Jorge Gonçalves, professor catedrático da Faculdade de Farmácia da Universidade do Porto (FFUP), foi condecorado, no passado dia 14 de abril, com o grau de Comendador da Ordem da Instrução Pública pelo Presidente da República, Aníbal Cavaco Silva. O título, atribuído aqueles que prestam altos serviços à causa da educação e do ensino, é um dos mais importantes do panorama nacional.

Esta condecoração despertou sentimentos contraditórios no atual coordenador da Plataforma de Cooperação Noroeste Global: “Todos nós nos sentimos de alguma forma vaidosos e especiais por toda a cerimónia”, afirmou Jorge Gonçalves. Em declarações ao JPN, o professor afirmou sentir-se orgulhoso visto que, segundo o mesmo, é importante ser reconhecido por um “trabalho clandestino”, isto é, uma função que não está à vista de todos.

O docente revelou ainda uma sensação de desconforto ao recordar-se de “todos aqueles que colaboraram para apenas um estar ali”. Segundo Jorge Gonçalves, é inevitável não pensar na sua equipa reitoral, colegas e funcionários que contribuíram para o seu sucesso, considerando então que não deveria estar a ser condecorado de uma forma solitária. Contudo, tal entregou-lhe um “sentimento de representação” de toda a sua equipa e, por consequência, “mais responsabilidade”.

Crise afeta Ensino Superior

Relativamente ao Ensino Superior português, o professor condecorado afirma que “a crise económica acabou por prejudicar a capacidade das universidades portuguesas em se adaptarem aos tempos de hoje”. Além disso, existiu de igual modo uma “desconfiança do poder em dar mais autonomia às universidades”, algo que deve ser resolvido futuramente para um melhor desenvolvimento das mesmas.

Melhorar as estruturas universitárias

Jorge Moreira Gonçalves licenciou-se e doutorou-se na FFUP, onde também iniciou a sua carreira como docente. No ano de 2001 tornou-se diretor da faculdade, abandonando o cargo, no ano de 2006, para se tornar vice-reitor para a Investigação, Desenvolvimento e Inovação na Universidade do Porto (UP). Ocupou o cargo até 2014 e foi enquanto vice-reitor que encontrou um dos maiores desafios da sua carreira.

Afirmou que, enquanto ocupou o posto, tentou alcançar objetivos para conduzir a universidade a uma melhora no âmbito da investigação e para existir uma “melhor aprendizagem e maior capacidade para transferir o conhecimento” dentro das estruturas universitárias.

Jorge Gonçalves classifica a sua participação na vida universitária, enquanto vice-reitor, como “muito enriquecedora”. Explica ainda que como universitário “cresceu imenso”, conheceu pessoas com “funções extraordinárias” e que tentou “tornar mais visível aquilo que se faz nas sombras, na timidez”. O docente auto caracteriza-se como uma pessoa que tem uma “tendência natural para desafios”, tendo encarado este cargo como tal e transformando-o numa “experiência inigualável”.

“O UPTEC é um projeto para a universidade do futuro”

Ainda enquanto vice-reitor, desempenhou uma função fundamental na direção do Parque de Ciência e Tecnologia da Universidade do Porto (UPTEC). Para Jorge Gonçalves, esta instituição está longe de atingir o seu pico máximo de crescimento: “Nos últimos anos existiu um empenho enorme no crescimento do UPTEC”. Tal aconteceu tanto a nível do conhecimento, como a nível física, relativamente à construção de infraestruturas e das primeiras empresas. Agora, o professor catedrático acredita que se deve focar na consolidação da instituição.

“O UPTEC é um projeto para a universidade do futuro”, diz. Jorge Gonçalves afirma que a universidade “já não é um local onde os estudantes vão para ouvir palestras ou aprender o que os professores têm para lhes transmitir” devido à facilidade de acesso à informação que ocorre nos dias de hoje. Transformou-se então num local de “discussão e reflexão” sobre o conhecimento adquirido e da sua aplicação.

O Parque Tecnológico é então um dos grandes “laboratórios de aplicação do conhecimento, onde se podem criar soluções para serem transferidas para a sociedade” e que podem facilitar o acesso a “produtos e serviços inovadores”. Daí a sua importância na comunidade académica do Porto: “O grande mérito que eu vejo em estruturas como o UPTEC é serem os ambientes adequados para se fazer a modernização do futuro”.

Plataforma Noroeste Global

Composta pelas universidades do Porto, Aveiro, Minho, Católica do Porto e pela COTEC e Fundação Calouste Gulbenkian, esta instituição pretende revelar o potencial inovador e a capacidade exportadora das regiões Norte e Centro litoral. Cooperação, inovação e internacionalização são os seus principais conceitos.

Espírito empreendedor essencial

Conhecido por apoiar iniciativas empreendedoras, como o CEDUP, Jorge Gonçalves considera que as mesmas são essenciais para qualquer estudante de qualquer área. O docente condecorado pensa que deve existir um espirito empreendedor nos jovens universitários e na sociedade em geral. “Toda a comunidade deve sentir-se responsável na indução das mudanças, na sociedade”.

Jorge Gonçalves afirma que não nos devemos conformar com o cenário de “isto é assim, foi assim e sempre será assim”, visto que as mudanças estão sempre a ocorrer ao longo dos tempos. Assim, é essencial participar das mesmas. “Os estudantes têm de ter consciência que vão ser agentes transformadores”.

Para o professor catedrático, quando se fala em empreendedorismo fala-se de uma “provocação para dizer que o mundo não nasceu assim, não foi sempre assim e houve sempre agentes de mudança, que são os universitários”. São estes que têm a “responsabilidade de serem os atores destas mudanças”.

É nesse aspeto que se torna importante e essencial despertar um espírito empreendedor nos jovens dos dias de hoje, uma sensação de não conformismo. “É necessário promover o otimismo dentro da universidade.”

Utilizar o conhecimento global em prol da sociedade

Atual coordenador da Plataforma de Cooperação Noroeste Global, Jorge Gonçalves explica os seus principais desafios ao JPN. Considerando-a um novo desafio, afirma que a mesma “é diferente de todas as iniciativas tomadas no âmbito das universidades”. O principal objetivo prende-se em utilizar o “conhecimento que existe entre as universidades para ajudar a sociedade a resolver os seus problemas, a enfrentar com sucesso os seus desafios”.

Confessa, porém, que o desenvolvimento não tem ocorrido tão rápido quando o desejável. “Tem havido dificuldades em produzir o conhecimento que a faculdade precisa, em fazer a sociedade perceber o potencial que existe dentro das universidades”. Para o antigo vice-reitor, a sociedade portuguesa está a passa por um “período paradoxal”, tendo “problemas e mão-de-obra qualificada” mas não possuindo a “capacidade de usar esses recursos”.

A Plataforma decidiu então criar uma abordagem distinta. “A sociedade tem estes objetivos e estes problemas. Então pensamos no que podemos fazer com estas áreas prioritárias.” O docente afirma que a melhor técnica consiste em formular as perguntas certas para construir uma agenda de inovação e assim resolver essas questões. “A Plataforma é um projeto que procura criar uma agenda de inovação com base na procura e não na oferta.”

O objetivo é juntar o maior número de instituições e recursos humanos e canalizá-los para resolver os problemas prioritários. “Vamos procurar criar equipas que, no seu dia-a-dia, vão estar focadas em resolver estes problemas com os recursos das universidades”.