A contaminação dos solos e das águas subterrâneas é um problema reconhecido em todo o mundo desde os finais dos anos 70. Contudo, ao contrário do que acontece na maioria dos países da União Europeia (UE), em Portugal ainda não existe uma legislação que limite a concentração de contaminantes no solo.

O anterior governo tinha já delegado a “elaboração de uma proposta de lei de base do solo”, explica o investigador no Grupo de Reação de Análises Químicas (GRAQ) do Instituto Superior de Engenharia do Porto (ISEP), Tomás Albergaria. De acordo com a calendarização, “estaria pronta em junho de 2011” para ser, posteriormente, avaliada em Assembleia da República. Contudo, quando houve novas eleições, “o processo foi interrompido” e continua, ainda, “em suspenso”, afirma o engenheiro.

O responsável pelo Centro de Investigação em Geo-Ambientes e Recursos (CIGAR) da Faculdade de Engenharia da Universidade do Porto (FEUP), António Fiúza, indica a existência de algumas leis que “impõem, sob o ponto de vista das empresas, que a qualidade dos solos seja preservada”. Entre elas, destacam-se a lei da responsabilidade ambiental (na qual é referido que se “deve observar a legislação de qualquer país comunitário à escolha”) e a lei canadiana sobre a qualidade do solo. No entanto, António Fiúza considera um pouco “absurdo” ser esta a “única chamada de atenção”, na legislação portuguesa, relativamente a esta “problemática”.

Com efeito, segundo Tomás Albergaria, no relatório de estado do ambiente de 2007, pode ler-se que “quem quiser ter um padrão de normas” no que toca à contaminação dos solos, “que siga a legislação do Canadá”. O investigador critica, ainda, a necessidade de “regredir” a 2007 “para encontrar um texto” sobre o problema em questão. Tomás Albergaria considera este tipo de relatório um “deserto de ideias” no que diz respeito a referências a “situações de contaminação” e, consequentemente, a “políticas de descontaminação” do solo.

A contaminação dos solos pode ter consequências na saúde pública

Uma consequência direta da contaminação dos solos é a contaminação das águas subterrâneas, sobre a qual também não existe legislação em Portugal. Com efeito, António Fiúza esclarece que, em março de 2010, a UE declarava, num relatório, que “todos os estados-membros, exceto a Grécia, tinham comunicado informações de fixação de limiares”. No entanto, Portugal não estabeleceu esses limites por “não ter identificado massas de águas subterrâneas em risco”. O engenheiro, contudo, afirma que tal não é verdade, pois existe “muita água subterrânea contaminada”.

Desta forma, Tomás Albergaria alerta para a “contaminação dos lençóis freáticos” (reservatórios de água subterrânea) que, frequentemente, “são usados pelas pessoas que têm poços domésticos” e através dos quais fazem “captação da água e bebem-na”. Também a construção de casas nos arredores de zonas onde se verifique a contaminação de “compostos voláteis” leva a que os “vapores” libertados se infiltrem dentro das casas, criando “um ambiente tóxico para as pessoas”, explica. Por isso, o investigador do GRAQ avisa que “existe um risco indireto” para o Homem e é importante “precaver” tais situações.

Investigadores têm desenvolvido tecnologias para a reabilitação dos solos

Apesar da falta de legislação, os investigadores desta área têm desenvolvido trabalhos de remediação dos solos contaminados. Tomás Albergaria considera que “existem inúmeras tecnologias ao dispôr do Homem” para este processo. Também António Fiúza diz que, atualmente, existe “uma grande panóplia de alternativas disponíveis de intervenção”, além de que “vão continuamente aparecendo tecnologias novas”.

O coordenador do CIGAR o exemplo da descontaminação de um aquífero, através de tecnologia in-situ (implementada diretamente no local contaminado sem escavação do solo). Apesar de ser um processo lento, já foi possível “destruir quase quatro toneladas” do contaminante. Por seu lado, o GRAQ encontra-se a “desenvolver nanopartículas de ferro zero valente” que possam tratar a “descontaminação dos solos”, explica o engenheiro Tomás Albergaria.

Ambos os engenheiros esperam que medidas sejam tomadas no sentido de promover a preservação da qualidade dos solos e que seja imposta uma legislação que incuta limites máximos admissíveis de contaminantes. Tomás Albergaria acredita que, “mais cedo ou mais tarde”, existirá essa legislação, “adequada à realidade” do país. Por enquanto, finaliza o engenheiro, falta apenas a “coragem” e a “vontade política”.