Maria Cruz andava na escola secundária quando começou a doar sangue. Mas, nessa altura, ainda não encontrava grande divulgação das dádivas sanguíneas, uma situação que mudou quando entrou na faculdade, onde “já se começava a ver muitos cartazes de recolha”. José António Ribeiro, administrador no Instituto Português do Sangue (IPS), explica que esta é uma situação normal porque “não é um assunto que tenha sido objeto de muito trabalho em termos de informação ou de divulgação”.

Ainda assim existem campanhas de apelo à doação e tentativas de incentivar mais pessoas a tornarem-se dadores de sangue. “E não porque não haja sangue suficiente para assegurar as necessidades”, justifica José António Ribeiro. Até porque, muitas vezes, não tem a ver com a quantidade, mas sim com a qualidade do sangue disponível. Assim, os apelos por dádivas de sangue estão relacionados “com a curva descendente da população portuguesa, que tem uma curva de população envelhecida”.

Os jovens assumem aqui um papel essencial porque ainda são saudáveis e têm muitos anos pela frente como possíveis dadores de sangue. Mas o apelo para se tornarem dadores não pode ser feito apenas quando têm idade para o ser. “O apelo funciona no momento e depois esquece-se, tem de ser informação mais sustentada”, defende José António Ribeiro. “No extremo, é preciso que os programas das escolas tivessem na parte da cidadania este tema” relacionado com a importância das dádivas.

Os jovens estão a fazer a sua parte ao “dar o normal em cada grupo etário”. Mas as recolhas nas faculdades, em relação à sua população estudantil, são poucas. “A Universidade do Minho é a que consegue dinamizar mais a dádiva de sangue, com colheitas na ordem das trezentas ou quatrocentas dádivas de cada vez que lá vamos. As outras faculdades dão 30 ou 40 dádivas em mil, 1.500 alunos”, assegura o administrador do IPS.

Doação de medula óssea ainda é um mito

A população de dadores de medula óssea é uma população jovem, que vai dos 18 aos 45 anos, quando se inscreve, mas que tem uma grande penetração das faixas etárias entre os 25 e os 35, 40 anos. Dados que Helena Alves, diretora do Centro de Histocompatibilidade do Norte (CHN), explica pelo facto de que, “numa faixa etária, mais baixa a doença e a morte estão habitualmente muito distante”. Mas assegura que, “a partir dos 20 e poucos anos, as pessoas começam a aperceber-se mais daquilo que são os problemas dramáticos da vida, nomeadamente questões relacionadas com a saúde” e que, por isso, tem havido uma boa aceitação por parte das camadas jovens para esta doação.

Mas a doação da medula óssea continua a estar assente em muitos mitos, o que pode levar a que imensas pessoas se afastem desta dádiva. “Efetivamente, as pessoas não doam medula óssea, não é a medula que é colhida na grande maioria dos casos. O que é colhido são os progenitores, as células mãe, libertadas da medula óssea para a corrente sanguínea que são recolhidas na veia do braço”, explica Helena Alves. “O nome de dadores de medula óssea nem sequer é um nome muito correto porque o que a pessoa dá são células que se criam dentro da medula óssea” e não a própria medula.

“Neste momento, a maior parte das recolhas é feita pela picada na veia do braço”, demorando o processo perto de duas horas. “Não é nada doloroso e é simples”, garante. Helena Alves diz ainda que a pessoa pode até estar a ver televisão ou a ler um livro, se quiser. “Em poucas situações, poderá ser melhor ou ser preferido pelo doador fazer uma doação através da picada do osso da bacia, aí será feita uma anestesia geral, mas é uma situação que já é raríssima e não é o habitual para a colheita”, assegura a diretora do CHN. A inscrição como doador consiste numa picada de recolha de sangue para análise, como se fossem os tubos de análises normais, um processo muito parecido com a doação de sangue.

No entanto, é muito difícil uma pessoa ser encontrada como dadora efetiva. A pessoa inscreve-se mas daí a ser reconhecida como dadora de algum doente a probabilidade é baixíssima. Portugal tem registados 285 mil potenciais dadores, dos quais 48,1% são da zona norte, desde o início do Registo Nacional de Dadores de Medula Óssea. Mas, por exemplo, em 2011, apenas foram feitas 106 colheitas para transplante. Ainda assim, Portugal consegue ser um país com uma taxa de eficácia de transplante (3,2%) acima de países como a Alemanha (1,1%) ou os Estados Unidos da América (0,009%).

Helena Alves destaca a importância dos jovens neste processo de doação de medula óssea. Aliás, 26,3% dos dadores da região norte estão entre os 18 e os 25 anos. Por isso, “é sempre muito importante, nomeadamente ao nível das universidades e dos grupos desportivos, levar esta sensibilização a estes grupos etários”, afirma. Há, todos os anos, uma colaboração do registo nacional de dadores de medula óssea com as universidades, “de maneira que os jovens “por um lado se apercebam das reais necessidades dos dadores e, por outro, possam inscrever-se e participar nesta ajuda” que só através da doação se pode fazer aos doentes que precisam de transplante. “Estes são tratamentos que não se compram, não são substituídos por medicamento, não são possíveis se não houver uma participação dos dadores”, remata.