F. Xavier Malcata é professor catedrático do Instituto Superior da Maia (ISMAI) e o primeiro cidadão português a receber o “Elmer Marth Educator Award”, atribuído pela International Association for Food Protection (IAFP), pelos seus contributos na área da Segurança e Protecção Alimentar e a ser eleito Fellow do Institute of Food Technologists (IFT). Os prémios serão entregues em cerimónias públicas, durante os congressos anuais do IFT em Nova Orleães e do IAFP em Milwaukee, nos Estados Unidos, em Junho e Agosto, respectivamente.

Em entrevista ao JPN, o professor catedrático fala da falta de reconhecimento e das diferenças existentes, na área alimentar, entre Portugal e os Estados Unidos, país onde se doutorou.

Como reagiu quando soube que tinha ganho os prémios?

Tenho que confessar que reagi bem, como qualquer pessoa reagiria quando sabe que tem uma distinção, neste caso duas internacionais, tendo havido, de facto, a coincidência delas terem aparecido quase na mesma altura. É uma sensação de grande felicidade e, ao mesmo tempo, de grande satisfação, porque significa o reconhecimento de uma carreira de longos anos que tenho feito em Portugal.

Que significado têm estes prémios?

Têm um significado especial por causa das instituições que os atribuíram, nomeadamente a International Association for Food Protection (IAFP), na medida em que é uma associação em que estão representados cerca de 70 países de todo o Mundo e onde, de certa forma, está a “fina-flor” dos profissionais que têm a ver com a protecção e a segurança alimentar. Relativamente à concessão do título de Fellow do Institute of Food Technologists (IFT), essa é a maior organização a nível mundial, que tem a ver com tecnologia e ciência alimentar.

Perfil

O professor catedrático, com formação de base em Engenharia Química, tem desenvolvido abordagens pioneiras em ciência e tecnologia alimentar, tendo já publicado mais de dez livros técnicos e 300 artigos científicos em revistas internacionais. A capacidade de liderança, assim como os seus contributos, “inovadores e complementares”, para a formação e o ensino, foram destacadas pelas instituições internacionais que atribuíram os prémios. Para além destas duas distinções, Xavier Malcata já tem no seu currículo prémios como o “Scientist of the Year Award” da European Federation of Food Science and Technology ou o “International Leadership Award” do IAFP.

E ser o primeiro português a receber estes galardões tem um sabor especial?

Tem um sabor e uma responsabilização especial. Tem um sabor especial porque, acima de tudo, eu sou cidadão deste meu país, que sempre foi onde trabalhei e desenvolvi os meus esforços para pôr as minhas qualidades ao serviço do colectivo. Por outro lado, também penso que isto poderá servir de exemplo ao trabalho de muitas outras pessoas que em Portugal fazem trabalho de elevadíssima qualidade e que não foram, até hoje, reconhecidas a nível internacional e também, um exemplo para outros mais jovens.

Estas distinções e todas as outras que já recebeu enriquecem a sua carreira e estimulam-no a fazer mais?

Naturalmente que sim. Obviamente que ter reconhecimento pelos pares e, em especial, quando esse reconhecimento vem de associações com representatividade mundial, tem um sabor especial e, ao mesmo tempo, é um reconhecimento com muito significado e que ajuda a progredir na carreira. Acho que qualquer um destes reconhecimentos é um estímulo para continuar a trabalhar e sobretudo para fazer melhor.

E em Portugal, o seu trabalho é reconhecido?

Quase nada, com toda a franqueza. De facto, não deixa de ser caricato que eu tenha recebido tantas distinções internacionais mas, em Portugal, não tenha havido esse reconhecimento. Não sei por que é que isso tem acontecido e não me quero alargar muito sobre isso. Mas, tal como quando vamos publicar a nossa investigação, devemos tentar que ela seja colocada nos veículos mais exigentes a nível mundial, exactamente pela mesma forma, os reconhecimentos internacionais para mim, valem muito mais do que qualquer outro.

Mas deixa-o triste não ver o reconhecimento do seu país?

Se calhar, um bocadinho triste. Tenho conseguido alguns sucessos ao longo da minha vida e continuo a tê-los. Esse reconhecimento, que é mais individual e, na maior parte dos casos, incógnito e anónimo, para mim é suficiente. Sei que estou a fazer qualquer coisa pelo meu país, reconheço que isso acontece e algumas pessoas também o fazem.

Como surgiu o gosto pela área da Segurança Alimentar?

Confesso que foi uma oportunidade que tive na minha vida. Fui aluno da Universidade do Porto e saí, em 1986, de Engenharia Química. Nessa altura fui contratado por uma instituição que trabalhava na componente alimentar e me ofereceu a possibilidade de poder doutorar-me numa das melhores universidades americanas e num dos melhores departamentos relacionados com a Engenharia Química e a componente alimentar.

Na sua opinião, é possível em Portugal atingir a excelência que há nos EUA na área alimentar?

É possível porque essa excelência tem a ver com organização. Nós somos um país intrinsecamente desorganizado, não remamos todos para o mesmo lado. E temos outro problema que os americanos não têm, que é uma desconfiança intrínseca. Da experiência que trouxe dos Estados Unidos, a sensação que eu tenho é que podíamos ser muito melhores que eles, tivéssemos nós a organização e não este problema histórico de desconfiança dos nossos pares.