Os melhores ciclistas do mundo estão de volta às estradas nacionais. Apesar de não ter o mediatismo da Volta a Portugal, a Volta ao Algarve, que arranca esta quarta-feira e se prolonga até domingo, é a prova portuguesa mais valorizada ao nível internacional.

Em prova, vão estar oito equipas portuguesas (duas da cidade do Porto) e duas das três melhores do mundo. Ao nível individual, encontramos campeões do mundo, dois vencedores da Volta a França, entre outros consagrados, que fazem parte daquele que é tido como um dos melhores elencos da prova nos últimos anos.

Alterações relevantes

Desde 2016, que a subida ao Alto do Malhão, em Loulé, faz parte da etapa final da Volta ao Algarve. Este ano, contudo, a tradição não se vai manter. José Carlos Gomes, da organização da Volta ao Algarve, explica que há “um fator logístico e outro desportivo” que justificam a alteração. Dia 23 de fevereiro é domingo de Carnaval, data muito festejada em Loulé e, por isso, não estavam reunidas as condições para o concelho acolher a última etapa da competição.

Não podendo a prova terminar no Alto do Malhão, a organização decidiu propor um desafio diferente aos ciclistas: terminar num contrarrelógio. Sendo o contrarrelógio a última etapa, as equipas podem ter abordagens estratégicas drasticamente diferentes ao longo da competição.

Para José Carlos Gomes, o contexto vai “potenciar ataques”, no fim das etapas. A estratégia das equipas não se pode dissociar, ainda, de outras diferenças no percurso: “É habitual, por exemplo, na etapa do Alto do Malhão, os ciclistas passarem pelo alto duas vezes. Normalmente, a primeira acontece a cerca 50 quilómetros do fim, mas, desta vez, vai acontecer a pouco mais de 20 quilómetros da meta. Os trepadores vão enfrentar dificuldades diferentes”, explicou o responsável.

Nibali, Thomas, Viviani…

Como acontece todos os anos, vão estar no Algarve alguns dos ciclistas mais consagrados do mundo. A julgar pelas palavras da organização, o elenco deste ano parece ter ainda mais para ver: “O que torna esta edição especial é, de facto, um maior número de estrelas no pelotão”, afirma José Carlos Gomes.

Houve, contudo, circunstâncias, que não o prestígio da prova, que explicam o facto de este ano o pelotão ser mais mediático: “O cancelamento da Volta a Omã levou muitos ciclistas a escolher o Algarve como uma boa prova para ganhar ritmo, já que ainda estamos em início de época”, explicou João Crespo, administrador do blogue Camisola Amarela. Assim, João Crespo não tem dúvidas em afirmar que este pelotão é “melhor do que o do ano passado e de há dois anos”.

Pelo Algarve, vão passar o belga Greg Van Avermaet (CCC Team) e o norueguês Alexander Kristoff (UAE – Team Emirates) que figuram entre os dez melhores classificados no ranking individual da União Ciclista Internacional (UCI).

Não é, porém, destes atletas o melhor currículo do pelotão. Entre os 175 corredores deste ano, vai estar o italiano Vincenzo Nibali (Bahrain-Merida), vencedor da Volta a Espanha (2010), da Volta a França (2014) e, em duas ocasiões, da Volta a Itália (2013 e 2016).

É, no entanto, a INEOS (antiga Sky) que se apresenta como uma das equipas mais fortes. Entre os quadros dos britânicos encontram-se o polaco Michal Kwiatkowski e o britânico Geraint Thomas. Os dois corredores têm sido protagonistas na Volta ao Algarve, tendo mesmo já vencido a prova em edições recentes: Kwiatkowski terminou a Volta de camisola amarela em 2014 e 2018, e Thomas em 2015 e 2016. Geraint Thomas também já venceu uma Volta a França.

Tadej Pogacar, da UAE-Emirates, vencedor do ano passado, não vai marcar presença.

No Algarve, vão estar alguns dos melhores sprinters do mundo como Matteo Trentin (CCC), Elia Viviani (Cofidis), John Degenkolb (Lotto Soudal) ou André Greipel (Israel Start-up Nation).

