Esta terça-feira, 24 de março, celebra-se o Dia Nacional do Estudante. Numa altura em que devido à pandemia de COVID-19 a educação está limitada às paredes das habitações, o ensino a distância é a única opção. O JPN conversou com o diretor do Departamento de Educação e Ensino a Distância da Universidade Aberta, António Teixeira, sobre a importância do e-learning atualmente

O ensino a distância não é uma vertente recente. Nas décadas a seguir à II Grande Guerra começaram a surgir as primeiras universidades à distância: Open University, no Reino Unido (1969), Universidad Nacional de Educación a Distancia, em Espanha (1972) e FernUniversität Hagen, na Alemanha (1974). 

Em Portugal, a única instituição de ensino superior público a distância é a Universidade Aberta (UAb), fundada em 1988. Com licenciaturas, mestrados, doutoramentos e pós-graduações, os alunos da UAb podem escolher os próprios horários e os métodos de estudo. Os professores fornecem livros, vídeos e áudios para os alunos consultarem e, pontualmente, são abertos fóruns para a comunicação entre os docentes e os estudantes. Ao longo dos semestres os fóruns de estudantes estão sempre disponíveis.

Apesar de ser única no país, a UAb tem parceria com várias instituições de ensino superior público, como é o caso da Universidade do Porto, da Universidade de Coimbra, Universidade de Aveiro, Universidade de Lisboa, entre outras. 

“As universidades quando pretendem desenvolver oferta pedagógica do ensino a distância, estabelecem consórcios com a UAb, no sentido de a UAb os apoiar também a desenvolver, do ponto de vista da formação dos docentes, dos estudantes, do ponto de vista tecnológico. É preciso alguma estrutura, implica uma metodologia especializada”, afirma António Teixeira, diretor do Departamento de Educação e Ensino a Distância da UAb.

O docente realça a flexibilidade – que diz ser uma das principais vantagens do ensino a distância -, pois  “permite que as pessoas não tenham que ir às aulas num determinado horário, permite que as pessoas vão aprendendo ao seu ritmo”. Este fator atrai quem, de outra forma, não teria facilidade em frequentar a universidade devido ao condicionamento de horários.

António teixeira destaca também o elevado grau de internacionalização que o ensino a distância potencia, afirmando ainda que a Uab tem muitos alunos estrangeiros. “Quando uma universidade funciona através da internet, isso facilita o facto de ter estudantes de todo o mundo”, acrescenta. 

Em Portugal, ainda não existem assim tantos alunos que tenham como preferência o e-learning. O Governo Português pretende que, até ao fim da década, 60 mil alunos estejam inscritos no ensino a distância. “Em Espanha por exemplo, são centenas de milhares de alunos. Aqui em Portugal a adesão não tem sido tão grande”, explica António Teixeira.

Quanto às desvantagens deste tipo de educação, refere que se prendem, sobretudo, com a distância e que é necessária uma adaptação cuidada. Contudo, a evolução dos meios de comunicação atenua esses constrangimentos

Para António Teixeira, a planificação da aprendizagem é extremamente importante, tendo em conta as ferramentas disponíveis.O ensino a distância normalmente pressupõe um conjunto de ferramentas que é utilizado de forma coerente, de acordo com uma determinada metodologia”, refere. A mesma fonte alerta ainda que “não se pode avaliar um estudante do ensino a distância da mesma maneira que se faz presencialmente. As instituições têm que garantir condições para que se possa fazer ensino a distância de qualidade”. 

O ensino a distância em tempos de pandemia

As escolas e as universidades portuguesas fecharam portas a 16 de março. Milhares de alunos e professores adaptam-se à nova realidade de ensinar e aprender a partir de casa. Nem sempre tem sido fácil e o modo presencial é mesmo o melhor, afirmam as professoras com quem o JPN conversou.

As formas de comunicação entre os professores e os alunos variam de Norte a Sul do país e de instituição para instituição: alguns fazem apenas uso do e-mail, outros usam de plataformas como o Moodle, Teams, Zoom, Blackboard, Discord e até o OneNote, pertencentes ao Office 365. Por outro lado, quando falamos de crianças mais pequenas, o contacto é feito diretamente entre o docente e o encarregado de educação, que posteriormente transmite as informações ao aluno. 

Liliana Gonçalves, professora num colégio na Maia, disponibiliza vídeos, documentos e até exercícios para os alunos estarem a par da matéria. Todos os dias, os estudantes têm que cumprir o guião da aula, feito pela docente, e enviar fotografias que comprovem a realização da tarefa. “Eu vou marcando, de vez em quando, um horário com a turma para conversarmos, para eles tiraram dúvidas. Também dou a possibilidade de fazermos uma chamada individual para os alunos com mais dificuldades ou que não estão a perceber a matéria. Eles podem pedir-me e eu ligo só para um”, acrescenta.

A professora de 38 anos, que leciona Matemática A, admite que pelo meio online a informação não é transmitida tão bem como presencialmente. “Falta ali o contacto direto com os miúdos. Eu envio vídeos que explicam a matéria e também por escrito, mas eles têm que interpretar sozinhos, não dá para fazer aquela análise de grupo. Não há aquele feedback no momento, que muitas vezes ajuda ao desenrolar a aula”, explica.

Beatriz Ferreira é professora há 26 anos, mas só agora é que teve que se adaptar a este estilo de aulas. Apesar de não ter muitas dificuldades a trabalhar com as plataformas online, defende que “a obrigação” a faz “desenrascar“. “Mas, se calhar, já devíamos ter desenvolvido mais essas competências”.

