António Sandiares coleciona histórias dos seus 57 anos como amador de pesca desportiva. Foi fundador da Associação Regional do Norte, é presidente da Assembleia dos Amadores de Pesca Reunidos, o mais antigo clube do Norte, e ex-presidente da Federação de Pesca Desportiva: “As histórias são muitas. É uma vida”.

Sandiares conta que, quando foi para a Federação, “dedicava três dias por semana à pesca desportiva, gratuitamente”. “Nunca recebi um tostão dado pela pesca. Só prejuízos de viagens para os campeonatos, estadia, alimentação. Aos fins-de-semana dedicava-me exclusivamente ao desporto. Mesmo à noite ia para a pesca noturna. O amadorismo é um vício, é ter um vício. É uma doença. Prejudicamos a família e outras coisas em prol da modalidade. Isso é um amador. É ter essa paixão e dedicação”, afirma.

O ex-pescador confessa que “todas as modalidades desportivas amadoras estão a agora a sofrer grandes cortes”. “Isto reflete-se no número de inscrições. A pesca, em si, já perdeu mais de 50% dos atletas em três ou quatro anos. Isto é terrível. Os clubes estão a fechar todos. Só sobrevivem os clubes-firma”, desabafa António Sandiares.

Uma atriz amadora que ama o que faz

Ana Lopes tem 29 anos e é arquiteta e professora de música. Nas horas livres é atriz amadora na associação “Teatro à Sexta“.

Na opinião desta profissional polivalente, ser ator amador “é fazer teatro sem estar à espera de viver disso, ou seja, não há remunerações”. “Não significa isto que não se tente fazer o trabalho mais profissional possível. Acaba por haver um amor e uma dedicação mais honesta porque só faz quem gosta, quem o faz por amor ao teatro. Não quer dizer que o grupo em si não receba remunerações, mas são sempre pensadas para sobrevivência do grupo e não a título individual”.

Cooperação da atividade profissional e amadora

Alexandre Aibéo é astrónomo profissional e teve uma ideia inovadora: aproveitar a atividade amadora e criar uma plataforma onde pudesse existir a partilha de conhecimentos num projeto em comum.

“Construímos uma plataforma que assenta em dois pilares: por um lado, qualquer pessoa é tratada da mesma forma. Simplesmente tem que submeter um projeto, que pode já estar a decorrer, e dizer o que é que precisa. Depois, amadores ou profissionais aderem, ou não, ao projeto. A principal vocação é unir as duas partes. Ainda não temos nenhum projeto a andar. A plataforma já está montada mas ainda é recente e não houve ninguém que submetesse um projeto, mas já há uma história. Já há, pelo menos, 19 projetos, alguns já registados no site, de parceria entre astrónomos”, conta Aibéo, sobre a Plataforma Pro-Am.

Entre as aulas de música e os projetos, Ana diz que a gestão de tempo nem sempre é fácil, mas “tem sido sempre possível, ainda que às vezes com sacrifício”. “Coordenar horários, fazer substituições de aulas para poder estar no teatro e conjugar as duas coisas. Sinto que, às vezes, há fases duras e difíceis. Não me esqueço de estar a fazer a minha tese de mestrado e, na altura da entrega, estar a sofrer bastante porque também estava em altura de espetáculos. Conjuga-se, por amor à camisola”, conta.

A história dos dois “astrónomos solitários”

Felisberto Soares e Alfredo Balreira são dois amigos de longa data, já reformados. Estes ex-bancários sempre sonharam mais alto, em direção ao imenso universo. São astrónomos amadores, “amantes do céu”, como diz Alfredo.

Por opção própria, não pertencem a nenhuma associação. “Quando precisamos trocamos impressões um com o outro. Neste caso, é um trabalho solitário. Somos astrónomos solitários. É uma paixão”, confessa Felisberto, que descobriu a paixão pelo universo quando ainda era muito pequeno.

Hoje a situação é muito diferente. Felisberto tem o seu próprio observatório no telhado de casa e um telescópio que, ligado a uma máquina fotográfica, capta fenómenos como “planetas, a lua e, depois, objetos do céu, mais profundos, como galáxias, nebulosas e coisas um bocado mais difíceis que requerem uma paciência muito grande e, acima de tudo, algum equipamento capaz”. “Gosto muito de fazer fotografia. Cada vez que observava os objetos do céu ficava sempre com muita pena de não ficar com aquela imagem para mais tarde poder ver aquilo novamente”, revela.

Apesar disto, os amigos admitem que a atividade é muito cara, exige muitas noites em branco e que a questão monetária tem muito peso: “Isto é muito bonito mas se calhar não é para qualquer um. Existem filtros especiais para fazer fotografia debaixo de um céu com poluição luminosa, mas o equipamento é muito caro. Não esta à bolsa de toda a gente. Eu não estou a ver um individuo jovem a ter capacidade económica capaz de comprar um filtro, uma máquina ou um telescópio. Tudo isto implica muito dinheiro e não está ao alcance de qualquer um. Está ao alcance dos privilegiados e eu considero-me um, porque, felizmente, ainda vou tendo para fazer umas brincadeiras dessas”, admite Felisberto.

Sem os apoios do Estado e a alimentar-se da paixão e do amor dos seus praticantes, o amadorismo em Portugal enfrenta várias dificuldades. Pode não estar em vias de extinção, mas o certo é que, atualmente, caminha cada vez mais para se transformar numa atividade elitista, para quem tem dinheiro, um emprego com horário flexível e muita, muita vontade de aprender.