Lecciona na Universidade Aberta do Porto e tornou públicas as suas opiniões sobre o Ensino Universitário quando criou o seu weblog O Ensino Superior em Crise. Para ele, Bolonha tem sido um processo mal conduzido pelo poder político e, como adianta, a insatisfação junto dos docentes universitários tem aumentado significativamente. E, tal como defende Luís Santos, também Jorge Morais acredita que, se o Estado continuar a olhar para Bolonha como um instrumento económico, então o processo vai entrar na via errada. É uma voz do ensino superior privado sobre o polémico dossier de Bolonha, em entrevista ao JPN.

Um ensino universitário comum a nível europeu é um passo importante para a consolidação do processo europeu ou o Protocolo de Bolonha é uma medida predominantemente económica, uma forma de preparar melhor o mercado de trabalho europeu para a competição directa com os Estados Unidos?

Penso que é uma questão eminentemente económica. Não só por questões relacionadas com o mercado de trabalho, mas também, infelizmente, porque em muitos países, como Portugal, Bolonha é visto como uma desculpa para reduzir os custos do ensino superior.

Portugal está preparado para o desafio que é a aplicação do Protocolo de Bolonha?

Temo que Portugal esteja tão preparado para este desafio como estava preparado para entrar na CEE, ou como estava preparado para a moeda única. Como sempre, passa-se a mensagem que Bolonha é inevitável, que temos que nos preparar, adaptar. Tudo aparece como um dado adquirido, como algo que não deve nem pode ser posto em causa. Não acredito que seja verdade.

As pessoas estão informadas sobre o que é “Bolonha”?

Neste momento o conhecimento sobre Bolonha é reduzido. As pessoas começaram agora a demonstrar mais interesse, porque se começou a falar que Bolonha ia começar já em 2005, que o financiamento ia diminuir e que iria haver despedimentos. Faltou um debate maior acerca deste assunto.

“Este processo é cada vez mais político”

Portugal tem a ganhar com a aplicação do Protocolo de Bolonha?

Na teoria sim. Portugal pode beneficiar com a uniformização dos cursos, e até com uma maior possibilidade de mobilidade dos alunos no espaço europeu. Na prática, não me parece que beneficie muito. Mudar as mentalidades é sempre mais difícil que mudar uma politica. E neste momento o processo é mais politico do que académico, o que prejudica o espírito de Bolonha. Quando os factores económicos suplantam os académicos, corre-se o risco da total descaracterização do princípio.

Como é que os docentes universitários encaram a aplicação de Bolonha?

Devo dizer que estão a ver tudo isto com muita apreensão. Como já disse, o processo é cada vez mais um assunto politico. É evidente que a principal razão para a prioridade do governo na rápida aplicação de Bolonha é o factor económico. Com a redução das licenciaturas, reduz-se o financiamento. Mais. Estando os docentes, especialmente no ensino público, maioritariamente fora dos lugares de quadro, é natural que vejam com apreensão o que se está a passar.

“O governo só pensa na redução de custos”

Como explica o desinteresse que as universidades privadas têm demonstrado em relação à questão de Bolonha?

As universidades privadas parecem estar expectantes e mais cuidadosas, dado que funcionam com orçamentos privados. Logo, uma má aplicação do processo de Bolonha terá efeitos mais devastadores do que nas universidades públicas. Penso que esse é um dos principais motivos. Por outro lado, muitas das universidades privadas têm um corpo docente que não depende apenas da universidade, ou seja, em regime de não exclusividade, o que pode levar a que os professores se sintam mais seguros.

A aplicação do modelo 3+2 é a fórmula certa para o futuro do Ensino universitário português?

A ideia de um modelo é um dos problemas da aplicação da forma economicista como se encara este processo. A redução do número de anos deveria ser aproveitada para aumentar o tempo de investigação, reduzindo a carga horária dos professores, e para incentivar o uso de novos paradigmas pedagógicos, como, por exemplo, o ensino não presencial. Mas, em vez disso, o governo só pensa na redução de custos. Mais uma vez, está-se perante uma oportunidade perdida.

Miguel Lourenço Pereira