Mafalda Veleda, 35 anos, porte vaporoso. De flor no cabelo, chega sorridente e pede desculpa pelos cinco minutos de atraso. O atelier cândido respira a luz que a Rua do Bonjardim oferece naquela tarde.

Começa por explicar que a corrente anglo-saxónica que lhe é familiar – após a licenciatura em História de Arte pela FLUP, completou os seus estudos em Inglaterra, em “Conservation” pelo Camberwell College of Arts, London Institute – não contempla a palavra “restauro”, algo pejorativo, podendo significar “substituição total”. Mafalda explica a diferença das correntes enquanto vai mostrando obras de alguns autores relevantes da área que “conserva para proteger”.

Portugal utiliza o termo e bebe influências italianas: Cesare Brandi é fonte inegável na corrente, que até aos anos 70 sofreu da pouca tecnologia disponível. Na conservação do papel, há duas abordagens: a documental e a estética. A primeira, várias vezes de teor arquivista, relaciona-se, também, com o poder central/estadual. A estética é, como o nome indica, de teor artístico.

À semelhança do processo de vinivultura onde se conservam as vinhas em gelo utilizado na Alemanha e Canadá (denominado “eiswein”), também o papel começa a ser alvo de processos semelhantes, processos esses que visam fundamentalmente os documentos fotográficos.

Conservação de papel: uma área pouco desenvolvida em Portugal

Mafalda Veleda que, quando estava em Inglaterra, trabalhara na Getty Images, relata um episódio em que Bill Gates, que detém outro ” banco de imagens ” – a Corbis Images – utilizou antigas minas na Pensilvânia para guardar a colecção fotográfica, deixando de disponibilizar a visualização dos originais aos especialistas da conservação.

Uma das consequências deste processo é o despedimento dos conservadores de papel que trabalhavam na empresa. É com especial ironia que Mafalda conta que, anteriormente, o arquivo fotográfico da Corbis se encontrava em Nova Iorque, um grande centro urbano onde são emitidas elevadas quantidades de monóxido de carbono. Estas condições ambientais, às quais o documento está exposto, tornam-se inimigas da preservação do papel, sendo esse um dos principais motivos que explicam a decisão de Bill Gates.

O processo de conservação do papel também difere bastante das outras áreas, uma vez que o tratamento por via aquosa é um dos passos para todo o processo de conservação (o que, à primeira vista, pode confundir qualquer um). As dificuldades no processo de conservação são imensas e as causas de destruição do papel também.

A área de conservação do papel é a menos desenvolvida em Portugal. A especialista refere, ainda, o elitismo da área, que pretere a conservação da pintura. Ainda assim, Mafalda Veleda já teve oportunidade de tratar obras/documentos de criadores como Vieira da Silva, Picasso, Henrique Pousão, Júlio Pomar, David Goldblatt ou Durval Pereira.