Para José Carlos Gomes, no que toca ao vencedor da geral, pode haver uma surpresa: “Há um jovem com muito talento. Remco Evenpoel é um grande contrarrelogista. A dúvida é perceber se vai conseguir ter uma margem que lhe permita recuperar na última etapa. Acho que é possível, porque as montanhas no Algarve são só médias montanhas”.  

O lado português

Na UAE Emirates há um clã português. Com uma vitória na Volta à Suiça e um Campeonato do Mundo de Estrada no bolso, Rui Costa, um dos melhores ciclistas portugueses da atualidade, está nos Emirados Árabes Unidos desde 2014.

Depois de, durante cinco anos, ser o único representante luso na terceira melhor equipa do mundo, segundo o ranking da UCI, Rui Costa conta agora com a companhia de Ivo e Rui Oliveira. Os gémeos naturais de Vila Nova de Gaia chegaram à equipa em 2019, mas apenas Ivo vai estar presente no Algarve, devido a lesão do irmão. Apesar de competir na UAE Emirates, não é provável que Ivo Oliveira consiga protagonismo na volta.

Na verdade, segundo os especialistas ouvidos pelo JPN, os dois portugueses que podem lutar por um lugar de destaque no pelotão são, sem surpresa, Rui Costa e Amaro Antunes da W52-FC Porto.

O algarvio, que já até já venceu a etapa do Alto do Malhão, é o ciclista em quem se depositam mais expectativas, entre os que correm por equipas portuguesas.

Para Frederico Bártolo, do jornal “O Jogo”, o corredor português pode aspirar a um “top 10”. A ideia é corroborada por Ana Marques Gonçalves, do jornal “Público”, que descreve as caraterísticas de Amaro Antunes: “Poderia ser um ciclista que, apesar de não se defender tão bem no contrarrelógio, aspirasse aos dez primeiros. Ainda por cima é algarvio e, por isso, conhece bem as subidas”.

Se a análise à realidade do ciclismo português passar do contexto individual para o coletivo, as expectativas diminuem. Apesar de, em prova, estarem oito equipas portuguesas, as perspetivas não são muito animadoras.

Para Frederico Bártolo, “a corrida é difícil para as equipas portuguesas”. Há explicações técnicas que justificam essa dificuldade: “O contrarrelógio é de 20 quilómetros. Por vezes, mesmo que tenhamos bons ciclistas de montanha, eles acabam sempre por perder 30 ou 40 segundos no contrarrelógio e ficam logo arredados dos três primeiros lugares”, explica o jornalista.

A W52-FC Porto, a EFAPEL e o Tavira (agora sem o Sporting) são as equipas que podem aspirar a melhores classificações. “Para uma equipa portuguesa, vencer uma etapa já seria uma grande volta”, remata Ana Marques Gonçalves.

De Portimão a Lagoa, em cinco etapas

A primeira etapa da prova está agendada para as 12h00 desta quarta-feira. O pelotão, de 175 corredores, vai partir de Portimão em direção a Lagos, e completar uma distãncia de 195,6 quilómetros. Uma etapa de baixa altitude, com duas contagens de montanha, uma de terceira e outra de quarta categoria.

Na quinta-feira, a etapa vai ligar Sagres ao Alto da Fóia, com um final montanhoso, com contagens de terceira, segunda e primeira categoria, esta última instalada na meta.

A jornada mais longa está agendada para sexta-feira. Entre Faro e Tavira, os corredores vão percorrer 201,9 quilómetros. No sábado, o terreno volta a inclinar. Os corredores vão sair de Albufeira rumo ao Alto do Malhão onde, nos últimos 300 metros, vão enfrentar pendentes acima dos 10%.

Domingo, a prova fecha com um contrarrelógio individual de 20 quilómetros com partida e chegada na cidade de Lagoa.

A Volta ao Algarve 2020 vai ser transmitida em 83 países. Em Portugal, pode ser acompanhada em direto através da Eurosport 2 da TVI 24.

Artigo editado por Filipa Silva