Atualmente, o modo de comunicação com os alunos de 5.º e 6.º anos é feito só através de e-mail – o que por vezes se torna um constrangimento. “Os meninos ou os encarregados de educação não têm acesso à internet, não têm mail, não estão muito habituados a trabalhar com mail e têm dificuldades em enviarem os trabalhos”, explica a docente de 50 anos. Contudo, este pode também ser um fator positivo na medida em que ganham competências a nível tecnológico, acrescenta.

Os métodos variam consoante os níveis de ensino (primário, básico e secundário). Enquanto que Laura Barroso, estudante do 12.º ano, em Viseu, não tem aulas a partir de casa, Tomás Cruz, finalista do ensino secundário em Famalicão, tem aulas virtuais desde 16 de março. Laura Barroso, de 17 anos, explica que não tem aulas porque toda a matéria já foi lecionada, apenas recebeu uma ficha facultativa de exercícios da disciplina de português.

Apesar de Tomás Cruz preferir ter aulas presenciais na escola, a experiência online não tem sido tão má quanto o estudante estava à espera, avança. Contudo, como a plataforma de preferência é utilizada ao mesmo tempo pela turma toda, torna-se mais difícil tirar dúvidas com a professora porque não há tempo, explica o rapaz de 17 anos.

O irmão de Tomás, Martim Cruz, é dois anos mais novo e frequenta o 10.º ano. Para já, o maior desafio tem sido enfrentar as saudades que sente dos professores. Para o adolescente, aprender a matéria de forma presencial é mais eficaz do que interiorizar os conteúdos em casa. “Eu acho que os professores explicam muito melhor do que as apresentações nos computadores”, justifica.

É através de tarefas propostas e trabalhos de casa, que são posteriormente submetidos na plataforma Moodle, que o adolescente tem estudado. Martim Cruz, prefere receber esses trabalhos e depois enviá-los aos professores, do que ter aulas por videoconferência.

Laura Alves, de Monção, em Viana do Castelo, é também aluna do 10º ano e não vê qualquer vantagem em ter aulas através de casa. A jovem de 15 anos admite que a relação entre os alunos e os professores tem vindo a estreitar à medida que as aulas são lecionadas.

No ensino primário, são os encarregados de educação que recebem por email os exercícios que as crianças têm de fazer para se manterem no ritmo. Para além da Escola Virtual, o jogo da Tabuada do Dino é uma das indicações dadas dos professores.

Como não tem a professora por perto, quando Carolina Matias, de 8 anos, sente dificuldade nos exercícios que está a fazer tem que pedir ajuda à mãe. Quando a mãe não a pode ajudar, tem que fazer os trabalhos sozinha. Carolina não sente dificuldade em usar a Escola Virtual porque já estava habituada a consultar a plataforma na escola.

Também o ensino superior foi fortemente abalado pelas consequências da COVID-19. António Teixeira, docente da UAb e ex-presidente da EDEN – European Distance and E-Learning Network, acredita que as universidades não estavam prontas para a realidade atual. “Isto não se está a passar só em Portugal, é em todo Mundo. De um momento para o outro, todas as universidades de vários países sentiram a necessidade de muito rapidamente se adaptarem a uma metodologia para qual a maioria não estava preparada. Isso tem levado a que se façam algumas experiências e, talvez a maioria não tenha qualidade”

Maria Almeida é estudante de Sociologia, na Faculdade de Letras da Universidade do Porto (FLUP), e até agora diz que ter aulas em casa tem sido mais negativo do que positivo. “Ter aulas em casa implica um maior esforço e concentração da nossa parte, já que em casa é muito mais fácil nos distrairmos”, explica.

Neste momento, a estudante de 20 anos tem participado em videoconferências para todas as aulas através da Zoom, o que, algumas vezes, também constitui um constrangimento. “A plataforma que os professores usam só dá até 40 minutos seguidos, ou seja, ao fim desse tempo desliga e temos que esperar um pouco para voltar a ter aula, o que quebra um bocadinho o ritmo”.

Maria Almeida sente também dificuldades da parte dos professores e refere que “eles ainda estão numa fase de adaptação, não estão 100% familiarizados com as plataformas de videoconferências, e, claro, há coisas que correm pior. Por exemplo, às vezes não aceitam os alunos todos de uma vez, tentam mostrar powerpoints e não conseguem”, exemplifica.

António Teixeira, da UAb, acredita que quando a pandemia da COVID-19 terminar o número de interessados no ensino a distância vai aumentar.

António Teixeira sublinha que o ensino a distância acarreta várias vantagens. “Por exemplo, nós não temos o contacto imediato com a pessoa, mas por outro lado, num ambiente online a presença é muito mais forte. Como não nos estamos a ver, a forma como falamos, a intimidade que se gera, o tipo de impacto que tem a nossa comunicação aumenta. Tudo é mais intenso”. O professor termina a acrescentar que certos tipos de aprendizagem até resultam melhor no ambiente online, do que num ambiente presencial. 

Artigo editado por Filipa Silva.

Artigo corrigido às 11h23 de 20 de abril de 2020. Ao contrário do que se mencionava no texto, o professor António Teixeira não é Pró-Reitor para a Inovação e Ensino a Distância da Universidade Aberta, cargo que já ocupou no passado. Atualmente, o docente é diretor do Departamento de Educação e Ensino a Distância da instituição. Pelo lapso, apresentamos as nossas desculpas.