Foram mais as questões levantadas do que as respostas dadas sobre terrorismo, no debate de sábado à tarde no auditório da Biblioteca Municipal de Santa Maria da Feira. Os vários especialistas presentes não chegaram a nenhum consenso sobre “A Europa e o Terrorismo Global”, o tema do IV Simpósio Sete Sóis Sete Luas que ali decorreu. A única conclusão a que se chegou foi que existem vários graus de terrorismo e que há terrorismo que não o radical islâmico.

À imagem do que se tem vindo a passar nas últimas conferências das Nações Unidas, o debate começou, decorreu e terminou sem que se conseguisse definir de forma acertada o conceito de terrorismo.

O assunto mais sensível do debate foi o dos suicidas palestinianos. O delegado da Palestina em Portugal, Issam Sadek Beseisso, afirmou que não se pode chamar terrorismo à luta contra um ocupante.

O mais aproximado a que se chegou de uma definição de terrorismo foi entendê-lo como qualquer acção que procure atingir civis inocentes, que não estejam ligados ao conflito armado.

Houve também várias tentativas de estabelecer uma base para a criação dos movimentos radicais violentos. O especialista em terrorismo internacional Ely Karmon considerou terem existido dois eventos essenciais na construção do terrorismo radical islâmico: a Revolução Iraniana de 1979 e a vitória afegã contra a União Soviética.

Por seu lado, a jornalista italiana, Giuliana Sgrena, que foi raptada no Iraque a 4 de Fevereiro deste ano, afirmou que “a viragem em relação ao uso do terrorismo se deu entre 1989 e 1991, com a queda do Muro de Berlim e a primeira Guerra do Golfo”, e não com os ataques de Nova Iorque de 2001.

O terrorismo radical islâmico transnacional foi o centro do debate, com excepção das referências à Cosa Nostra e a grupos terroristas localizados como as Brigadas Vermelhas pelo procurador nacional anti-máfia italiano, Piero Luigi Vigna. Como explicou Piero Luigi Vigna, “a globalização produziu mais uma globalização dos crimes do que uma globalização dos direitos”.

O jornalista e escritor iraquiano Zuhair Al-Jezairy, que até há uma semana era director do jornal Al Mada, afirmou que, no caso do Iraque, “o terror veio de fora para dentro [do país]”. Actualmente vivendo em Bagdad, Al-Jezairy reconhece que “a única maneira de combater o terrorismo é seguirmos com as nossas vidas”.

Os suicidas entre nós

Um dos pontos mais importantes do debate foi a discussão gerada em torno dos bombistas suicidas. O moderador, Carlos Magno, relatou uma experiência pessoal quando encontrou um amigo vindo de Marrocos, que lhe dissera que um dos suicidas dos atentados de Casablanca em 2003 tinha sido seu segurança enquanto lá esteve.

Zuhair Al-Jezairy tentou mostrar como é relativo aquilo que podemos considerar ou não como sendo terrorismo. O jornalista iraquiano assumiu que se fosse um adolescente confrontado com a visão do seu pai, parado num “checkpoint” israelita, a ter de se ajoelhar perante um soldado inimigo, humilhando-se, poderia compreender o que leva um jovem a aderir à causa dos bombistas suicidas.

Piero Luigi Vigna respondeu a esta afirmação, estranhando que os jovens que se tornam bombistas suicidas nunca questionem os seus superiores com a pergunta: “Em vez de me mandares a mim para lá explodir, porque não vais tu?”.

Quando a morte se torna banal

Tentando afastar os estigmas do islamismo, Issam Sadek Beseisso afirmou que “o terrorismo não tem religião”, uma opinião partilhada por Ely Karmon. O delegado palestiniano fez questão de referir que a Organização para a Libertação da Palestina (OLP) condena não só os ataques israelitas, mas também os palestinianos.

Beseisso lembrou ainda que “terrorismo não é só matar, mas também criar uma atmosfera de terror”.

“O terrorismo não mata só homens, mata também emoções”, descreveu o procurador anti-máfia italiano. Piero Luigi Vigna referia-se à perda de sentimentos que as pessoas sofrem depois de assistirem na televisão e lerem nos jornais sobre o número cada vez maior de mortos em conflitos a cada dia que passa.

Chegámos a um ponto em que só a partir das centenas é que damos valor à morte, frisou Vigna. “É o preto e branco da nossa existência”, disse.

Tiago Dias
Foto: Pedro Rios