A ideia é simples: “pôr o mundo inteiro a ler sempre que haja mundo, leitores e o que ler”. Esta é a missão que a Livraria Lello assumiu, que leva a cabo a partir da próxima quarta-feira, 1 de abril, abrindo aquele que diz ser “o primeiro ‘drive thru’ livreiro do mundo”. Diariamente, a livraria oferecerá um título por pessoa, que será escolhido e anunciado antecipadamente nas redes sociais.

Em comunicado para a imprensa, a direção informa que, apesar de estar de portas fechadas (pela primeira vez em 114 anos), tal como outros espaços culturais da cidade, devido à pandemia de COVID-19, a livraria retoma serviço parcial para tratar “os livros como bens de primeira necessidade”. Assim, a Lello torna-se a primeira livraria no mundo a criar um serviço semelhante, que permite à população aceder a literatura em formato físico.

De segunda a sexta-feira, entre as 10h00 e as 12h00, estará aberto o “drive thru”, posto de recolha dos livros sem que seja necessário sair de um automóvel. Os livros, em “tempos de crise”, serão oferecidos.

Obras essas integrantes da “The Collection”, coleção de clássicos da literatura editada pela Lello em edições especiais de capa dura. Entre os títulos encontram-se livros como “O Principezinho”, de Antoine de Saint-Exupéry, “Amor de Perdição”, de Camilo Castelo Branco ou “Os Maias”, de Eça de Queirós. Os títulos a ser oferecidos são vários e serão anunciados diariamente através das redes sociais da livraria.

O primeiro livro a ser oferecido, já esta quarta-feira, será “A Mensagem”, de Fernando Pessoa. “Achamos que fazia sentido, por toda a simbologia, por falar de um povo que resiste“, revela ao JPN fonte da Livraria Lello.

O postigo literário inicia funções a partir desta semana e “não tem data de término prevista”, esclarece a mesma fonte. São “pelo menos 30 títulos” os que estão incluídos na coleção para poder dar um livro diferente todos os dias úteis. Depois, a equipa vai equacionar repetir as obras, dependendo da duração da iniciativa.

Os interessados em recolher um livro terão, no entanto, de fazer uma inscrição prévia. No dia anterior àquele em que pretende deslocar-se ao postigo, até às 18h, a inscrição deve ser feita através de email ([email protected]), com indicação dos dados pessoais (nome, morada, email e contacto telefónico).

Todos os dias será dado “um livro por pessoa”, não havendo limite de stock por dia. “Durante duas horas daremos livros se vierem pessoas. Pensamos que vai ser tudo muito calmo”, dadas as circunstâncias. “Por isso certamente teremos livros para toda a gente”.

A entrega dos livros será realizada sem que o leitor necessite de sair do seu automóvel, “em modelo excecional”. Um colaborador da Lello, “que cumprirá todas as normas de segurança e higiene”, fará a entrega dos livros diretamente na janela dos carros, que param em frente à porta da livraria. A mesma fonte explica ao JPN que os colaboradores destacados “estarão na porta, assim como os livros, entregues protegidos dentro de um saco”.

Caso a situação atual se altere e seja necessário tomar medidas mais drásticas, a Lello poderá adaptar a iniciativa a outros formatos. “Ainda é prematuro. Para já estamos a seguir as normas do Governo e da DGS”, acrescenta.

Os livros como “bens essenciais”

A iniciativa da Livraria Lello surge depois de a ministra da Cultura, Graça Fonseca, ter afirmado na última semana que as livrarias poderiam continuar abertas ao público durante o estado de emergência. Tal pode acontecer desde que impeçam o acesso dos clientes ao seu interior e façam as vendas à porta, através de postigo ou de entrega em casa, como acontece com outros serviços.

Considerando os livros um “forte contributo para a sanidade mental de todos nós“, a Lello atua de acordo com o decreto de execução do estado de emergência em Portugal. A literatura assume, assim, “um papel insubstituível neste período difícil em que vivemos”, com a livraria a reforçar que este é “um verdadeiro ato de ‘Amor nos Tempos da Cólera’ da Livraria Lello e da sua equipa para com os seus leitores, a sua cidade, que são o seu mundo”.

“No fundo o que queremos é dar o nosso pequeno contributo para melhorar um pouco a vida dos portuenses nesta quarentena”, acrescenta a mesma fonte ao JPN. “Queremos ajudar a comunidade com o que temos, que são livros“, finaliza.

As dificuldades no setor livreiro

Face à pandemia e à posterior imposição do estado de emergência, o novo coronavírus tem vindo a afetar a cultura um pouco por todo o mundo, com o encerramento de espaços e atividades. No caso do setor livreiro, vários negócios mais pequenos encerraram ao público e suspenderam mesmo os seus serviços.

Outras, no entanto, voltaram a sua atividade para o “online” e para as entregas ao domicílio. Além das pequenas livrarias independentes, também grandes cadeias de vendas encerraram parte das suas lojas, mantendo apenas alguns serviços em funcionamento, e focaram-se nas vendas pela Internet – o caso da FNAC e da Bertrand, em Portugal.

As editoras portuguesas, na sua maioria, suspenderam o lançamento de novidades e apostam na promoção de títulos anteriormente editados. As promoções são o maior incentivo à compra por encomenda, com o pretexto de ocupar o tempo e aumentar a cultura durante a fase de isolamento.

Esta seria uma época de grandes lançamentos literários, muito em função da Feira do Livro de Lisboa, o maior evento literário no país, que foi adiada de maio para o início de setembro. A Feira do Livro do Porto, que normalmente decorre em setembro, continua para já sem planos alterados.

Artigo editado por Filipa Silva.