, semelhante à capa do documentário “É na Terra não é na Lua”, de Gonçalo Tocha; ou quando, depois de um trabalho em Viena, na Áustria, conduziu durante duas horas e meia para fotografar uma estrada que tinha visto desde o avião.

A junção das viagens à fotografia deu a Rui um bom tema para avançar e conseguir cumprir um dos seus objetivos: publicar um livro. “Eu adoro livros, portanto, sendo fotógrafo e adorando livros de fotografia, eu sempre quis fazer um livro de fotografia” confessa.

Quatro anos de viagens e fotografias, um ano de edição, 91 mil ficheiros (incluindo vídeo), cerca de 2.500 fotografias editadas e apenas 290 selecionadas para o livro são os ingredientes do livro a lançar pelo próprio: “I Wish I Could Drive These Roads Forever”. Apesar de o lançamento só ser no dia 20 deste mês, o fotógrafo tem vendido o livro online e o feedback “tem sido muito bom, melhor do que eu estava à espera, mas agora preciso dos lançamentos para perceber”, comenta.

Rui Gaiola deixa ainda uma nota para novos fotógrafos: “fotografem muito, porque a fotografia é um músculo e tem de ser treinado. Se não foi treinado, não conseguem”.

Artigo editado por Filipa Silva.