No mesmo dia em que deu uma palestra no pólo de Ciências da Comunicação da Universidade do Porto, na abertura do Mestrado em Ciências da Comunicação, Dan Costa, editor principal da PCMag.com, sentou-se com o JPN para discutir temas que preocupam antigos e futuros jornalistas. Como manter um jornalismo de qualidade com informação de acesso gratuito? Um jornalista deve ser um profissional de redes sociais? O imediatismo roubou o lugar à investigação? Numa pequena entrevista, o ex-jornalista norte-americano tentou dar resposta a todas estas questões.

Na sua ótica, quais foram as principais mudanças tecnológicas que impactaram o mundo jornalístico?

Quando comecei a trabalhar no ramo dos media, era jornalista de imprensa. Queria muito criar revistas e contar histórias. Quinze anos depois, estava a trabalhar numa revista impressa e tive de acabar com ela. Aí, mudamo-nos para a web, começamos a publicar, a apostar no conteúdo digital e saímo-nos muito bem, temo-nos saído muito bem! Mas agora estamos a chegar a outro ponto de viragem na evolução dos media, em que estamos a sair da web e a chegar a novas e diferentes plataformas, quer se trate do Facebook, Instagram ou Snapchat… É um paradigma totalmente novo para os media. É muito difícil fazer dinheiro com isso, mas é lá que a audiência está e onde os jornalistas precisam estar. E é nisso que devemos depositar todo o nosso tempo e atenção. Principalmente os novos jornalistas.

Sabemos que, para que se faça bom jornalismo, os media precisam de recursos, de dinheiro. Então, como é que o jornalismo de qualidade pode sobreviver num mundo em que qualquer um tem acesso a informação gratuita na Internet?

A coisa mais barata, hoje, na Internet, são factos. Assim que são publicados online, nunca mais desaparecem e podem ser encontrados por qualquer pessoa com acesso ao Google. E isso costumava ser o trabalho dos jornalistas: encontrar factos e publicar factos. Mas para que o jornalismo sobreviva, é preciso que aprendamos a fazer outras coisas para além disso. E isso significa: apresentar os factos sob uma luz diferente, escrever histórias de maior qualidade, recorrer ao design para tornar esses factos mais atrativos e compreensíveis para os consumidores… Significa analisar os factos e detetar padrões amplos, interpretá-los e fornecer a nossa análise, que é algo bem mais do que só apresentar os factos em si. É aí que o jornalismo precisa de se tornar mais complicado, de modo a poder continuar a acrescentar valor ao paradigma dos media.

Mas e o dinheiro? De onde vem?

Essa é uma boa pergunta! É muito difícil… Desde que estou no ramo dos media, consegui obter cada vez mais visualizações e arranjar cada vez mais pessoas para lerem os nossos conteúdos e, ainda assim, a cada ano, fazemos cada vez menos dinheiro. Porque a publicidade e os CPM’s continuam a cair. Mas penso que há outras maneiras de fazer dinheiro, para além da exibição de publicidade. [No nosso caso,] cobrimos muitos produtos e fazemos dinheiro através do comércio. As pessoas lêem as nossas críticas, vêem que preferimos aquele telemóvel em vez de outro qualquer e, quando o compram, nós recebemos uma comissão. E isso não afeta o nosso estatuto editorial, o que cobrimos ou a forma como fazemos as críticas. Também fazemos dinheiro através das nossas licenças: quando dizemos que o portátil da marca X é o melhor para clientes empresariais, conseguimos licenciar esse aval à marca X e ela pode usá-lo na sua publicidade. Por isso, temos um pouco mais de flexibilidade. Para os jornalistas “tradicionais”, existem “paywalls” e programas como o Patreon, que é uma forma de solicitar fundos de um grande número de pessoas. Apesar de serem meios muito pequenos, podem dar dinheiro suficiente para se publicar produtos de alta qualidade. No entanto, ainda é algo muito pequeno, usado não por empresas, mas por indivíduos por contra própria. Mas a questão do dinheiro… É muito difícil.

E quanto às redes sociais… Como é que um jornalista consegue agarrar o interesse do leitor sem ser através de títulos sensacionalistas e enganadores?

