A pandemia da COVID-19 afetou vários setores em Portugal, as associações de auxílio animal não foram exceção. No Porto, as duas associações com as quais o JPN esteve à conversa, pararam as adoções há mais de um mês, como medida preventiva. Subsequentemente, não estão aptas a receber mais animais encontrados na rua. O panorama não varia muito nas duas: os donativos baixaram e o trabalho voluntário é essencial. Contudo, os dados da GNR – Guarda Nacional Republicana – do mês de março não dão conta de um aumento do abandono animal.

Na CãoViver, o impacto da pandemia da COVID-19 tem sido “bastante negativo”, afirma ao JPN a presidente e fundadora da associação, Ana Ceriz. “A nível monetário, as pessoas não estão focadas neste momento em ajudar as associações porque também não sabem como é que vai ser a vida delas e, por isso, os donativos caíram bastante”, explica. O abrigo de animais, situado na zona da Maia, está dependente de doações particulares, uma vez que não é apoiado pelo Estado.

A maioria das associações necessita de apoio de voluntários para conseguir cuidar dos animais e do espaço. Na CãoViver o número de voluntários não foi afetado pela COVID-19, mas foi necessário adaptar os esforços, elucida a proprietária. “Nós temos um grupo já bastante coeso, com cerca de 37 pessoas. O que acontece neste momento é que o que nós fazíamos com duas pessoas ou três [pessoas] diariamente passou a ser feito apenas por uma pessoa, para não haver contacto entre nós. Desta forma também passamos menos tempo com os animais, são dados menos passeios”, justifica.

Por outro lado, a associação não está, de momento, a aceitar novos voluntários porque não é possível realizar as habituais sessões de esclarecimento, essenciais para permitir que novos membros entrem para a equipa.

A associação está, agora, a abrir de forma gradual os serviços, tendo em conta o possível levantamento do estado de emergência em Portugal, explica a presidente da CãoViver. Mas, as adoções pararam há mais de um mês. “Nós temos mesmo que ir à casa das pessoas para dar conclusão ao processo de adoção. As pessoas andavam-nos a contactar e nós até podíamos fazer uma videochamada para mostrar o animal em questão que elas estivessem mais interessadas, mas depois não conseguíamos dar seguimento [ao processo]. Ou seja, o animal ficava em processo de adoção, mas nunca mais conseguíamos pô-lo na casa das pessoas que o queriam adotar”, esclarece Ana Ceriz.

A CãoViver tem ao seu cargo 65 patudos, que esgotam a capacidade máximo de acolhimento. A associação de proteção animal funciona com um sistema de rotatividade, ou seja, existe uma “lista de espera” e quando um animal é adotado outro ocupa o seu lugar no abrigo, informa Ana Ceriz. “O problema neste momento é que não há essa rotatividade, ou seja, estamos com os animais, de certa forma, estagnados. Durante este mês e meio conseguimos resgatar alguns animais, mas o trabalho que nós tínhamos vindo a desenvolver teve que ficar de alguma forma mais parado porque não temos capacidade de rotatividade. Não conseguimos adoções, logo não conseguimos receber novos animais”, acrescenta.

Também a Vivanimal o número de adoções estagnou. A associação de defesa dos direitos dos animais, com instalações em Gondomar, só permite adotar através de marcação prévia, explica Célia Smith, membro da direção da Vivanimal. “Primeiro têm que fazer uma marcação para irem à associação e depois têm que manter a distância de segurança e usar luvas”, sendo que as pessoas que vão visitar o abrigo não podem entrar em contacto direto com o animal, elucida.

Célia Smith alerta ainda para o perigo constante das adoções irresponsáveis. “Neste momento as adoções dispararam porque as pessoas estão agora em casa e querem um animal, mas não têm a mínima ideia de, quando forem trabalhar, o que é que vai acontecer ao animal”, justifica. Como medida preventiva, as pessoas que tenham a intenção de adotar um animal devem responder a uma série de perguntas colocadas pela responsável da organização, que depois determina se estão aptas a adotar.  

Atualmente a associação é composta por seis cães e mais de 20 gatos, mas a cada dia recebem mais chamadas com novos pedidos de acolhimento, explica Célia Smith. “As pessoas ligam sempre que encontram cães abandonados, gatos abandonados, gatas grávidas. Tem sido uma desgraça. Acontece sempre, mas acho que agora, neste período do vírus, as pessoas estão a abandonar cada vez mais animais porque não têm paciência para eles”, lamenta.

Já Ana Ceriz, da CãoViver, acredita que o aumento animal nos abrigos não tem sido significativo. “O que eu acho que aconteceu foi que antigamente as pessoas andavam mais na rua e viam os animais com mais facilidade na rua e tentavam ajudá-los. Neste momento, como nós associações também paramos essa parte de captura, esterilização e devolução, as ninhadas nasceram, e depois, como não há resgates, é possível que se vejam mais animais na rua. Mas, não me parece que seja por causa da COVID-19, não tenho essa noção”, justifica.

Segundo os dados da GNR, enviados à rádio Renascença, que dão conta do panorama do abandono animal até ao final do mês de março, não existia um aumento da taxa de abandono animal associado ao novo coronavírus, em Portugal. Ana Ceriz acredita que tal acontece por existir uma forte campanha de sensibilização feita pelas associações com o objetivo de informar a população de que os animais não são portadores nem transmissores do vírus.

As ajudas às associações

Na passada quinta-feira (23), a Plataforma Solidária Animal (PSA) distribuiu cerca de 35 toneladas de ração a 26 associações de animais em Portugal. A plataforma, que conseguiu ajudar mais de seis mil animais em risco, foi lançada pela Animalife – associação nacional sem fins lucrativos, com sede em Lisboa – com a finalidade de auxiliar os mais afetados pela pandemia da COVID-19.

Além de distribuir alimentos a associações de animais em dificuldades, a SPA procura voluntários que possam prestar auxílio a idosos, comprar e entregar bens alimentares, passear animais de estimação, alimentar colónias de animais, e ainda ser família de acolhimento temporário, entre outros. Atualmente, a Plataforma Solidária Animal já conta com mais de 135 voluntários, como consta no site da associação. As inscrições na Plataforma Solidária Animal podem ser feitas aqui.

Artigo editado por Filipa Silva.