Envolvidas numa paisagem de cores terrosas e naturais, as gravuras são alcançadas depois de um trajecto de viatura todo-o-terreno. Começa desde aí a aventura de quem quer conhecer a arte paleolítica do Vale do Côa.

Pelo caminho, o guia que acompanha a visita dá a conhecer a região: a importância das amendoeiras, das oliveiras e do vinho… Esta área ainda faz parte da Região Demarcada do Douro; e em conjunto com as gravuras, atribuem o título de duplo Património Mundial ao Vale do Côa.

três núcleos de arte rupestre abertos ao público, embora a guia explique que só 20% das gravuras estão acessíveis. Pela influência da barragem do Pocinho, o rio Côa faz desaparecer mais de 80% das gravuras que existem ao longo de 17 kms.

Em Ribeira de Piscos (Muxagata) salienta-se a gravura do “Homem de Piscos” – uma das raras figurações humanas paleolíticas. A Penascosa (Castelo Melhor) oferece uma arte variada. E a Canada do Inferno (Vila Nova de Foz Côa) – que se encontra bastante alterada em termos paisagísticos, em virtude da submersão de grande parte das suas gravuras motivada pela construção da Barragem do Pocinho.

Eis que a aproximação do Vale já faz sentir o desejo de aventura e de descoberta; de viagem no tempo até à época do “Homo Sapiens-Sapiens”.

Estamos já num ano ao acaso entre 30 e 10 mil anos a.C., no Paleolítico Superior. À nossa volta, painéis de xisto com gravuras.
A imaginação voa… Certezas há poucas, mas os estudos têm sido muitos.

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«Estamos a falar de homens e mulheres como nós, mas que viviam da caça, da pesca e da recolecção de frutos e de vegetais… Isso obrigava-os a moverem-se; eram nómadas (…). O homem do Paleolítico começou a trabalhar instrumentos com tudo o que pudesse recolher da natureza. E fazia os bifaces; as agaias; a flor do loureiro (sílex). Havia já técnicas de caça. Não caçavam sozinhos; organizavam-se e podiam assim sobreviver (…)», relata a guia da visita, Cristina Rebelo.
“Para fazerem as gravuras tinha de ser pedra com pedra (…), por exemplo, com o quartzo.”, acrescenta.

A arte paleolítica é uma arte animalística. São representados os animais de caça, nomeadamente, os de grande porte. Os bisontes e os mamutes são os mais frequentes um pouco por toda a Europa. Na zona mais ocidental, em que se encontra o Côa, «não aparecem nem bisontes, nem mamutes porque nunca existiram nesta zona. E os quatro animais mais representados no Vale do Côa são o cavalo; a cabra pirenaica; o veado; e o auroque – antepassado do boi actual.», explica outra guia do Parque, Dalila Correia.

Que papel tinha esta arte para os povos do Paleolítico Superior?

«Não podemos afirmar rigorosamente nada (…) Contudo, há uma série de teorias (…) Percebe-se que estão intimamente ligadas com uma economia de subsistência e de sobrevivência destes bandos – não só a carne para alimento; mas o osso para utensílios; a pele; os chifres; os tendões. (…) O significado… tanto pode ser uma demarcação territorial; como pode ser uma informação de que há animais de caça. Podem estar ligadas a uma ideia mágico-religiosa, de tentar prender na rocha o espírito do animal que se pretendia caçar (…). Sem dúvida que não era “arte pela arte” (…), mas a certeza absoluta ninguém a pode dizer», segundo Dalila Correia.

Porque vieram ver as gravuras?
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«Já estamos para vir cá há alguns anos, mas onde vamos é sempre com a filha atrás. E achamos que era mal empregue vir com a filha pequenina. E decidimos guardar isto para quando ela mostrasse interesse. Agora ela chegou ao 7º ano, está a estudar estas matérias em História e quis vir; e aproveitamos as férias de Natal. (…) Tentamos sempre escolher alguma coisa de interessante para aprender nos sítios para onde vamos.
Maria de Fátima Garret (Lisboa)

Há uma Pousada da Juventude boa. Conheço Portugal bem e é a primeira vez que estou nesta zona. Vi a Pousada da Juventude e pensei, “vou ver o campo; depois vou ver que possibilidades há de fazer alguma coisa interessante”. (…) Não sou nenhum especialista em Arqueologia; não sei nada de profundo sobre o assunto, mas gostei de ver que há uma certa protecção e uma tentativa de informar as pessoas do que se está a ver.
Gabriel Schmid (Suiça – casado com uma portuguesa)

De olhos cheios e imaginação ainda a trabalhar, a visita (em jeito de viagem) chega ao fim…

Letícia Amorim