folklore” – assim mesmo, com letras pequeninas – é o novo álbum de Taylor Swift e chegou sexta-feira às lojas e plataformas digitais, quase sem aviso prévio, para provocar um misto de choque e gáudio entre os milhões de fãs da artista.

O novo trabalho discográfico da norte-americana teve sucesso imediato – mais de 1,3 milhões de cópias nas primeiras 24 horas e recordes de streaming batidos no Spotify e Apple Music. Inclui 16 músicas (mais uma de bónus, apenas em versões deluxe) e foi concebido inteiramente durante a pandemia de COVID-19.

O álbum contou com a ajuda no processo de songwritting e produção de Aaron Dessner, guitarrista da banda indie rock The National, e de Jack Antonoff, colaborador de longa data de Swift, além de um dueto com Bon Iver. A par do álbum foi lançado também o videoclipe do primeiro single, “cardigan”.


Como o próprio nome indica e como desde o anúncio do álbum – a meio do dia 23 – se especulou, “folklore” é um álbum indie folk. É um projeto muito diferente dos recentes álbuns de Taylor e também diferente dos primeiros álbuns country da artista, mas, de certo modo, representa um voltar às raízes. Não é comum, nos dias que correm, ver uma estrela musical alterar o género musical tão espontaneamente. Não é comum ver uma estrela musical variar de todo. Mas Taylor Swift decidiu fazê-lo.

A artista, que iniciou a sua carreira musical no country aos 16 anos, em Nashville, somou a abrir quatro álbuns reconhecidos e premiados (incluindo Grammy de Álbum do Ano em 2010, para “Fearless”), e mudou de registo em 2014, lançando um álbum completamente pop, com êxitos catchy como “Shake it off” e “Blank Space”. Esse disco, “1989”, ganhou também o Grammy de Álbum do Ano, em 2016, tornando Swift a primeira artista feminina da História a alcançar tal feito duas vezes.

Três álbuns pop depois, temos “folklore”, de forma completamente inesperada, tanto pela metamorfose musical como pelo timing, visto que o previsto era Taylor andar em digressão de promoção do álbum “Lover” este verão, não fosse a pandemia que cancelou todos os seus concertos, incluindo a sua presença no festival Nos Alive, em Lisboa, inicialmente prevista para o passado dia 9 de julho (a propósito, assinala-se que já há confirmações para a edição de 2021 do festival português, mas Taylor Swift não é uma delas).

De entre todos os álbuns anteriores da artista, o que mais se assemelharia a “folklore” será “RED” de 2012, a sua despedida do country, em que dava a mostrar uma certa vontade de experimentar novas sonoridades. Enquanto “RED” justifica o seu título pela cor e vivacidade da emoção da generalidade das suas canções, “folklore” é um “RED” a preto e branco.

Taylor Swift, com 30 anos, apresenta o seu projeto mais maduro, extremamente rico nas letras e na composição. Ouvir o álbum uma vez não basta. As letras, o storytelling, as referências, as metáforas de que estas canções estão recheadas não são de rápida assimilação. E ainda bem, porque de cada vez que o ouvimos se torna melhor e há sempre um pormenor ou outro que nos tinha escapado das vezes anteriores que nos faz adorar ainda mais a música, ainda que à décima vez. A profundidade de frases como “You were my town / now I’m in exile seeing you out” de “exile” ou “You taught me a secret language / I can’t speak with anyone else” de “illicit affairs” carecem de uma degustação lenta.

Crenças, práticas, mitos. De tudo isso é feita a cultura popular ou “folk”, na palavra inglesa. Foi com base nesse conceito que Taylor escolheu o nome do álbum. Várias músicas contam histórias de personagens cuja identidade não é conhecida. Existem, por exemplo, três músicas no álbum que contam a história de um triângulo amoroso. É a mesma história, contada em três perspetivas, segundo Taylor. “betty” e “cardigan” encaixam como uma luva. “illicit affairs” será, na crença dos fãs, o lado que completa a figura.

Este álbum soa a trabalho árduo de anos, letras de experiências e vivências de uma vida, escritas e reescritas, bem pensadas estruturalmente. Custa acreditar que foi todo escrito, gravado e produzido em menos de quatro meses.

A quarentena foi tempo de angústia e tédio para alguns, de desespero até. Para Taylor, foi tempo de aproveitar para engenhar todo um novo e excelente álbum. Foi uma forma de presentear de surpresa os fãs, que não a vão poder ver ao vivo este ano, como seria possível antes da propagação do vírus.

Num registo completamente oposto do seu êxito upbeat de 2019 – “You need to calm down” -, as músicas de “folklore” vêm, de facto, cumprir o prenúncio: acalmar. São 16 músicas que nos sossegam a alma, transportam para lugares simples, ainda que solitários. Está provado que Taylor Swift nunca nos apresenta nada que seja expectável e mesmo que pensemos no mais inesperado, não estaríamos perto.

Em tempos que nos relembram que nada é garantido, e dos quais não levamos grandes memórias, Taylor Swift deu-nos um álbum indie folk que ela mesma não saberia quando seria a altura perfeita para lançar, se não fossem as reflexões a que estas adversidades nos guiam.

Artigo editado por Filipa Silva