Apesar da incerteza dos dias estranhos que vivemos, o FEST vai realizar-se e traz novidades. De 2 a 9 de agosto, serão exibidos mais de 230 filmes em três cidades portuguesas. Na cidade costeira de Espinho, que é o polo central do festival, as sessões vão decorrer no Auditório da Junta de Freguesia e no novo cinema drive-in instalado no parque de estacionamento da Nave Desportiva. Os filmes vão ser exibidos no mesmo período no Porto – as longas-metragens são apresentadas no Cinema Trindade ao passo que as curtas-metragens passam na Casa Comum da Reitoria da Universidade do Porto. Em Lisboa, o festival acontece de 6 a 12 de agosto, no Cinema Ideal.

Na altura em que a situação epidemiológica em Portugal parecia mais crítica, a hipótese de o festival não se concretizar era impossível de descartar. No entanto, a carta esteve pouco tempo em cima da mesa. Fernando Vasquez, diretor da programação cinematográfica do FEST, revelou, em conversa com o JPN, que nos meses mais preocupantes a decisão tomada foi esperar e ir acompanhando a situação, preparando, ao mesmo tempo, o festival na medida dos possíveis. A equipa rapidamente percebeu que o evento teria condições para acontecer, ainda que com algumas adaptações, e trabalhou sempre nesse sentido.

As alterações introduzidas no festival passam, essencialmente, por uma parte das atividades de indústria que, como seria de prever, tiveram de ser adiadas para 2021. É o caso do FEST – Training Ground, que contempla workshops, masterclasses e ateliês conduzidos por profissionais de renome da indústria cinematográfica, nos quais participam estudantes de cinema, profissionais da área e cineastas de todo o mundo. Também o Director’s Hub, uma plataforma concebida para expandir a rede de contactos, potenciar novas oportunidades e trocar conhecimentos, assim como outras atividades mais sociais, tiveram de ficar para o ano. No entanto, tudo o resto se mantém e, em certos casos, acaba até por ser “uma mais-valia para o festival”, acredita Fernando Vasquez. O Pitching Forum, por exemplo, que é uma competição de projetos de ideias para filmes que tem em vista a facilitação, o desenvolvimento e financiamento dos mesmos, vai ser realizada online e, assim sendo, foi possível chegar a produtores e investidores que, de outro modo, não participariam.

É também novidade a extensão do festival às duas maiores cidades do país. Vasquez conta que não é a primeira vez que se realizam exibições de filmes fora da cidade de Espinho: “Nós, na realidade, já fazíamos exibições de cinema ao longo do ano em várias cidades, tanto a nível nacional como europeu, e sempre quisemos fazer também durante a semana do evento”. Porém, devido à complexidade da organização e à necessidade de mais recursos, a ideia ficou guardada para o futuro. Este ano, com mais energia e disponibilidade, em parte porque várias atividades e plataformas foram adiadas para 2021, foi possível concretizar o objetivo. Esta extensão do festival ao Porto e a Lisboa conseguirá chegar, à partida, a mais gente e permitirá promover filmes de uma forma mais eficiente, assume o diretor de programação.

Longinquamente próximos

A programação da competição internacional do FEST rege-se, este ano, pelo tema As close as far away can be, num ano que será inevitavelmente lembrado pelo distanciamento social. As histórias de amor e de luta, de guerra e de descoberta, de libertação e de morte estarão presentes nas dez longas de cineastas emergentes que concorrem pelos Linces de Ouro – sete na categoria de ficção e três na de documentário.

Fernando Vasquez destaca quatro filmes a não perder. “Papicha”, da realizadora Mounia Meddour, uma das grandes obras francesas do momento, que nos mostra a Argélia no final da década de 90, uma altura em que o país assistiu à emergência acentuada de grupos islâmicos conservadores. O filme retrata um grupo de raparigas que tenta enfrentar as novas limitações impostas às mulheres através da organização de um desfile de moda.

