Para a maioria dos portugueses, e durante muito tempo, Álvaro Cunhal foi o homem que deu a cara pelo partido Comunista Português (PCP). Só mais tarde se descobriu que o mesmo homem que se empenhava de corpo e alma na política, guardava ainda energia para escrever e pintar.

Numa estética fortemente neo-realista, panfletária, maioritariamente seguida por autores comprometidos política e socialmente, Manuel Tiago (pseudónimo literário de Cunhal) foi publicando romances em que a clandestinidade, a passagem pelos calabouços da polícia política, o quotidiano dos militantes comunistas e do proletariado eram temas fortes. A literatura estava ao serviço da crença política do escritor.

No “Dicionário da Literatura Portuguesa”, António José Saraiva e Óscar Lopes defendem que o relato ficcionado da experiência de Cunhal é “o mais informativo, o mais exemplar e vivencialmente denso dos romances baseados numa intensa e íntima experiência de organização clandestina”.

Só em 1995, já arredado da política activa, o histórico líder comunista revelou o rosto que o pseudónimo Manuel Tiago escondia. Entretanto, já publicara a trilogia formada pelos romances “Até Amanhã, Camaradas” (recentemente adaptado à televisão por Joaquim Leitão), “Cinco Dias, Cinco Noites” (levado ao cinema em 1996, por José Fonseca e Costa), “A Estrela de Seis Pontas” e ainda “A Casa de Eulália”.

Ao morrer, esta madrugada, aos 91 anos, Álvaro Cunhal leva consigo não só o político, mas também o escritor.

Andreia C. Faria
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