Poucas vezes me senti tão envergonhado com a Selecção Nacional do meu país como no dia 29 de Junho de 2010. Em pleno Mundial, contra o nosso rival eterno, depois da década mais gloriosa da História do nosso futebol, fomos eliminados porque morremos de medo, o medo bafiento de décadas a fio, que alimentou durante todos esses anos a nossa pequenez internacional, o nosso “eliminados de cabeça erguida”.

Depois de dez anos inesquecíveis, da impensável remontada contra a Inglaterra em 2000 ao golo de Nuno Gomes aos “hermanos” em 2004, dos penalties sem luvas de Ricardo, à “batalha” de Nuremberga e aos sete à Rússia, perdemos na África do Sul sem um mínimo de respeito para com tudo o que conseguimos. Não foi por São Casillas, pelo tiki-taka ou pelo Villa “Maravilla”, foi pelo mais puro medo. Antes perder uma final todos os dias para os gregos a acreditarmos que vamos conseguir, do que perder uns oitavos-de-final para o futuro campeão do Mundo, porque estamos simplesmente mortos de medo para tentar.

Os 4 – 0 de quarta-feira talvez nem contem para nada. Não dão pontos, não dão títulos, talvez não acontecessem se dessem e talvez nem os ganhássemos se isto fosse o Mundial outra vez. Mas, olhamos para a selecção e transbordamos orgulho. Eles até podem gozar dos nossos “olés”, que era coisa de deslumbrados por terem feito aquilo aos imponentes campeões do Mundo, ou dizerem que os amigáveis são de concentração difícil, mas em campo não esteve menos do que o onze campeão do Mundo e toda a gente viu Busquets a bater, Casillas a desesperar e Del Bosque a agonizar silenciosamente. Não dá pontos, não dá títulos, mas isto era um Portugal – Espanha. E num Portugal – Espanha ninguém brinca, ninguém não quer saber e ninguém convive bem com um 4 – 0. Eles vão-se lembrar tanto dele como nós.

Fosse há uns meses e tínhamos estarrecido outra vez. E tínhamos jogado com seis médios, e Pepe a trinco, e laterais dentro da área, com o fantasma de Ronaldo e sem ponta-de-lança. E teríamos perdido, claro, por um ou dois, coisa normal perante o campeão do Mundo. Na quarta-feira não entrámos em campo para ter sorte, entrámos para ganhar. Não foi só atitude, porque ninguém humilha assim a Espanha e tem tamanho caudal de jogo sem trabalho táctico, e ainda mais mérito do seleccionador por isso, mas foi sobretudo atitude. Confiança em nós próprios, no nosso jogo, no nosso contra-ataque, no nosso extraordinário talento individual, consciência de que era preciso anular a Espanha, sim, mas sempre pela força e pela qualidade do nosso próprio futebol. E essa mentalidade ressaltava mesmo que tivesse sido só um golo e estará com esta selecção até à Polónia e à Ucrânia em 2012.

Escrevi, depois da nossa eliminação na África do Sul que, depois de dez anos a nos tornarmos grandes, se voltássemos a perder a mentalidade, perdíamos tudo. É bom saber que ainda fomos a tempo, que recuperámos a nossa dignidade e que voltámos a fazer coisas deste nível. É bom saber que estamos de volta.