No início do ano letivo corrente, Portugal recebeu um total de 5.477 novos estudantes internacionais de grau no ensino superior, um aumento de 38% em comparação com o ano anterior. Este crescimento na procura dos estudantes por instituições de ensino portuguesas pode ser o resultado de uma aposta feita na internacionalização do ensino superior. Mas será que as necessidades deste grande fluxo de estudantes estrangeiros estão a ser atendidas pelas universidades e politécnicos?

Segundo o Ministério da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior (MCTES), a maioria dos novos estudantes de grau em Portugal é proveniente de países cuja língua primária é o português. Entre eles, 52% são brasileiros (2.838) e apenas 173 (aproximadamente 3%) são de países cuja língua nativa não é o português (América do Norte, Resto da Europa ou Ásia).

Em declarações ao JPN, o presidente do Sindicato Nacional do Ensino Superior (SNESUP), Gonçalo Velho, diz que este aumento está fortemente ligado a uma “política de internacionalização das instituições de ensino superior portuguesas” e da participação de investigadores e professores em vários projetos de cooperação internacional.

Já a vice-reitora da Universidade do Porto (UP), Maria de Lurdes Correia Fernandes, explica que a internacionalização e a interculturalidade trazida pelos alunos estrangeiros “enriquecem” o percurso académico dos portugueses e promovem o “desenvolvimento pessoal”.

O número de estudantes internacionais matriculados no país (incluindo os de mobilidade) chegou aos 58.092 no ano passado, um aumento de quase dez mil alunos quando comparado com o ano letivo anterior.

A Universidade do Porto (UP) é a segunda instituição do país que mais alunos estrangeiros acolhe no total e a primeira na receção de Estudantes com Estatuto de Estudante Internacional. No total, acolheu este ano 595 estudantes estrangeiros de grau. Boas notícias? Aparentemente, sim, mas há também quem – entre alunos e professores da universidade – demonstre receio com este crescimento.

Cristina Ferreira, professora de Design e Comunicação Visual na licenciatura em Ciências da Comunicação da Faculdade de Letras da UP (FLUP), divide-se entre duas salas em simultâneo devido à falta de infraestruturas capazes de incluir todos os inscritos da cadeira numa única sala. A professora partilha a Unidade Curricular (UC) com outra docente e juntas ensinam 158 alunos que foram divididos em quatro turmas.

“Está a ser muito complicado. As turmas nos outros anos eram cinco e agora são quatro. Houve um acréscimo muito grande de 40 alunos, o que equivale a outra turma e as salas não estão preparadas para conter tantos estudantes, nem há docentes suficientes”, refere Cristina Ferreira.

A professora diz já ter exposto a questão ao diretor daquele ciclo de estudos que afirma já estarem a ser tomadas medidas para que a situação não se repita em anos letivos vindouros. “Fico contente pela disciplina ter tanto sucesso, mas de facto precisamos ter uma infraestrutura para dar dignidade aos estudantes”, reforça. Dos 158 alunos inscritos naquela UC, 19 são internacionais de grau e outros 24 são de mobilidade, representando 27% do total. Dos alunos do programa Erasmus, grande parte são de países de língua estrangeira e não falam português.

“Os professores são amigáveis e explicam o que precisamos saber em inglês, mas as aulas são na maioria em português. Nós temos que aprender muita coisa sozinhos e em casa. Às vezes, nem vamos às aulas” explicam Egija Lulena e Elina Krukle, naturais da Letónia. Para as estudantes de mobilidade da Universidade do Porto, as aulas são um desafio uma vez que não falam a língua local. “Não sabemos porque é que não há grupos de estudantes Erasmus com palestras em inglês”, questiona Elina Krukle.

,Caio Ferreira é brasileiro e estuda Ciências do Desporto na Faculdade de Desporto da UP (FADEUP). Apesar de não ter passado por nenhuma dificuldade de idioma, acredita que os docentes não estão preparados para o aumento de alunos de língua estrangeira. “Os professores ou falam muito mal ou não falam nada de inglês. Os estrangeiros ficam dependentes dos portugueses ou brasileiros que falem a língua”, explica.

Stela Kubiaki também vem do Brasil e estuda na Faculdade de Belas Artes da UP. A aluna apercebeu-se de um problema similar na faculdade onde estuda. “Em muitas disciplinas que faço, do plano consta que vão falar em português e inglês, mas passam a aula inteira em português e tiram as dúvidas em inglês. Acho que acaba por ser muito prejudicial para quem não fala a língua.”

Já a vice-reitora da UP lembra que as faculdades têm uma “larga oferta de cursos de português” e que “um estudante que vai para um país estrangeiro tem a obrigação de dominar a língua”. Segundo a própria, não podem “obrigar os estudantes portugueses a dominarem uma língua estrangeira”, reforça.

O fluxo de estudantes estrangeiros em Portugal tem aumentado significativamente nos últimos anos, principalmente dos que chegam do Brasil. Atualmente, no total, são aproximadamente 35 mil os estudantes internacionais de grau inscritos no país e representam 11% dos alunos do ensino superior em Portugal.

Artigo editado por Filipa Silva.