Acho que o “clickbaite” é um problema sério para todos os jornalistas. E a razão pela qual é um problema é porque funciona, atrai o clique. E um dos maiores problemas que temos na indústria, atualmente, é os jornalistas serem pagos pelas visualizações e não pela qualidade do seu trabalho. Mas isto acaba por ser um jogo perdido, porque essas visualizações não valem assim tanto. Os leitores não estão comprometidos, a prestar atenção, não vão ler mais histórias. Nas redes sociais o que tens de fazer é: desenvolver uma reputação, talvez afiliares-te a uma marca que já tem uma reputação e, depois, agregar um público que confia realmente em ti.

Todo este novo paradigma tecnológico é favorável ou desfavorável à produção e consumo de conteúdos de jornalismo de investigação?

Julgo que, neste ponto, é desfavorável. O jornalismo de investigação é o que necessita de mais recursos, mais tempo, mais dinheiro. E, após a publicação da história, assim que a peça de investigação se torna num facto, pública, qualquer pessoa pode lê-la e republicar esses factos, fazer uma história sobre a história. E isso é bom, porque leva a marca a outros níveis, dá reconhecimento pelo trabalho desenvolvido. Mas não lhes dá, necessariamente, mais tráfego e não ajuda a pagar aos jornalistas. No entanto, podem haver modelos alternativos. Procurar por “benfeitores” sempre resultou no Estados Unidos, sempre existiram publicações apoiadas por indivíduos com dinheiro, com ou sem agenda. A ProPublica, por exemplo, é uma ótima organização de jornalistas que trabalham sem lucros, sem publicidade, e procuram ter financiamento externo para fazerem trabalho de relevo. Mas esses são casos de estudo limitados. Houve uma altura em que todos os jornais da América tinham uma unidade de jornalismo de investigação, mas agora todas elas têm sido fechadas ou reduzidas… Nunca houve melhor altura para publicar informação, nunca houve melhor altura para consumir informação, mas são tempos duros para se ser jornalista de investigação.

Considera que o jornalista atual tem de saber trabalhar com o Snapchat, o Twitter e o Facebook?

Tudo menos o Snapchat! [risos]. O Snapchat é a primeira rede social que não consigo compreender na totalidade, que me faz sentir velho. Mas sim, acho que como jornalista tens de experimentar todos estes diferentes meios, todas estas ferramentas. O Twitter é um ótimo sítio para encontrar ideias para novas histórias, para te ligares a outros jornalistas. O Facebook é uma das maiores plataformas de media nos Estados Unidos. Todos pensámos que ele traria tráfego para os nossos websites… Mas, na realidade, nós temos que tratar estes novos meios como plataformas completamente novas. Elas não estão só lá para trazer tráfego ao nosso website, elas estão lá para nos ajudar a alcançar leitores. Os homens de negócio vão descobrir como fazer dinheiro com isso, eventualmente. Assim que a audiência for grande o suficiente, eles descobrirão como fazê-lo. Por exemplo, a nossa empresa é dona da IGN e eles têm duas pessoas que não fazem mais nada para além de criar conteúdos para o Snapchat. E eles saem-se muito bem. Mas saem-se muito bem porque estão a fazê-lo somente para o Snapchat e não estão a tentar adaptar os conteúdos a outros propósitos, não estão preocupados em aumentar o tráfego do site. Estão a tratar o Snapchat como uma plataforma própria. A ideia de que temos de conduzir todas as visualizações para o website é um pouco antiquada… O mercado está a mudar. E, como jornalistas, o nosso trabalho não é fazer dinheiro, mas sim chegar ao maior número de pessoas possível com a melhor história possível.

E quanto ao ensino, acha que as universidades onde estudam os futuros jornalistas já se souberam adaptar a este novo paradigma tecnológico?

Acho que isso varia. Varia de universidade para universidade, de professor para professor. É a mesma situação de quando eu estava a estudar jornalismo, enquanto ocorria a revolução da publicação online. Havia professores mais à frente e professores mais atrás. Mas o importante a reter é que os estudantes entendem os media, por vezes, melhor que os seus professores. Os professores podem trazer profissionalismo, alguma educação e “treinos” clássicos, diversidade de abordagens, mas para os millennials e jovens jornalistas… Eles já sabem como usar as redes sociais e vão acabar por contar as suas histórias nos meios nos quais estão mais confortáveis. Para a minha geração, esse meio era o blog. E para as próximas gerações vão ser estas novas ferramentas. E o que vier a seguir! Porque de dois em dois anos surge uma nova mudança de rumo. E haverá quem ganhe, quem perca, mas o mais importante é que os profissionais dos media se mantenham abertos e continuem a tentar coisas diferentes.

Artigo editado por Filipa Silva