Tem sido uma década “interessante”, “enriquecedora” e de “aprendizagem permanente” para Jimmy P. Com um estilo de hip-hop melodioso e a quebrar barreiras, há muito que o rapper faz parte da cena musical portuguesa, seja no underground ou no mainstream.

O artista, cujo nome civil é Joel Plácido, celebra dez anos de carreira este sábado com um concerto no Coliseu que, diz, “encerrar um capítulo e começar outro”, e a festa só podia ser no Porto.

Isto tinha que acontecer no Porto, tendo em conta que eu vivo aqui e esta é a cidade que me acolheu quando vim para cá viver com 15 anos. Foi aqui que eu comecei a fazer música, foi aqui que as pessoas abraçaram a minha música primeiro e foi aqui que eu cresci como artista também. É o lugar onde tudo começou”, revela ao JPN.

O Porto é importante, mas não é a única cidade a ocupar um lugar especial no coração de Jimmy P. O rapper, de raízes angolanas, traz consigo também pedaços do Barreiro, em Lisboa, e de Paris. “Todos estes lugares estão presentes na música que eu faço porque todos têm uma importância grande na minha vida. O Barreiro, porque é o sítio onde eu nasci e onde cresci, e Paris porque foi o lugar onde eu passei toda a minha adolescência, foi lá que eu aprendi a ouvir música e que a descobri verdadeiramente”, explica. A música que faz é “eclética” e “vai sempre beber um bocado desses sítios todos”.

Para além do seu percurso geográfico, o puzzle que compõe Jimmy P é também montado com influências internacionais, como Lauryn Hill e The Fugees, e lusas, como Boss AC. “Para mim a maior referência no hip-hop em Portugal é e será sempre o Boss AC. Mas também ouço o Sam The Kid, o Valete, o Chullage. Não oiço só rap, oiço um pouco de tudo”, confessa. Artistas como Paulo Flores ou Grace Evora são também referências.

A evolução na carreira e o novo álbum

Se agora é encarado como um dos principais rostos da música portuguesa, a verdade é que o percurso de Jimmy P não foi imune a críticas. Em “A Benção” – música do álbum “Essência” de 2016 – o músico afirma-se “demasiado comercial para esses otários do rap, mas nunca o suficiente para alguns otários na rádio”, embora confirme que essa já não seja a realidade.

“Eu acho que isso corresponde a outra fase da minha carreira em que os desafios eram diferentes. Acho que agora consegui ocupar um espaço que me esforcei para construir e quando as pessoas ouvem uma música do Jimmy P já sabem o tipo de estética que eu posso trazer”, conta.

Pode dizer “sem problema nenhum” que a música que produz vai além das fronteiras do hip-hop porque “há pessoas que não pertencem a esse universo cultural” e ouvem essas músicas. “Sei que sou um artista que não precisa de passar na rádio para viver da música. Houve anos em que eu não tive um único single a passar na rádio, como de 2017 para 2018, e fiz a minha maior tour de sempre. Isso já não é uma questão atual, na verdade”, clarifica.

Com uma discografia já consistente, admite que tem um carinho especial pelo mais recente projeto. Lançado em janeiro, o mais álbum de Jimmy P, “Abensonhado”, inspirou-se em Mia Couto – criador da palavra e um dos escritores prediletos do rapper.

É um trabalho que eu me orgulho imenso de ter feito e é o mais sólido, porque é o mais musical e o mais eclético de todos. Tem um equilíbrio interessante entre a música digital e a música mais orgânica e acústica. Estive tantos anos à procura desse equilíbrio e acho que finalmente o encontrei”, afirma.

As bençãos que Jimmy P já recebeu ao longo da vida, diz, são um tema comum à música que produz. “Tenho uma família, ganho a vida a fazer aquilo que eu gosto, tenho tempo para dedicar a minha energia à música. Houve alturas em que eu percebi, de forma quase desesperada, que a felicidade não advém necessariamente da exposição e do sucesso”, observa.

O desafio do Festival da Canção e o que o futuro reserva

A faixa que dá nome ao álbum, “Abensonhado, é também a canção que Jimmy P vai levar ao Festival da Canção. A música, que vai ser apresentada na segunda semifinal do certame (29 de fevereiro), já estava feita antes do rapper receber o convite da RTP, que se mostrou reticente em aceitá-lo.

“Inicialmente nem queria participar porque achava que estava muito fora da minha zona de conforto e não me queria expor dessa forma, mas depois também achei que era uma boa oportunidade de levar este género onde por natureza não há muitos artistas a fazer rap e muito mais a fazer música neste formato, porque não é o formato clássico de canção, não é um A, um B e um refrão, é o rap do início ao fim sem um refrão”, explica.

“Eles acharam boa ideia, até porque era disruptiva em relação àquilo que é o ADN do Festival, e achamos que era uma boa oportunidade para abrir um precedente para o futuro”, remata.

No reportório conta já com colaborações com artistas como Carolina Deslandes, Fernando Daniel ou Diogo Piçarra. Contudo, há ainda alguns nomes por riscar na lista de artistas com quem Jimmy P gostaria de vir a colaborar. “Cá em Portugal, acho que já colaborei com quase todos os artistas com quem gostava. Se calhar os que faltam são o Rui Veloso, a Sara Tavares, a Ana Moura e a Gisela João. Acho que o que tem piada é trazê-los mais para o meu universo, se convidasse uma Ana Moura não ia compor um fado, ia produzir algo que tivesse a ver comigo e depois convidá-la a trazer um bocado do seu fado à minha música”, revela.

Uma década de sucessos já passou, mas o que é que ainda falta fazer? “O que eu tenho em mente é tentar fazer as pessoas ouvir a minha música, fazê-las vibrar numa frequência que eu habitualmente não consigo, tocar no íntimo delas de uma forma de que ainda não consegui fazer”, elucida.

“Gostava de fazer mais música com mais gente envolvida, fazer temas com coros de gospel, ter a presença de um quarteto de cordas ou mesmo uma orquestra, para tornar as músicas mais grandiosas. Quero acrescentar mais camadas porque hoje em dia a música é super imediata e eu gostava que a primeira audição fosse para agarrar as pessoas e que numa segunda ou terceira fosse para se apanhar pequenos pormenores que não tenham percebido logo. Gostava de fazer alguns concertos temáticos para poder envolver essas partes”, conclui.

O concerto no Coliseu do Porto tem hora marcada para as 21h30 e os bilhetes estão quase esgotados. O preço dos bilhetes ainda disponíveis varia entre os 15 e os 22 euros. Entre os artistas convidados confirmados estão Carolina Deslandes, Djodje, Fernando Daniel, Nelson Freitas, Wet Bed Gang + participação especial de GSon.

Artigo editado por Filipa Silva.