Agosto de 1993. Aparentemente, uma data como outra qualquer, mas para João Carvalho e os amigos, não foi bem assim. Eram “miúdos” e gostavam de música. Não havia muito para fazer na pacata terra do rio Coura, pelo que resolveram assistir à “Noite de fados” na recém inaugurada praia fluvial do Taboão.

“E se fizéssemos alguma coisa deste género para a nossa idade?”, foi a ideia que surgiu na cabeça de João Carvalho e nunca mais o largou. Nessa mesma noite, fez um acordo com o presidente da câmara e ficou definido a existência de um festival de música em Paredes de Coura (PdC).

Organizar um festival nos anos 90

O que se pode chamar de primeira edição do festival Paredes de Coura “foi feito em nove dias e de uma forma muito amadora”, garante João Carvalho, um dos organizadores do festival, que ainda se recorda de os ter passado dentro de uma cabine telefónica “com um cartão de dois contos em chamadas, comprado nos CTT” a contactar com as bandas convidadas.

A primeira edição foi grátis e aconteceu a 20 de agosto de 1993 com bandas portuguesas. “Ecos da cave”, “Gangrena”, “Cosmic City Blues”, “Boucabaca” e “Purple Lips” fizeram parte do cartaz. As primeiras três edições não se pagavam, visto que “o objetivo, na altura, não era fazer vida daquilo, nem ganhar dinheiro”. Foi a partir da quarta edição que o festival começou a “ganhar nome e substância”.

Organizar festivais de música é, hoje em dia, bem mais fácil que nos anos 90. Os telemóveis e emails facilitaram as contratações, mas João Carvalho recorda que, se antes funcionava a “ingenuidade, o amadorismo e o entusiasmo”, hoje funciona o “profissionalismo”. As coisas tornaram-se maiores e mais sérias com o passar dos anos e isso passa também pelo gosto musical de quem está por detrás de um evento de música.

O Paredes de Coura já passou a adolescência e é agora um “adulto responsável”. Para João Carvalho, foi “emocionante ver em 1997 os Rollins Band atuarem quase no quintal lá de casa”, algo que nunca teria imaginado, pois até ali só os tinha visto na televisão.

O Paredes de Coura já é adulto

O festival Paredes de Coura comemora, este ano, a 20.ª edição e, segundo João Carvalho, “o público vai-se renovando”, mas pessoas que “vão desde a primeira edição”. No entanto, o PdC “não é propriamente um festival de miúdos de 15 anos”, a faixa etária está entre os 20 e os 40 anos. Estereótipos à parte, o público que vai a Coura “gosta de cinema europeu, lê muito e está sempre informado”, esclarece.

Se o PdC é “sinónimo de qualidade” e de últimas tendências no mundo da música, isso tem a ver com a “coerência musical” que a organização sempre teve em conta. É importante traçar “uma filosofia” para o festival e “não fugir dela”, diz João Carvalho.

Quando se fala em evolução e crescimento, é impossível fugir a duas edições do PdC: 1999 e 2005. A edição de 99 foi uma espécie de salto, em que houve uma enchente de pessoas “que ninguém estava à espera”. Em 2005, o anfiteatro natural junto ao rio Coura recebeu bandas internacionais como Pixies, Arcade Fire, Queens of the Stone Age, Foo Fighters, Kaiser Chiefs, The National, Nick Cave and the Bad Seeds, entre outros nomes sonantes da linha rock. Nesse mesmo ano, foi considerado um dos melhores festivais da Europa.

Memórias de quem esteve nas primeiras edições

Se um festival se faz das bandas, do ambiente e do seu público, faz-se também das histórias que ficam na memória de quem lá passa. O JPN esteve à conversa com Paulo Lopes, um dos presentes na primeira edição do festival Paredes de Coura, em 1993. “Estava de férias no Gerês e fui lá por acaso”, conta. Cosmic City Blues e Gangrena foram as bandas que o atraíram para perto de Coura.

Cinco anos depois, em 98, esteve três dias em Paredes de Coura e guarda na memória o concerto dos Red House Painters, “excelente a todos os níveis”, garante Paulo Lopes. Na edição de 99, “os Guano Apes ficaram estupefactos com a agitação do público”, recorda. As condições do campismo melhoraram, bem como o aumento de oferta de comida, considera o festivaleiro, que relembra, ainda, os concertos de Mogwai e dEUS.

Em 2000, voltou a Coura para a estreia dos Coldplay em Portugal, com um concerto que ficou na história quando o vocalista Chris Martin apresentou os Coldplay e garantiu ao público que “poderia atirar pedras para o palco” caso não gostasse da banda, a recordar o que acontecera aos Oasis nesse mesmo ano, na Zambujeira do Mar. Paulo Lopes regressou a PdC em 2001 para o concerto dos Stone Temple Pilots, “um dos melhores que Paredes de Coura já recebeu”.

Talvez seja pela paisagem natural e pelo ambiente tranquilo, ou até pela música que lá se ouve. Há uma espécie de “carisma” que o torna “diferente de todos os outros”, na opinião de João Carvalho. A verdade é que o PdC é um dos festivais mais acarinhados pelo público português e quem lá esteve pode explicar de diferentes formas uma mesma coisa: Paredes de Coura é especial à sua maneira.

Este ano, entre 13 e 17 de agosto, na praia fluvial do Taboão vai haver Ornatos Violeta (o regresso), Stephen Malkmus and the Jicks, Friends, dEUS, Kasabian, Dry the River, Midlake, Anna Calvi, Of Montreal, Gang Gang Dance e The Whitest Boy Alive.