Uma tarja, um sentimento. A claque do clube, a Máfia Vermelha, dava o mote que rapidamente se estendeu aos restantes seis mil leixonenses que, num domingo chuvoso, se deslocaram ao Estádio do Mar para mais um jogo do seu Leixões. O adversário era o Estrela da Amadora. Mas para quem veste de vermelho às riscas, isso pouco interessa. “Por um Leixões mais forte, todos unidos até à morte”.

Ainda antes do apito inicial, a mancha encarnada circundava o estádio numa espécie de romaria popular. À porta, duas horas antes da bola rolar, leixonenses vestidos a rigor dividiam-se nas discussões, uniam-se no sentimento. “Sou de longe, mas venho sempre ver o Leixões. É o meu primeiro clube”, dizia um adepto de cachecol ao pescoço ansioso por ver a porta 4 abrir-se.

Por entre as conversas, a história do velho rival Boavista também não faltou. “Então aquele tipo foi preso? Coitados, ainda não se livraram dum e já estão a levar com outro”, maldiziam os adeptos do emblema da Cruz de Pau. Entretanto, era cada vez maior e mais impressionante a concentração vermelha nas imediações do recinto leixonense.

Às 14h45, abriram-se as portas para gáudio dos milhares de fanáticos que, há horas, aguardavam a invasão ao Mar. Em poucos segundos, um estádio deserto virou palco de festa, com a bancada reservada aos sócios do Leixões a encher-se de corações esperançosos. As nuvens carregadas pairavam constantemente sobre o relvado, reclamando quase a atenção dos presentes. Mas o olhar e o coração destas gentes tinham apenas um nome: Leixões.

Irromperam palmas. Do Mar ouvia-se o som de quem parecia aguardar por este momento há muito tempo. “Leixões, Leixões, Leixões”. E era apenas e só o aquecimento. A acompanhar as palmas, os cânticos e todo o entusiasmo nas bancadas, o hino do Leixões.

Minutos a fio ouviu-se sem interrupções: “Ó meu Leixões/Nobre aguerrido/Ó meu Leixões/De peito erguido/Sempre na luta/Por um ideal/És no desporto/Franco e/Leal quando o Leixões/Entra a jogar/Os corações a palpitar”.

À medida que a hora avançava, aumentava o nervosismo. Afinal, não há amor que se construa sem sofrimento, e o Leixões precisava de ganhar para apaziguar o receio da massa adepta de uma eventual descida de divisão. O jogo começava, perdia-se a razão. Agora, quem comandava era o coração.

Os minutos foram passando. A cada remate falhado um grito fazia eco no Mar. Os mais sofredores não aguentavam o turbilhão de emoções que deles se apoderava e à falta de mais soluções era o árbitro que levava com a raiva: “gatuno”, “palhaço”. A tradicional e tão própria linguagem do futebol não faltou num jogo que caminhou sem golos para o fim. Perto desse mesmo fim, gritou-se golo. Mas não. O empate a zero manteve-se. O desespero dos leixonenses também.

“Não jogam nada, ponto final”

De ouvidos colados no rádio, muitos adeptos foram, no entanto, dando a boa nova às pessoas do Mar. “O Paços empatou, menos mal”, gritava um, como que aliviando a dor de um jogo menos conseguido do seu Leixões. “Vá lá, nada está perdido”, consentiu outro à medida que descia as escadas para sair do estádio.

Cá fora, o cenário de há três horas repetia-se. Uma onda imensa de encarnado engolia a zona envolvente do estádio do Leixões. Com uma diferença. O estado de espírito. A desilusão era patente. “Não há que encontrar desculpas no árbitro. Não jogam nada, ponto final”, desabafava um adepto no meio da multidão.

E houve quem levasse o desabafo bem a peito. Com as ruas mais desertas e o jogo já nas actas, alguns não quiseram deixar o sofrimento roê-los por dentro e aguardaram pela saída da equipa. O jogo no Mar terminava com a emoção dos adeptos, daqueles que vivem o seu Leixões como ninguém, a pedir justificações àqueles que afinal sempre apoiaram. É assim o futebol. É assim o Leixões.