“Jumbo” é também um filme francês, da realizadora Zoé Wittock, “extremamente arrojado, provocador, até certo ponto surreal”, considera Vasquez. Conta a história de uma jovem que se apaixona por um carrossel e explora, entre outros aspetos, o raciocínio psicológico por detrás desse amor e atração.

“Jumbo” de Zoé Wittock concorre na competição internacional. Foto: D.R.

“Babyteeth” é um filme australiano de comédia da realizadora Shannon Murphy, que acaba, também, por ser provocador, pois retrata a doença terminal de uma jovem adolescente, bem como a forma como a família tenta lidar com o fim inevitável. Destaca-se também “Pacificado”, um filme brasileiro do realizador Paxton Winters, um thriller passado numa favela do Rio de Janeiro no período pré-Jogos Olímpicos, isto é, uma altura em que o Brasil estava numa fase de transformação, sobre um homem que volta para casa após deixar a prisão e tenta reconstruir a sua vida com a filha no meio da insegurança da comunidade.

Ao nível das curtas-metragens, há quase 70 em competição. Cinquenta e sete concorrem aos Linces de Prata (competição internacional) nas categorias de Ficção, Documentário, Animação e Experimental, e 15 lutam pelo Grande Prémio Nacional (GPN). Fernando Vasquez destaca “As Cartas da Minha Mãe”, de António Sequeira, que venceu o GPN do ano passado, “Príncipe”, de João Monteiro, e ainda “Erva Daninha”, de Guilherme Daniel e “(In)dividual”, de Beatriz Bagulho. Os dois últimos, em conjunto com “When the Light Goes Out” de Tânia Prates concorrem em simultâneo para o GPN e na competição internacional.

Na secção Flavours Of The World haverá um especial sobre o cinema da Letónia, que não tem sido capaz de captar tanto interesse e devoção como a cinematografia de outros países do Báltico. O FEST exibirá a primeira longa-metragem de Aik Karapetian, “People Out There” e aquela que é considerada a sua obra-prima até à data, “Man With the Orange Jacket”. Na secção Be Kind Rewind será feita uma retrospetiva do cineasta Quentin Dupieux, que é uma das grandes referências do cinema mundial. Serão exibidos os filmes “Deerskin” e “Reality”, que abordam temas que remetem para o distanciamento e outras questões que a equipa de programação considera pertinentes neste momento.

Na programação do FEST cabem ainda o NEXXT, secção dedicada a “novas vozes criativas” e o FESTinha, secção de cinema infanto-juvenil com três sub-categorias (sub-10, sub-12 e sub-16).

A tendência “drive-in”

O cinema drive-in era já muito frequente noutros países do globo e parece ter vindo para ficar – em Vila do Conde, por exemplo, esgotou quando abriu para assinalar o que seria o primeiro dia do Curtas (se o festival não tivesse sido adiado) e acabou por ficar para o resto do verão.

The Incredible Shrinking Wknd”, de Jon Mikel Caballero, é uma das longas a passar no drive-in. Foto: D.R.

O FEST decidiu apostar também no cinema drive-in e instalou-o no parque de estacionamento da Nave Desportiva de Espinho. “A ideia é termos duas sessões por cada noite” – explica Fernando Vasquez – “a primeira é sempre uma sessão de comédia, sendo que podem ser longas ou curtas metragens, e depois, a partir da meia-noite, temos uma sessão de [cinema de] terror”. A ideia desta última sessão é atingir públicos diferentes e tentar reproduzir a experiência tradicional do drive-in, que está associada à visualização de filmes deste género, neste formato, a esta hora, como é comum nos Estados Unidos.

A entrada no drive-in é gratuita, mas é preciso levantar o bilhete à entrada. A lotação máxima é de 50 carros e é possível fazer reservas a partir do website do FEST. A programação completa, para cada um dos espaços de acolhimento do FEST, pode ser consultada no site oficial do festival.

Artigo editado por Filipa Silva